Capítulo 43 - Atrás do prejuízo

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No instante em que a porta se abriu, eu sabia que tudo entre Diana e eu estaria abalado. Ela podia confiar em mim com todas as forças, mas abrir a porta de casa e me ver abraçado em Antonia depois de tudo que aconteceu abalaria a confiança de qualquer um. Eu pensei em mil coisas para dizer, mas nenhuma pareceria verdade. Eu tinha raiva de Antonia por tudo que tinha acontecido, mas ela tinha vindo até ali para ser sincera. Não conseguia mais guardar rancor e até então isso era uma coisa boa. Mas o olhar de Diana na porta era algo que eu nunca mais esqueceria na vida. Diana ficou congelada na porta por alguns instantes, Antonia ficou absolutamente sem reação e eu tentei me aproximar. Foi quando Diana chorou e, na sequência, disse:
- Eu não preciso disso, Érico. Eu não preciso. Depois de tudo que ela fez... depois de tudo que passamos... recebê-la dentro de casa...
Eu tentei falar a verdade:
- Diana, Antonia está indo embora. Veio aqui me contar coisas importantes que eu não sabia. Ela assumiu toda a responsabilidade por muitas coisas que eu ainda não sabia. Por favor... não entenda tudo isso da forma errada... eu sei que é muito difícil acreditar, mas você me conhece melhor do que ninguém... sabe que eu não seria capaz de enganar você.
- E ela precisava contar isso abraçada em você? Quando você pretendia me contar sobre isso, seja lá o que for isso?
- Imediatamente, Diana. Imediatamente. Foi só um abraço de despedida. Eu não vou mais encontra-la, eu juro.
Antonia chorava contida no sofá. Diana já não lhe dava mais atenção. Apenas falava comigo com muita firmeza mas sem abrir mão de derramar lágrimas que pareciam cravar punhais no meu peito.
Eu me sentia entre a cruz e a espada. Pensava em cobrar de Diana a confiança que sempre mantivemos um no outro, mas exercitando a empatia tive consciência que eu teria a mesma reação se a visse com Fábio.
Por fim, Diana disse:
- Você é a pessoa mais confusa que já conheci, Érico. Se deixa levar por qualquer sentimento alheio e nunca percebe se está sendo enganado. Mais dia, menos dia, ela aparece com alguém aqui pra te bater de novo. Você prega tanto a independência que tem, mas escorrega toda vez que alguém aparece oferecendo ou pedindo colo. Eu não admito ser enganada assim. Achei que você tinha mudado. Achei que enxergar te faria mais forte. Mas você continua cego da alma.
Aquela sentença foi tão forte que mexeu também com meu ego. Esquecendo completamente a presença de Antonia ali, respondi:
- Você pode não me conhecer tão bem, Diana, mas eu sei da minha verdade. Eu estou dizendo a você que nada aconteceu aqui. Você tem a opção de confiar na minha palavra ou confiar no seu devaneio. Eu confio na minha palavra, porque foi exatamente o que aconteceu.
Diana parecia refletir minhas palavras, mas, visivelmente magoada, olhou no fundo dos meus olhos e disse:
- A gente conversa outra hora, Érico. Agora fica aí com ela. Termina o que tem pra fazer ou falar. Eu não tenho mais nada pra dizer.
Corri atrás de Diana, mas ela gritou dizendo para que eu não a seguisse. Eu ignorei seu pedido e segui me aproximando. Toquei seu ombro e ela virou-se, furiosa, dizendo:
- Eu já disse pra não me seguir!
Saiu, bateu a porta, e eu fiquei ali. Com Antonia na sala, a alma na mão e o coração porta afora.
Voltei para o apartamento sentindo muita raiva de Antonia, que continuava ali chorando contidamente. Gritei:
- E você não podia ter dito nada? Não podia ter dito que eu dizia a verdade? Qual é o seu problema, Antonia?!
Ela levantou os olhos para mim e nada disse mais uma vez. Eu continuei:
- Como é que você consegue entrar aqui sem ser anunciada toda vez? Como é que consegue trazer tantos problemas pra minha vida?
Antonia permanecia calada. Minha raiva só aumentava:
- Por que você transformou minha vida nesse inferno? Por que quis ficar comigo se SABIA que eu amava outra pessoa? Por que se sujeitou a isso, Antonia?
O silêncio pairava. Logo depois, eu caí no choro. Não queria ter dito tudo o que disse, mas agora tudo estava feito. Antonia enxugou as últimas lágrimas do rosto e me disse:
- Vou responder da primeira até a última pergunta. Eu não disse nada porque há algum tempo era eu no lugar de Diana. Era eu na Itália, sozinha. Eu entendi o que ela sentiu, e isso me deu algum prazer no início, mas depois eu percebi o quanto dói achar que fomos enganadas por quem mais amamos. Se eu dissesse qualquer coisa, Diana não acreditaria. Foi melhor que eu ficasse calada. Em segundo lugar, eu consegui entrar aqui porque disse ao porteiro que ainda somos amigos. Contei pra ele o quanto nós nos divertimos juntos e o quanto eu gosto de você por, mesmo não sendo mais o meu homem, me tratar tão bem. Por algum motivo, ele acredita em mim. E isso me preenche. Por fim, eu aceitei tudo isso que você falou por um motivo simples: eu nunca conheci alguém como você, Érico. E apesar de tudo o que aconteceu, eu sinto que a minha vida já valeu a pena pelo simples fato de eu ter podido passar alguns dias dela contigo. Mesmo que eu te esqueça, em algum lugar de mim, eu vou te amar pra sempre.
Eu não sabia o que responder. Já não sabia mais se era verdade ou algum delírio, tudo parecia confuso outra vez. Antonia, então, concluiu:
- Fique tranquilo. Isso tudo aqui vai se resolver. Eu fui sincera quando disse que você e Diana são perfeitos um para o outro. Por isso mesmo, não vou deixar nenhuma injustiça ser cometida. Seja muito feliz, Érico. Que a sua visão te proporcione enxergar ainda mais do que você já enxergava com a alma. Nunca vou esquecer você.
/// Aquelas palavras me fizeram esquecer por um instante todo a situação com Diana. Parecia de fato que Antonia falava a verdade. Eu não sabia como resolveria tudo, mas me lembro que Antonia se levantou do sofá, veio em minha direção, me deu um demorado beijo na bochecha e segurou meu rosto com carinho olhando fundo em meus olhos. Carregava um sorriso triste.
Antes de fechar a porta, me lançou um olhar de cumplicidade para dizer:
- A do vestido de repolho vai voltar. Eu prometo.
Eu estava ali sozinho outra vez. Tentei ligar para Diana, mas é claro que ela não atendeu. Toni sentiu minha tristeza e correu para colocar a cabeça sobre minhas pernas e, à sua maneira, me oferecer colo.
Ficamos ali pouco mais de uma hora. Depois desse tempo, me surpreendi com Diana entrando no apartamento. Corri em sua direção e tentei abraçá-la, mas ela me rejeitou.
Tentei argumentar:
- Diana... não aconteceu nada. Eu juro por tudo que você quiser. Ela veio aqui me dizer coisas absurdas sobre o que foi capaz de fazer e seus motivos pra isso... eu jamais retomaria uma relação com uma pessoa assim.
- Eu não sei, Érico... confio em você, mas tudo isso tem me deixado muito confusa. Esse afastamento depois de você voltar a enxergar, agora essa “visita surpresa” de Antonia aqui... Não estou me sentindo bem. Preciso pensar um pouco.
- Diana, por favor... acredite em mim... não faça isso...
- Érico, isso não é um decreto do fim. Seria precipitado. Mas eu preciso organizar a minha cabeça. Você pode achar que não, mas eu também sinto as porradas da vida de vez em quando. O que me garante que essa vida com Antonia não vai ser pra sempre? O que me garante que você não vai abrir a porta pra ela amanhã de novo?
- Diana...
- Eu já tomei minha decisão, Érico. Preciso de um tempo. Uma semana, um mês, não sei. Mas não quero ficar aqui agora. Vou ficar com uma amiga do hospital por uns tempos.
//
Só me restou consentir. Ela não voltaria atrás. Podia ser exagerado, mas ela parecia lúcida. Não era apenas a situação com Antonia. Aquela cena foi só a cereja do bolo de um mês muito conturbado de extrema alegria, mas com contraponto de afastamento.
Talvez aquele tempo fosse necessário.
Outra vez, a confusão tomava meu peito. Eu não sentia culpa, não sentia raiva de ninguém.
A sensação era que eu não sentia nada.
Foi bom aproveitar aquela sensação. Porque, pouco tempo depois, eu sentiria muito.

Dias que eu não viOnde histórias criam vida. Descubra agora