Quando cheguei a casa, para meu grande espanto, encontrei lá o meu irmão mais velho, o Miguel Duarte e a Sónia Catarina.
- Olha, se não é o foragido! – acusei cumprimentando-o com um beijo na bochecha e um abraço apertado.
- Não é para tanto, eu costumo vir cá, de vez em quando – ele defendeu-se.
- Só se for quando eu não estou em casa.
Sentei-me no cadeirão completamente estafada. Mas levantei-me logo de seguida para ir aquecer o almoço e tomar um comprimido contra a gripe.
Eles seguiram-me até á cozinha e sentaram-se á mesa.
- Já almoçaram? – perguntei retirando o meu prato do mico ondas. Meu almoço consistia em arroz e frango assado, os mesmos do jantar.
Eles assentiram e ficaram a olhar para mim.
- Desembuchem!
- Eu e a Caty pensamos em dar uma viagem aos pais, tipo um cruzeiro ou algo assim – o Miguel falou logo de seguida, como se só tivesse á espera da minha ordem.
- Porquê? – Aquilo era estranho. Eles deveriam ter algo na manga, nenhum deles se lembraria de algo assim se não tivessem segundas intensões.
- Talvez lhes sirva para clarear as ideias – a Sónia Catarina disse de forma definitiva.
Entendi, ela referia-se ao facto do preconceito deles em relação á orientação sexual da Ema Vitória.
Mas achei uma boa ideia. Se ela tivesse uma viagem romântica talvez viesse com a cabeça cheia de coraçõezinhos e assim entenderia que amor é sempre amor, seja por homem ou mulher. Entenderia que o amor é um sentimento que assiste a todos, assim como a felicidade.
- É uma boa ideia – declarei pondo uma garfada de comida á boca. – Desde que paguem vocês.
Eles olharam para mim como se dissessem: "Mano, nós contámos-te com o intuito de nos ajudares com as despesas!".
- Não me olhem assim. Eu vivo ás custas dos pais, literalmente, enquanto tu, Miguel Duarte, és rico! – apontei-lhe o dedo. – E tu, Sónia Catarina, tens um emprego que eu sei. Portanto, desenrasquem-se.
Dei e ombros e continuei a comer. Lá agora, ter que pagar uma viagem sem ter dinheiro! Eles são loucos.
Sim, eu sei, tenho de arranjar um emprego. Já pedi ao Miguel para me por a servir bebidas nas suas boates, mas ele reusou essa ideia dizendo que eu era demasiado nova e ingénua. E que nunca iria por a sua irmãzinha á mercê de possíveis bêbados depravados. Achei aquilo uma grande estupidez, mas simplesmente concordei.
Não tinha outro remédio senão fazê-lo. Mas estava disposta a encontrar outro emprego qualquer nas férias de verão, que era quando tinha mais tempo.
***
O tempo foi passando. O professor Lourenço Gostosão estava cada vez mais insuportavelmente gostoso e chato. Ás vezes ignorava-me completamente, e outras parecia que fixava em mim.
Mas aquilo estava a dar-me nos nervos, principalmente por ele apenas dizer "menina" antes do nome da pessoa comigo. Isso é descriminação!
Duas semanas depois, o Miguel voltou a aparecer em casa dos meus pais. Dessa vez trazia consigo dois bilhetes para Paris e um roteiro explicito, com tudo pago.
- Meu filho! – a minha mãe exclamou admirada, olhando para os bilhetes.
O meu pai apenas lhe deu uma chapada nas costas.
- Bom rapaz! – ele proferiu notavelmente contente.
A viagem era dali a três semanas. Eu achei um pouco em cima da hora, mas os meus pais acharam fabuloso e começaram a dizer que iriam já pedir férias e essas coisas todas.
Bem, o que importa era que eles estavam felizes, e nem o frio de fevereiro fazia com que a chama de contentamento se apagasse.
Nessas três semanas nada de muito interessante se passou. Fizemos as primeiras provas do segundo período. E tivemos quatro jogos de volei, aos quais ganhamos todos.
As aulas de matemática eram um inferno. Aquele ser monstruosamente excitante, ao qual as pessoas vulgares chamavam de professor de matemática, acabava com o meu raciocino em dois segundos. Estava cada vez pior. Aquela vontade louca de o agarrar e lhe tascar um beijão de tirar o folego, para não falar dos meus sonhos, que tinham como palco principal a secretária.
Estava a ficar passada. Considerei a hipótese de me internar num hospital psiquiátrico e tudo. Era impossível alguém em sã consciência ter tantos sonhos pecaminosos.
E numa segunda-feira com sol, os meus pais lá entraram num avião com destino a Paris. Não foi triste e nem houve aquelas despedidas super lamechas. Nós saberíamos que nos voltaríamos a ver em tês semanas.
Eu e a Catarina tínhamos a casa só para nós. Só esperava que ela não desse uma de louca e desse uma megafesta, era mesmo a cara dela fazer isso.
Bem, ela não fez nada disso. Mas no dia seguinte á partida dos meus pais, uma terça-feira, ela apareceu com um gato em casa! Literalmente, um gato! Uma bolinha de pelo todo preto.
- Olha, Maria Gabi! Estava lá fora ao frio, coitadinho.
O bichinho estava muito magro e não parava de miar.
- Catarina, o gato pode ter alguma doença ou assim – reprovei-a com m olhar severo.
- Não sejas estúpida! Vou-lhe dar comida.
E foi para cozinha, onde pôs um pouco de leite numa tijela e depois deu ao gato, que o bebeu com grande vivacidade.
- Pobre animal, estava faminto! O que vamos fazer agora contigo, T'Challa? – Ela pegou no bichinho e olhou-o nos olhos.
- T'Challa? – perguntei com uma risada, entendendo a referencia ao Pantera Negra. – Olha, Sónia Catrina, não acho uma boa ideia estares a dar nome ao animal se depois vais ter de o dar a outra pessoa. Acho melhor não te apegares.
- Nem fodendo que eu o vou dar a alguém, Gabi – ela disse indignada. – Vou ficar com ele!
- Os pais não vão deixar.
Eles não iam mesmo. Nunca quiseram ter um animal de estimação. Um cão estava fora de questão. Um gato largava muito pelo pela casa, segundo eles. E com os três peixes e as duas tartarugas que tivemos na infância, ficamos traumatizadas ao ponto de não querer ouvir falar mais em animais de estimação.
- Mas eu vou ficar com ele, caralho! – ela disse decidida. – Se eles não deixarem cá ficar o T'Challa, mudo-o para casa do Miguel.
- Ele tem um cão.
- O Bruce não faz mal nem a uma mosca, quanto mais a um gatinho indefeso.
Acabei por sair derrotada daquela discussão e com um gato em casa. Mas tinha que admitir que o animalzinho era muito fofinho e amável. Só não sabia que era ele que quase me ia matando.
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[concluída] Submersa pelo Desejo | Série Desejo - I |
Romance+18||Contém conteúdo considerado adulto. Personagens e acontecimentos são inteiramente da minha responsabilidade. Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência. ***** Já toda a gente teve aquela paixãozinha por um professor, certo? Aqu...