Capítulo 11

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Observei-o sair, estava com seus punhos cerrados, faz isso quando tenta controlar a raiva. Respiro fundo, tentando não deixar o medo me dominar. Me sento novamente e fico encarando a tela da TV, completamente escura, sem utilidade, assim como eu no momento.

Penso, reflito, relembro, me questiono. Quando vejo já se passaram duas horas e estava no mesmo lugar, me estico e pego meu celular que está na mesa de centro. Disco o número do Marcel, não sei quando o gravei, mas gravei.

— Alô?! — Sua voz rouca e lenta invadiu meus tímpanos, causando alívio imediato.

— Oi, Mar. Onde você está?

—Na biblioteca do colégio, adiantando o serviço. Por quê? Sua voz tá trêmula, tá tudo bem?

—Vai ficar, eu estou indo para aí!

Desliguei o celular e sai daquela sala. Tomei um banho rápido, escovei os dentes e sai como se minha casa estivesse pegando fogo ou desmoronando. Coloquei a chave na ignição e dirigi meio perturbada, confesso, quem não estaria em meu lugar? Ficava tamborilando o volante nos sinais vermelhos, checando o celular quando parava em uma faixa de pedestre, olhando para as ruas e calculando mentalmente a distância até a escola.

Virei a esquina e lá estava ela. Estacionei meu carro de uma forma bem imprudente e praticamente corri para dentro, à tarde só ficam os alunos que fazem parte de algum grupo ou time. Começo a me aventurar pelos corredores. Clube de química. Clube de mágica. Clube de ioga. Clube de Stand-up. Clube de RPG. Clube do livro. Refeitório. Banheiro. Sala doze, treze e catorze. Biblioteca!

Abri a porta dupla tão rápido que todos lá dentro me lançaram olhares furiosos, inclusive a bibliotecária. Fazendo seu clássico:"Shhh!".

— Desculpe. —sussurro.

Vejo Marcel empurrando um dos carrinhos de metal mutuado de livros velhos e empoeirados, seguro sua mão bruscamente e o carrego para dentro de um dos corredores. Então o abraço, como se não o tivesse visto há um ano, como se ele tivesse morrido e voltado, ou como uma mera lembrança que eu não queria me desfazer.

— Não que eu esteja reclamando, mas posso saber o motivo disso tudo? — sussurra no pé do meu ouvido. Hálito quente e com cheiro do chiclete de canela preferido dele.

O solto e ele logo vai limpar seus óculos na camisa, provavelmente sujo. Enquanto isso, volto para o corredor principal e pego o carrinho abandonado, desfazendo a expressão desconfiada da bibliotecária.

— Ryan esteve na minha casa, ele disse que ia fazer alguma coisa a você, eu não sabia se ele já tinha feito. Me desculpa! — Meu olhos começam a marejar e ele me envolve em seus braços novamente.

— Vai ficar tudo bem...

— Não tá com medo? — Pergunto, repousando minha cabeça em seu ombro.

— Jamais terei medo se estiver ao meu lado.

—O que vamos fazer?

—Que tal você só me ajudar com esses livros? – Marcel pergunta, levantando meu rosto. — É só coloca-los em ordem alfabética, cor e autor. Na verdade é só em ordem alfabética mas eu sou um pouco perfeccionista.

E do nada uma risada sai da minha garganta e posso escutar mais um "shh" da bibliotecária. O que só faz eu e Marcel rimos ainda mais. Eu não sabia o que o mundo reservava para nós amanhã, não importava, tudo que importava estava aqui, comigo, agora. Ele era tudo que importava.

***

As prateleiras estão com mais poeira do que eu achei que fosse possível, estou no meio da seção A/B. Acho As crônicas de Nárnia, já tinha assistido o filme quando era pequena mas é sempre bom comparar. Começo a folheá-lo e quando vejo já li quinze páginas.

Everything Has Changed | H.S.Onde histórias criam vida. Descubra agora