Diana ficou em silêncio por alguns minutos. A situação não era das melhores para nenhum de nós dois. Ela tinha se casado com alguém que não amava. Eu estava em um relacionamento que parecia evoluir. Nenhum de nós sabia bem o que seria dali para frente.
Foi ela que quebrou o silêncio novamente:
- Quando eu disse pra você naquela noite que você devia ficar com alguém que realmente gostasse de você, é porque estava triste. Eu tive medo de falar o que sentia e te assustar, e isso foi tão grande que eu guardei. Guardei e entendi que se Fábio me amasse como dizia que me amava, esse amor seria o bastante para ignorar esse sentimento fulminante que tive por você. Ah, Érico. Foi tão difícil. No dia em que fomos ao seu restaurante, um dia depois que te atendi, tudo ainda estava muito estranho na minha cabeça. Eu senti uma queda por você naquele momento, mas achei que fosse algo absolutamente passageiro. Quando Fábio me pediu em casamento, na frente do seu prédio, eu juro que olhei para a sacada antes de aceitar. Sei lá, tinha alguma esperança que você aparecesse e gritasse por mim. Ao mesmo tempo, me senti muito idiota. Era impossível, na minha cabeça, que você pudesse ter sentido o mesmo. Se é que sentiu.
Ela falava com tristeza, mas com firmeza. Diana era muito firme em todos os momentos. Já disse: ela poderia falar sobre a guerra. Pareceria um encontro de amigos. Quase que simultaneamente à sua dúvida sobre o que eu sentia, respondi:
- Eu senti. E me odiei por ter perdido o controle. Mas senti como nunca na vida.
Ela não respondeu. Apenas prosseguiu com seu relato.
- Quando Fábio quis que o casamento fosse no seu restaurante, eu já me sentia completamente apaixonada por você. Me julguei todos os dias, me penitenciei. Tudo parecia muito ridículo e inacreditável. Eu não quis que fosse lá. Mas Fábio amou tudo e eu não tinha motivos possíveis para recusar. No final do casamento, quando abri a porta da cozinha, eu vi ali me esperando alguém que eu verdadeiramente queria conhecer. Me arrependi do casamento enquanto estava me casando. Quando você me perguntou como tinha sido o casamento, tive vontade de chorar. Nem consegui disfarçar, dizendo que “ia ficar tudo bem”. Não é o que se espera de uma noiva.
Minha cabeça doía um pouco. O excesso de informação me enlouquecia. Só consegui dizer, balbuciando:
- Isso tudo é uma loucura.
Pela primeira vez, ela seguiu meu raciocínio, voltando da viagem própria.
- Também acho. Eu não acredito em amor à primeira vista, Érico. Mas por você, senti algo que nunca senti na vida. Uma vontade de que você seja feliz a qualquer preço, um desejo profundo de que eu pudesse dividir ao menos um pouco da minha vida contigo. Você é iluminado, Érico.
Meu coração estremeceu com a declaração. Infelizmente, a essa altura, Antonia já voltava a ser uma imagem distante.
A mão dela procurou a minha e senti pela textura de seu toque que o que vinha a seguir era algo íntimo e delicado, que ela não sabia se podia contar. Segurei sua mão com firmeza para mostrar que podia confiar em mim. A ouvi suspirar e dizer na sequência:
- Fábio sentiu que alguma coisa tinha acontecido durante o casamento. Me levou para uma lua de mel de três meses que foi horrível. Perdemos completamente o contato e a intimidade. Senti que ele passou a ser rude comigo e me acusar de tudo, mas nunca imaginei que ele me jogaria de um carro. Quando te falei ontem sobre ele com ternura, é porque estava mentindo pra mim mesma. Já tem um tempo que Fábio tem me assustado. Eu não quis acreditar que isso estivesse acontecendo, e olha no que deu.
Ela hesitou por alguns instantes e falou:
- Estou com medo, Érico.
Eu sabia que era verdade. As palavras saíram sozinhas pela minha boca.
- Não precisa ter medo. Eu vou te ajudar. – tentei ser protetivo. Ela imediatamente me corrigiu.
- Estou com medo de mim. Olha o que eu deixei acontecer. Olha como me perdi a ponto de não considerar que as coisas transformaram meu casamento com Fábio em um relacionamento abusivo... Não me perdoo.
Ver Diana conversar consigo mesma e tomar posse de seus pensamentos me fez lembrar o quanto eu amava sua independência e liberdade. Por algum momento, achei que ela precisasse de proteção. Era a última coisa que precisava. Diana precisava conversar, precisava de parceria, precisava de um apoio que não se assemelhava a nenhum tipo de condescendência. Exatamente o mesmo que eu buscava para a minha vida.
E isso, de novo, era apaixonante.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Dias que eu não vi
RomanceLIVRO NA LONGLIST DO WATTYS 2018 Érico é um chef de cozinha deficiente visual que sempre lutou com muita determinação para alcançar seus objetivos, até que Diana entra em sua vida com um amor fulminante que o transforma. A história é narrada pelo pr...