3. Pancada Decisiva

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Ela não sabia por onde começar a xingar, se primeiro amaldiçoava sua extrema burrice por ter baixado a guarda, por ter confiado tanto nas próprias habilidades que acabou subestimando a astúcia de um criminoso de Águas de Sentina, ou se direcionava toda sua raiva apenas àquela pirata. De qualquer forma, uma série de palavrões lhe fugia dos lábios enquanto Vi corria contra a maré da população que se amontoava nas ruas. Ela teve um vislumbre de Miss Fortune seguindo por aquela direção, mas a essa altura, todo o mapa da cidade que havia decorado já se desfazia. Como tinha muito a perder, só lhe restava a escolha de continuar correndo.

Talvez ela não devesse mencionar sobre aquilo no relatório da missão. Ou talvez pudesse dizer que fora cercada e espancada por uma gangue, que com muito custo conseguiu levar a bolsa com os artefatos falsificados e a ficha da missão. Também não precisava que aquele marinheiro que ela sequer conhecia lhe dissesse um grande e estúpido "eu te avisei".

Bem, mas afinal de contas, ela fora escolhida para aquela missão por um motivo, e num lapso de lucidez, Vi trocou de lugar com Miss Fortune e se colocou na mente da criminosa. Se tivesse roubado a bolsa de um forasteiro, para onde iria? No mesmo instante, ela escolheu uma viela estreita e escura, um caminho repleto de armadilhas, como lixo, ratos e moradores de rua pedindo esmola. Em uma das vielas, encontrou uma forma de escalar e alcançar os telhados, de onde tinha uma vista mais ampla da cidade. Lá de cima, conforme continuava correndo, ela avistou uma cabeleira vermelha esvoaçando embaixo de um chapéu, como se fosse a única cor naquele cenário cinzento. E, o mais importante, a bolsa de Vi lhe pendendo do ombro. Ela grunhiu para si mesma em fúria e saltou de casa em casa até se aproximar, e sentindo sua presença, Miss Fortune a espiou por cima do ombro e puxou a pistola do coldre.

O tiro acertou a laje do telhado e ricocheteou, mas o susto foi o suficiente para que Vi se desequilibrasse antes de voltar a correr, e Miss Fortune ganhava distância. Ela continuou atirando enquanto ziguezagueava pelas ruas, com uma expressão divertida no rosto que trazia à Vi os pensamentos mais agressivos. A Capitã gargalhou quando disparou uma sequência de tiros, e Vi finalmente perdeu a paciência por completo.

Ela concentrou toda sua raiva na sola dos pés e nos joelhos e sentiu as pernas queimarem, calculou a distância ideal e saltou na direção da pirata, o impacto derrubando as duas no chão imundo. Vi rolou para um lado, Miss Fortune para o outro, a pistola lhe escapando da mão, e a bolsa caindo entre elas. A Capitã tentou se levantar para apanhá-la, mas Vi se impulsionou para frente para lhe agarrar o tornozelo, puxando-o com toda força para desequilibrá-la. Miss Fortune caiu, e Vi aproveitou para passar na frente, mas, copiando o golpe da Defensora, a pirata a derrubou também.

- Quanta originalidade! – Vi reclamou, colocando-se de pé outra vez e correndo até a bolsa. Quando ela a alcançou, sentiu um pontapé nas costas e perdeu o ar. Miss Fortune passou adiante e puxou a alça, voltando a rir enquanto se afastava. Vi grunhiu e a alcançou num impulso, mirando um chute na parte de trás de seu joelho que fez a pirata gritar e cair, dando uma vantagem a Vi para recuperar o objeto.

Mas, quando ela puxou a bolsa, Miss Fortune ainda a segurava com força, determinada a não entregá-la. Ela se colocou em pé outra vez, e agora cada uma puxava para um lado. Incrivelmente, o sorriso da Capitã continuava firme no lindo rosto, como se estivesse se divertindo com aquele confronto. Vi, por outro lado, tinha o cenho franzido em uma raiva inexplicável.

- É bem forte para uma simples mercadora. – Observou a pirata.

- Você não faz ideia. – Vi tentou acertar o rosto da mais baixa com um soco, mas ela se esquivou com elegância e lhe devolveu o golpe no estômago. A Defensora sentiu o gosto de sangue lhe chegar à boca, e resolveu largar a bolsa para ganhar vantagem no confronto. É claro que, com isso, ela precisaria contar que Miss Fortune não seria ágil o suficiente para fugir, mas por não esperar aquele movimento, a Capitã acabou se desequilibrando e recebendo um ataque no queixo.

Corações de SentinaOnde histórias criam vida. Descubra agora