CINQUENTA E TRÊS

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Capítulo Cinquenta e Três

Circular pelos corredores do palácio até o centro de treinamento foi fácil dessa vez. Depois de todo aquele tempo, ela começava a se acostumar com a estrutura complexa e a decorar certos atalhos para onde queria ir.

Demorou um pouco para chegar ao seu destino - afinal, ainda era um palácio imenso, por mais que Atena o conhecesse melhor agora. Ela apreciou rapidamente a beleza dos jardins e o cheiro refrescante das plantas quando alcançou o lado de fora. Já conseguia enxergar a estrutura metálica que era seu alvo.

Quando chegou ao centro de treinamento, as portas do primeiro salão estavam abertas, dando vista direta para duas figuras no outro extremo da sala, uma delas mais magra - inegavelmente Jac - e a outra mais corpulenta, circulando em torno do garoto e analisando sua postura. Havia poucos outros soldados treinando na imensa sala - talvez seis ou sete -, todos longe de Jac e quem quer que fosse seu treinador.

- Ombros mais altos, soldado - ordenou o homem corpulento que, Atena reparou, apoiava-se numa bengala. - Sua postura enquanto na formação de guerra deve ser impecável.

- Com licença, senhor - Atena decidiu interromper a cena. - Preciso falar com o soldado Jac, se não estiver atrapalhando.

Assim que seus olhos pousaram em Atena, o homem corpulento fez uma longa reverência - a mesma que os soldados faziam para Poseidon. Ela se lembrava disso pelo dia em que fizeram um tour pelo centro de treinamento. A deusa estranhou a atitude.

- Minha senhora. Peço perdão por não tê-la notado anteriormente - ele se virou para Jac e o cutucou com a bengala. - Faça reverência, garoto.

Jac estampou um sorriso maroto antes de repetir, na direção de Atena, os mesmos gestos de seu treinador.

- Milady. É um imenso prazer revê-la.

- Acho que houve um engano. - Atena se dirigiu ao treinador, achando graça da situação. - Vocês não precisam fazer reverência para mim. Eu não sou... Realeza ou coisa parecida.

- Se as informações que me chegaram aos ouvidos estiverem certas, acredito que o será muito em breve, minha senhora - o homem sorriu.

Atena riu. Estava aprendendo que os indivíduos que trabalhavam para Poseidon realmente gostavam de... Compartilhar informações, para não dizer outra coisa, entre si.

- Bem, se as informações dizem, quem sou eu para negar? - Atena deu de ombros, sorrindo. - Então... Será que eu poderia pegar Jac emprestado por alguns segundos?

- O tempo que desejar, minha senhora - o homem parecia implorar, apesar de ser Atena a pessoa que fazia os pedidos ali. - Com sua licença...

Atena apenas assentiu com a cabeça e o homem se afastou às pressas. Jac voltou a se endireitar e, parecendo mais desenvolto do que nunca, segurou a mão direita da deusa e a beijou displicentemente.

- Minha bela dama. Está deslumbrante nesta tarde, se me permite dizer. Espero que esteja se sentindo melhor?

- Obrigada, Jac - Atena sorriu. - Estou perfeitamente bem. Você também parece muito saudável e bem.

- Oh, eu? Apenas algumas horas de treinamento - Jack alisou o abdômen por cima da camisa vermelha de algodão. - Nada que beire sua beleza, milady.

Até o momento, Jac ainda segurava a mão de Atena, guiando-a até um canto mais vazio, e apesar de estar muito consciente de seu toque, a deusa não se desvencilhou.

- Ah, pare com isso. - Atena riu. - Vim conferir se você estava bem, depois de tudo. Como estão seus ferimentos?

- Quase curados, milady. - Jac abaixou a gola de sua camiseta para mostrar as cicatrizes em seu peito. - Graças à sua ajuda.

- E quanto aos soldados que te puniram? Você os encontrou de novo? E o general?

Jac se encolheu ligeiramente.

- Não encontrei os soldados, milady. Com o general, sim, mas ele não disse ou fez nada. Não pareceu feliz em me ver aqui, mas aparentemente ele havia recebido uma ordem do rei, em pessoa, para que eu fosse solto e devidamente treinado no exército. - ele explicou. - E creio que tudo graças à senhora.

Atena piscou, desconcertada. Ela não havia falado com Poseidon sobre nada daquilo desde que tinham "brigado". Tudo o que ele devia saber era que Jac havia sido injustamente punido e que Atena o havia soltado do calabouço completamente sem permissão. A deusa não imaginou que ele tivesse dado qualquer atenção àquele assunto e, ainda por cima, tivesse falado sobre ele com o General.

O deus dos mares era, de fato, uma caixinha de surpresas.

- Posso ter minha parcela de influência, mas dessa vez foi realmente uma escolha de Poseidon - disse ela. - Não sabia que ele tinha feito tudo isso.

Jac engoliu em seco. Ele pareceu nervoso por um instante.

- Então peço que agradeça a ele por mim, milady.

Atena estreitou os olhos para a mudança de comportamento do garoto, mas deduziu que ele estivesse sofrendo bastante pressão por conta do treinamento militar. Se fosse qualquer coisa como os que a deusa já havia participado, ela sabia que mudaria o caráter e a percepção de mundo que ele tinha. Acrescentar disciplina, obediência e coragem à lista de traços essenciais de um indivíduo era um processo doloroso e demorado, pelo qual todos os soldados tinham que passar. Ela supôs que Jac estivesse recebendo os efeitos iniciais dessa mudança sobre si.

- Não precisa me chamar de "milady" o tempo todo. - Atena pediu para deixá-lo mais tranquilo. - Fica irritante depois de um tempo. Só Atena está bom.

Jac acenou com a cabeça.

- Como desejar... Atena.

- Melhor.

- Então... - Jac escondeu as mãos atrás das costas. - Os rumores dizem que Atlântida terá uma nova rainha em breve.

Atena tentou a todo custo se manter impassível, mas seus lábios insistiam em repuxar, e quando se deu por si, já estava sorrindo.

- Parece que os rumores ficam sabendo das coisas antes mesmo de mim.

Jac riu.

- Bem, os criados falam. Os soldados falam. Boatos circulam rapidamente. Até o treinador já parecia saber. Todos estão muito interessados na olimpiana hospedada no palácio, justamente agora que o rei está... Em falta de uma rainha, como dizem.

Atena sentiu o sangue subir às suas bochechas, mas fez questão de manter a postura.

- Os boatos deveriam saber que não é por esse motivo que estou hospedada aqui. - ela reforçou. - Porém, nunca direi nunca, certo? Todos saberão quando os boatos se tornarem uma notícia, de fato.

Jac sorriu.

- Fico feliz por voc...

Ele ergueu a cabeça subitamente e olhou para a porta por onde Atena havia entrado com olhos atentos, como se ouvisse algo. Quando voltou a mirar a deusa, com os olhos arregalados e duas gotas de suor escorrendo da testa, sua expressão era de puro terror.

- O que foi, Jac? - Atena pousou a mão em seu ombro, alarmada.

Os olhos de Jac brilharam com lágrimas se acumulando em seus cantos em meio à vermelhidão que seu rosto assumiu.

- Me perdoe, Milady.

Ele segurou o rosto de Atena e a beijou.

Três Desejos - concluídaOnde histórias criam vida. Descubra agora