Epílogo

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Naquele dia, eu fui no casamento da Grace e permaneci na festa até ter certeza de que ela havia notado minha presença. Depois voltei para casa, deixei os sapatos no tapete e tomei um banho demorado.

Quando retornei, havia uma mensagem do Jesse no meu celular, perguntando porque eu estava tão quieta na festa e outra da minha mãe, perguntando como eu estava. Respondi ao Jesse que estava com dor de cabeça e deixei para responder minha mãe no dia seguinte, na esperança de que teria uma resposta sincera para lhe dar. Na verdade, eu não conseguia descrever qual era minha sensação, uma vez que meu corpo parecia ter adormecido e meu cérebro focado nas funções básicas, talvez fosse um mecanismo para lidar com a dor. Entretanto, eu sabia que mais cedo ou mais tarde teria que encara-la.

Durante todos esses meses lutando pelo meu conto de fadas, quebrei pouco a pouco todas as minhas ilusões. Só agora eu consigo entender que mesmo sendo uma mulher crescida, ainda existia (ou existe) uma menina que gostaria de ser amada intensamente. Talvez ele tenha me amado, mas não o bastante para me fazer feliz - queria poder culpá-lo por isso, mas sabia que tinha minha parcela de culpa.

Existe algo dentro de nós, um mecanismo de sobrevivência passado pelos nossos ancestrais que precisavam lidar com temperaturas inóspitas e animais selvagens para sobreviver. Mecanismo este que é subestimado e usado no senso comum como se fosse uma superstição imbecil - nossa intuição, essa voz sussurrante que tenta nos salvar de nossa própria humanidade, impedindo que mergulhemos em águas frias ou que pulemos num vulcão acesso. Desde o inicio, eu sabia que me envolver com ele exigiria que eu me aprofundasse numa viagem que exigiria mais do que eu estava pronta. Ir até o limite e depois andar mais um pouco, mais um pouco até perceber qual de fato seria minha resistência.

No outro dia, liguei para a minha mãe e disse que havia dado um ponto final na minha história com Darcy. "Como assim? Você não era louca por ele?".

"Eu preciso descobrir como ser louca por min" - foi o que lhe respondi.

Fiz café e me sentei no sofá daquela sala, que agora parecia tão grande para uma pessoa só. Sem a voz da Grace o tempo todo ou o som de suas playlists do Spotify, que ela sempre esquecia de desligar quando ia tomar banho. Deitei meu pescoço no encosto e fechei os olhos, deixando que a minha mente me levasse para onde ela queria...
Naveguei pelos meus primeiros meses no Darcy Media Group, na maneira com que eu tentava fazer tudo para agrada-lo e ainda assim me sentia insuficiente, na maneira em que as outras estagiarias me observavam - as sobrancelhas finas arqueadas e os olhares maliciosos - como se dissessem que eu era uma farsa;  o jeito que eu era "obrigada" a ficar mais tempo trabalhando que o contrato exigia, não só porque o Oliver pedia, mas também para provar para todos que eu era merecedora daquela vaga e que havia potencial em mim. Aliás, seria por isso que eu lutei tanto por ele? Por,  em mais de duas décadas, escutar - pela primeira vez - de alguém, que eu era especial? Deixei cair respingos de café no meu pijama e no sofá. Sibilei um "droga" e coloquei a caneca ma mesa de centro e levantei para buscar algo para me limpar.

Por que passamos tanto tempo esperando que os outros reconheçam o nosso valor? Por que nós o buscamos no trabalho incessante, nos lábios de outra pessoa ou no abraço de amigos que não são tão amigos assim?
Tirei o pijama em frente o espelho, enquanto observava meu corpo magro e pálido se apresentando debaixo daquele tecido de seda.
O cabelo loiro e encaracolado, que passei uma vida inteira tentando domar, os olhos azuis e todo o resto de traços delicados que nunca me fizeram sentir-me uma mulher poderosa. Enquanto meus olhos percorriam casa centímetro do meu corpo, minha mente continuava passeando nas lembranças do Darcy e de tudo que lhe envolvia. Quando o peso daqueles pensamentos se dissiparam da minha cabeça pelas veias e artérias, até pressionarem minha pele, como se eu fosse uma bomba prestes a explodir, perdi o que me mantinha em pé e cai, cerrando minhas mãos em punhos e batendo no chão até sentir que parte daquela energia havia saído de mim. Não senti dor naquela hora, pelo menos não fisicamente.

Queria gritar alto o suficiente para que meus pensamentos não fossem capazes de me sufocar. Mas tive medo que os vizinhos se assustassem e vergonha de que me encontrassem amanhã no elevador e soubessem que por trás dessa mulher aparentemente comum, existe alguém definhando.

Parte de mim, aquela que sabia o número do Darcy, pensou em liga-lo e dizer que ainda estou apaixonada por ele, que sou capaz de passar por cima de tudo para que nós possamos construir uma vida juntos. Mas a outra parte sabia que ficar com ele seria dar as costas para descobrir quem eu sou de verdade.
Além da garota que perdeu o pai, que usa óculos desde os nove anos para tratar a miopia, que adora séries antigas e odeia comida crua, que é completamente apaixonada pelo emprego e capaz de abdicar qualquer coisa por ele, que entregou seu coração mais de uma vez para pessoas que não estavam prontas para serem amadas de verdade; que aliás, nunca se sentiu amada de verdade.
Olhar para essa segunda opção também era observar-me em direção a um buraco negro que poderia me levar para qualquer lugar, inclusive nenhum. Eu corria, inclusive, o risco de perder o amor da minha vida para me encontrar, mas eu já não tinha aberto mão da minha autodescoberta nessa corrida para ficar com o Darcy?
"Se ele for o amor da sua vida, ele ainda estará por você" - sussurrou uma voz da minha cabeça.
Estava na hora de lugar por mim.

Como suportar Oliver Darcy - COMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora