CINQUENTA E UM

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Capítulo Cinquenta e Um

As águas que circundavam Atlântida eram de um azul escuro quando Atena retornou ao palácio. O vento gélido da noite soprou em seu pescoço enquanto ela abria as portas principais, fazendo arrepiar os pelos de sua nuca. As portas de ouro rangeram sonoramente contra o silêncio que preenchia o salão do trono, e com certeza alguém ouviria o barulho, mesmo nos andares de cima. A deusa cambaleou pelos corredores, se apoiando nas paredes para não cair. O efeito da bebida avançava em seu corpo, distorcendo sua vista e enfraquecendo suas pernas. Mesmo sua natureza divina não podia lutar contra o vinho.

Mal enxergava o caminho à sua frente, como se um véu fosse jogado diante de seus olhos, e tropeçou diversas vezes no chão que, apesar de ela saber ser perfeitamente liso, parecia irregular ao seu andar. Se sentia tão mal que, em certo ponto, percebeu estar longe de onde ficavam os quartos que queria achar.

Estava em uma área onde só havia paredes, sem interrupções por portas ou janelas, e o ar abafado começava a fazê-la suar. No fundo, sua mente pensou: subterrâneo; mas seu corpo não tinha forças para se tirar dali. Apenas o medo da inconsciência a guiava agora. O sentimento levou seus pés a se moverem mais rápido, sem se importar com o caminho que seguiam, para sair dali. Poderia desaparecer em névoa, mas no estado em que estava, duvidava que fosse conseguir algo mais do que desmaiar ali mesmo. Considerou também gritar por ajuda, mas não havia visto uma única pessoa desde que entrara no castelo. Assim, a única saída que encontrou foi desbravar os corredores por si mesma.

Ou sua visão estava muito debilitada, ou estava escurecendo. A segunda opção era mais provável. Conforme andava, o ar começou a gelar gradualmente, e as trevas embalavam o caminho. Definitivamente no subsolo, ela conseguiu pensar. O desespero se agigantou dentro de Atena, junto com uma culpa que pesava em seu peito. Não deveria ter bebido. Poderia simplesmente ter contado seus problemas, pedido conselhos e ido embora. Se tivesse feito como era racional, já estaria longe daquele lugar há muito tempo.

Suas mãos tocaram algo gosmento, e ela imediatamente se afastou da parede. Com uma olhada de perto, Atena conseguiu ver que havia sujado os dedos de musgo - ou ao menos era o que parecia à sua mente alterada pelo álcool. Ela franziu o nariz e limpou os dedos na roupa, voltando a caminhar, tropeçando a cada passo, dessa vez tomando cuidado para não encostar nas paredes. Começava a considerar seriamente a ideia de gritar por ajuda quando colidiu com força contra alguma coisa.

O impacto foi tão forte que Atena caiu para trás, mas antes que pudesse atingir o chão, havia braços segurando firmemente sua cintura, amparando a queda. Inicialmente, Atena pensou que fosse Poseidon. Mas uma análise do milésimo de segundo congelado em sua mente a levou a concluir o contrário por diversos motivos. Primeiramente, Poseidon, apesar de ser relativamente magro, não tinha dedos finos e longos como os que a apertavam. E depois, Poseidon era estranhamente quente, no sentido literal da palavra. A sensação de estar perto dele era como estar ao lado de uma lareira: havia sempre calor ao seu redor.

Mas o corpo que apertava o seu - com mais força do que era necessário, ela observou mentalmente - era frio, e não tão atlético quanto o do deus dos mares.

Atena reconheceu os dedos pousados em seu quadril, do dia em que haviam segurado sua mão para os lábios, um palmo acima de sua cabeça, a julgar pela respiração vinda de cima, que beijaram suas mãos calidamente.

Jac.

A confirmação da identidade de seu, por assim dizer, salvador, veio um momento depois, quando a voz tão melodiosa quanto uma música flutuou até seus ouvidos.

- Milady.

Não era uma pergunta. Mesmo em meio ao breu, de alguma forma, Jac a encontrara, e sabia que era ela.

Três Desejos - concluídaOnde histórias criam vida. Descubra agora