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Já matei meu chefe em sonhos - de todas as formas possíveis.

Imagino-me esguelhando seu pescoço largo até eu ele implore perdão por todas as horas extras e os fios de cabelos que me fez perder.  Não que eu não goste de trabalhar, ao contrário, mamãe culpa minha dedicação a carreira de Administração pelo fato de eu não ter namorado.  Talvez seja, mas eu não me importo.

- Sonhando acordada novamente, Fischer?

Viro minha cabeça e encontro o diabo me observando na porta do escritório, usando um terno escuro que recai com maestria em sua pele dourada e realça os olhos pequenos e verdes, que mais parecem duas fendas: atento as mínimos detalhes e pronto para fazer qualquer comentário maldoso sobre meu trabalho.  Ajeito minha postura na cadeira, na tentativa de disfarçar o susto.

Ele nunca bate na porta para entrar, geralmente com uma pilha de coisas para serem resolvidas urgentemente.

- Bom dia, senhor Darcy.

Ele não responde, aproxima-se de mim com passos apressados e despeja uma pasta na mesa.

- Quero que redija o contrato do Smith e envie o projeto do prédio para o Robin.

- Tudo bem - respondo, com eficiência.

Pego a pasta azul turquesa e dou uma olhada nos papeis, sentindo seus olhos me observarem.  Tento não tremer, pois não quero que ele saiba o quanto me intimida. Meu pai sempre dizia "quando alguém sabe que exerce poder sobre você, ele se aproveita disso até o último momento".

- E eu gostaria que você refizesse o relatório da Briand Group.

Lanço-lhe um olhar descrente.  Como assim reescrever um relatório de vinte páginas, que, em minha opinião, havia ficado excelente? Darcy me encara com uma expressão serena de quem acabou de dar "bom dia".

- Mas por quê? - sou incapaz de conter a pergunta.

Ele ergue a sobrancelha: loura, grossa e levemente arqueada, formando uma ruga no espaço vazio entre os pelos.

- Se quer saber porque não gostei, pergunte ao seu professor de faculdade.

Sua ironia - dita em uma voz aveludada e penetrante - atinge minha zona de conforto com facilidade. Ele se vira e sai da sala, enquanto atiro facas invisíveis em suas costas.  Assim que a porta se fecha novamente, murmuro alguns palavrões e percebo que meu relatório antigo estava intrínseco na página. No verso da primeira folha, há uma anotação com sua letra encurvada.

Prazo: 27/01/2014

Peguei o calendário que estava ao lado da mesa e comprovei minha tese: amanhã seria dia 27 de janeiro, ou seja, terei que incluir o relatório as minhas demais obrigações hoje!

Deito meu corpo na cadeira, mais uma vida lidando com a ideia de pedir demissão e procurar um estágio em alguma empresa pequena, com um bom chefe.  Mas só faltam dez meses - me recordo - para que eu possa adquirir o diploma e, com a Darcy Media Group no currículo, conseguir dar os primeiros passos para o meu grande sonho: ter minha própria empresa um dia.

Eu poderia refazer o relatório, já tinha todos os dados quase decorados e assim poderia reformular um novo texto com propostas mais convincentes.  Sim! Eu só teria que pular o almoço para redigir o contrato do Smith.

A releitura dura mais tempo que o estimado, já que tenho dificuldade para encontrar o que o diabo viu de tão ruim.  Depois, começo a digitar uma nova introdução, parando apenas para roer as unhas até as pontinhas dos dedos doerem.

Ao meio dia, meu estômago começou a roncar e decidi pegar alguns salgadinhos na cozinha da empresa.  Levantei-me da cadeira e passei a mão sobre minha camisa de malha, que estava amarrotada e ergui a saia plissada até a cintura.

O corredor é largo, com piso porcelanato e parede de tom pastel. Existem várias portas do lado direito - a maioria composta por estagiários. Particularmente, eu gosto da minha por mostrar uma Nova York que não vejo lá embaixo (bonita e ensolarada no verão) e também por ficar próxima da cozinha.

Olho para a porta do Sr. Darcy que está fechada e intacta. Nunca sai para almoçar no horário certo, chega mais cedo que todos e vai embora mais tarde - o que me faz pensar, às vezes, que ele mora no escritório.

Entro na cozinha, que é um cômodo pequeno, com uma geladeira branca no canto esquerdo, ao lado da máquina de salgados e a de refrigerante, um armário com pia e copos de plástico entalhados ao lado da cafeteira. Tessa Willians, uma estagiária novata está sentada na mesa, segurando o celular. Assim que nota minha presença, ela sorri amigavelmente.

- Oi Julia, vamos almoçar?

Ela coloca o celular em sua bolsa da Betty Boop e se levanta. Eu gosto do seu corte de cabelo, é curto e desfiado - do tipo que eu jamais poderei fazer, enquanto não tiver coragem de fazer escova progressiva nos meus cachos.
Balanço a cabeça com o sorriso mais tranquilo possível e me aproximo da máquina de salgados.

- Tenho trabalho para concluir.
Ela revira os olhos e sorri.

- O Darcy podia honrar sua beleza, sendo bonzinho, não é?

Antes que eu possa responder, Tessa sai da cozinha, emitindo um "tchau" cantarolado.
Pego uma embalagem de batata frita sabor estrogonofe, pensando no quanto suas palavras são verdadeiras. Oliver Darcy é, sem dúvidas, um homem atraente. Não apenas pela sua altura, o cabelo raspado e os olhos pequenos e sagazes. Ele também é dedicado e detalhista, assina os trabalhos mais inteligentes que tive o prazer em revisar, embora eu custe admitir.

Mas é um idiota completo e toda vez que me olha, é como se dissesse "não se aproxime muito" - o que anula qualquer elogio a sua pessoa.

Como suportar Oliver Darcy - COMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora