SEIS

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   O problema de querer tanto alguém é que, inevitavelmente, em algum momento, você vai se atropelar no meio dos seus desejos e fazer alguma merda.  No meu caso, mais besteiras do que as que eu já fiz.

   Bem, eu já cai só porquê me distrai com a cor dos olhos dele, fui mordida por um gato, apareci de pijama e mandei fotos nuas, — que nem tiveram muita reação — e  não sei mais como mostrar a esse bendito homem que não preciso de relógio para saber que já passou da hora de nos beijarmos.

   Tô passando perto de cogitar dançar a ragatanga em cima de um dos freezers com uma plaquinha escrita "pelo amor de Deus, me pega já!". E mesmo assim, ainda acho que Marcel vai arranjar um jeito de não entender. 

   Logo eu, que sempre odiei arrodeios, tenho que aguentar um marinheiro de olhos verdes e sorriso brincalhão, sem saber o que quer. Minha mente já está começando a processar "porquês" para toda essa demora. E o primeiro da lista é "falta de interesse". 

   Ele pode, simplesmente, não me querer...

   Isso é possível, certo? 

   — Eu te pago pra trabalhar. Não recebe um número entupido de zeros para ficar devaneando — Guilherme comentou, ríspido. Na noite anterior, eu tinha bebido um pouco além do normal e ligado, perguntando se poderia me buscar e depois buscar o meu carro. — E eu sou seu chefe, dono da porra de um shopping, não seu Uber! 

   Ok, ele está bem irritado.    

   — Quando foi a última vez que bebeu? Na sua formatura na Universidade?! — gesticulou de maneira exagerada. Eu comecei a trabalhar aqui muito nova e, passo a passo, subi na hierarquia de cargos. Sem trapaças, só com meu suor e esforço. — Seja lá o que estiver acontecendo com você, preciso que pare já! 

   Ergui as sobrancelhas. 

   — Por que está tão irritado? Está com inveja por não ter me afetado do jeito que ele está conseguindo? — descansei o rosto no dorso da mão. Estava cansada, a maquiagem escondia as olheiras e a cara de destruída depois da bebedeira de ontem. — Eu sou uma bêbada bem sã, Fragoso. Lembro que te irritei durante duas horas falando sobre como o Marcel é lerdo e que você até tentou tirar minha roupa na desculpa de "me dar banho"... — fiz as aspas no ar. 

   O imbecil nem fazia questão de esconder o sorriso safado.

   — Temos que aproveitar as oportunidades que o nosso Senhor dá! — levantou as mãos, olhando para cima. Deus, essa é a hora de fazer um raio cair na cabeça dele! — Mas, por favor, se falar mais uma letrinha sobre esse cara, eu juro que... Sei lá, te demito! Ele vai acabar afetando o seu desempenho no trabalho! — meneou a cabeça.

   Eu tive que rir.

   Enxuguei as lágrimas que caiam dos meus olhos e puxei o ar.

   — Afetar o meu trabalho?! — puxei as enormes pastas de trabalho já feito e juro que, por um milésimo, não as joguei em cima da mão dele. — As planilhas detalhadas com o desenvolvimento e estimando o crescimento das lojas no próximo mês...

   Guilherme franziu o cenho. 

   — Mas isso é para daqui a três meses...

   — Justamente! Então, pense muito antes de, nas entrelinhas, me chamar de estúpida apaixonada e incompetente. — cruzei os braços. Eu poderia estar sentindo um abismo (nem posso chamar mais de queda) pelo carinha dos frios, mas isso nunca mexeria na forma que cuido da minha carreira. Não lutei tanto para me perder por causa de uma atraçãozinha boba. — Estamos entendidos, Dr. Fragoso?

O Sabor Dos Seus Lábios - As Whiter'sOnde histórias criam vida. Descubra agora