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Eu sei que não deveria estar fazendo isso, não depois de tudo que ele fez.  Qualquer escritora de livros de autoajuda diria que eu deveria ter amor próprio e recusar o convite do Darcy, de viajar no meio da noite para uma cidade distante.

Mas eu havia ido a sua casa para ter respostas e não poderia sair dali sem elas.  Afinal, era sexta, o que significava que eu não teria trabalho no dia seguinte (e mesmo que estivesse meu chefe estaria ao meu lado durante todo o tempo) e não haveria ninguém esperando por mim no apartamento em Park Slope, já que a Grace passaria o final de semana no sítio da família do Brian.   Então, mesmo sem querer conversar com ele, eu entrei em seu carro – um Audi R8 preto, que até então eu não conhecia.

Esperei que ele entrasse no carro.  Cerrei os lábios e cruzei os braços, em frente à porta do passageiro.  Darcy abriu o vidro e me lançou um olhar de curiosidade – em que uma das sobrancelhas estava erguida.

— O que foi?

Apertei meus braços e abaixei até que ficássemos no mesmo plano ótico.

— Eu quero respostas.

— Você vai ter.

— Eu quero que você comece agora.

— Não gosto desse tom, senhorita Fischer.

Eu dei um falso sorriso que logo se transformou em uma carranca e abri a porta do carro.

— Não estou em horário de trabalho, senhor Darcy — respondi, me acomodando no carro que mais parecia um hotel por dentro.

Coloquei o cinto de segurança, enquanto Oliver procurava algum rádio que o agradasse. 

— Você nunca ouviu falar em pen drive? — perguntei, cruzando os braços novamente.

Ele deixou numa música do Aerosmith que só reconheci pela voz do Steven Tyler e ligou o carro.

— Não costumo dirigir muito nesse carro — respondeu, apertando o controle que abriu o portão da garagem — Geralmente uso a limusine ou o avião, sendo que o último estou impossibilitado de usar nesse momento.

Ele me olhou com uma expressão divertida de quem compartilhava uma lembrança, que no caso não era nada divertida para mim.  Apesar da raiva ainda circular pela minha corrente sanguínea, fui pega de surpresa mais uma vez por outra face do Darcy – uma que só vira na noite do jantar – de alguém que havia tirado um peso muito grande das costas e finalmente pudesse descansar. 

Eu olhei para frente, lutando para não me entregar de novo ao seu charme involuntário. Fiz exercícios de respirações e promessas mentais para não pular em cima dele novamente. 

Você é uma mulher forte, bem decidida e de opinião própria, não vai cair na conversinha do Oliver e muito menos nos raros sorrisos dele. Vai apenas ver o que ele precisa mostrar e ir embora, com a mente vazia de questões românticas.  Você sabe que não pode se apaixonar, você não está apaixonada, tudo que sente por ele é desejo, somado a forte de carência de não ter um namorado.

Meu pai morreu pilotando um avião, por eu tenho medo — comentei, com os lábios apertados.

Fechei os olhos e abaixei a cabeça quando senti seu olhar sobre mim.  Eu jamais falava sobre o meu pai - pelo menos o quanto pudesse evitar.  Não porque tivesse feito disso um trauma, pois já fazia doze anos.  Apenas não suportava olhares de pena ou de qualquer demonstração de sentimentalismo.

— Sinto muito, Fischer.

— Não precisa, já faz doze anos.

— Algumas feridas duram mais que isso.

Eu não respondi.

A droga da minha língua havia se enroscado na garganta, criando um terrível nó, daqueles que ocorrem quando a gente revira dores antigas. Abracei meus braços, massageando-os devido ao frio do ar condicionado.

— Quer que eu desligue o ar?

— Não — respondi e peguei o Oliver sorrindo — O que foi?

— Você é tão teimosa.

— Teimosa, não, eu tenho opinião própria.

— Opinião própria inclui passar frio e comer o que não gosta só para me agradar?

Eu olhei para o Darcy com os olhos arregalados e coloquei a franja atrás da orelha.

— Como assim para te agradar? Você acha que eu me preocupo em te agradar?

— Sim, a todo instante.

Eu arfei e olhei para frente.

Nós estávamos saindo da cidade naquele momento, o céu estava negro e quase não havia estrelas no céu.  Desfrutei da relativa tranquila das ruas arborizadas, antes de responder ao Darcy.

— Você sabe o quanto eu lutei por esse emprego?  Foi quase um milagre tê-lo conseguido, mas ainda assim foi mais fácil do que te aturar como chefe.

— Sou tão ruim assim? — ele perguntou, girando o volante para a esquerda.

Grunhi novamente.  Odiava quando tentava conversar sério com alguém e obtinha ironias em forma de resposta, ele estava fazendo exatamente essa brincadeira comigo.

— O pior — respondi, em alto tom — Você é mal educado, controlador, mandão, orgulhoso...

— Ei, ei... Calma aí — ele pediu, fazendo sinal de pare com as mãos — Em minha defesa, você me irrita com facilidade.

— Eu te irrito?

Coloquei a mão no meu pescoço e olhei para ele, com uma expressão de cinismo. Oliver sorriu abertamente e eu fui obrigada a parar de rir para admirar toda aquela beleza ao alcance dos meus olhos. Será que ele sabia como mexia comigo? Perguntei-me em pensamentos. 

— Sim, você sempre consegue me surpreender, me instigar, me desafiar...

Seus olhos penetrantes e inquisidores me encaram mais profundamente, fazendo com que meu coração batesse mais forte. Seu cheiro era inebriante, fazendo com que eu perdesse o rumo de nossa conversa.  Tive lutar contra o impulso de beijá-lo.

— E isso te irrita? — perguntei, com um sorriso zombeteiro.

Darcy sorriu e olhou novamente para a estrada.

— Isso me excita.

Engoli em seco, incapaz de responder sua provocação.  Voltei a olhar para frente e me ocupar com alguma coisa, mas lá fora não havia prédios, pessoas e qualquer vestígio de civilização (a não ser o asfalto, as placas, sim eu sei, mas nada disso é suficiente para me interessar durante a noite).  Então, eu fechei os olhos e lá estava seu rosto, me esperando na escuridão.

Percebi que independente de seus sentimentos serem verdadeiros ou não, eu também estava envolvida.

E de verdade.

Como suportar Oliver Darcy - COMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora