38. Correndo

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Anne era decidida não suas resoluções e por isso eu decidi que talvez pudesse ajudá-la. Convencer Jake a deixar essa história seria uma tarefa absurdamente difícil mas eu teria que tentar. Eu havia prometido.

Jake não havia me ligado depois daquela vez em que eu não apoiara a ideia que ele estava tentando executar, mesmo eu não sabendo o que era. Talvez ele já tivesse descartado minha amizade, ou talvez estivesse somente emburrado comigo.

Desde o dia em que eu conheci Jake naquele bar, no centro de Jeanville, eu notei que ele era um tanto malandro mas era um carinha legal. Naquele dia ele havia se envolvido em uma briga e levara um belo soco na cara. Bêbado como estava, caiu no chão e mal conseguia se levantar. Ninguém se dispôs a ajudá-lo, até que eu sai do meu canto e fui lá. Todos ficaram me olhando de esguelha, afinal, eu era um cara conhecido ali e tinha uma boa reputação, diferente de Jake. Eu passava por ali três vezes por semana para beber um pouco de vinho. Escolhia uma mesa mais ao fundo e saboreava minha bebida. Jake gostava de ficar lá no meio da bagunça, enchendo a cara de cerveja e mexendo com toda e qualquer mulher que passasse diante dele.

Eu levantei o marmanjo, carreguei-o para fora e o ajudei a entrar no meu carro. Dei a volta e entrei do outro lado, enquanto Jake limpava o nariz ensanguentado na camisa amarela.

- Onde você mora, cara? - perguntei.

- Eu não vou ir embora - disse Jake com a voz mole.

- Você não está em condições de continuar por aqui, brother.

Ele bufou, cruzou os braços e olhou para mim com uma indignação digna de um bêbado.

- Você não vai me levar para casa - disse ele.

- Não, eu não vou - eu disse já de má vontade - Vou andar duzentos metros e jogar você na calçada, imbecil. Está melhor assim?

- O que? - disse ele segurando a gola do meu paletó com a mão suja de sangue, jogando um bafo nauseante de cerveja no meu rosto.

Minha paciência acabou nessa hora. Eu enfiei meu cotovelo no pescoço dele e empurrei-o contra a vidraça da porta do carro. A cabeça dele deu uma pancada no vidro e ele soltou a gola da minha roupa, fazendo um sinal que estava sem ar, mas eu mantive a pressão, indicando que eu estava no comando da situação.

- Escuta aqui, playboyzinho, eu estou fazendo um favor para você. Se você quiser continuar sendo saco de pancadas lá no bar é só descer.

Eu soltei o pescoço de Jake e ele tossiu e ficou arfando durante alguns segundos.

- É só seguir em frente - disse ele se recompondo e apontado um dedo trêmulo para a rua adiante.

Nesse dia eu não criei nenhuma simpatia por ele, mas dois dias depois ele me viu no mesmo bar e veio me pedir desculpas pela raiva que me fizera passar e me agradecer pela carona. Daquele dia em diante nos tornamos amigos e sempre saíamos para beber juntos e, é claro, Jake bebia muito mais do que eu, apesar de eu conseguir controlá-lo um pouco.

Agora eu estava num dilema. Como amigo, o que eu teria que fazer? Convencê-lo a parar com a besteira que estava fazendo sem citar o contato com Anne era praticamente impossível, mas eu teria que fazer alguma coisa.

Antes que chegasse a noite, liguei para Jake para convidá-lo a tomar uma cerveja. Para minha surpresa, ele me tratou tranquilamente e pareceu não se lembrar do sermão que eu tinha passado nele.

Cheguei ao bar e fiquei esperando por alguns minutos antes que Jake aparecesse. Eu fui a pé, pois o bar era bem perto de minha casa mas Jake com certeza estaria de carro.

Ele entrou no bar e me viu no fundo, na mesa onde eu já estava acostumado a ficar. Jake sentou-se, apertou a minha mão e se serviu da cerveja que eu já havia pedido.

- Como estamos? - disse ele, apoiando o cotovelo na mesa.

- Estou ótimo - eu respondi, um pouco tenso.

Eu estava tentando pensar em como abordá-lo sem parecer agressivo e sem mencionar Anne. Minha conversa com ele não parecia que iria render muito então, resolvi que teria que ir direto ao ponto. Jake já havia bebido dois copos de cerveja e não estava nem perto de parecer tonto.

- Jake, - comecei - lembra aquela vez que você me falou sobre a Anne é o namorado dela?

Jake me encarou intrigado.

- Sim, eu lembro.

- Então, o que resolveu fazer? Já se vingou dele? - eu disse jogando minhas cartas na mesa.

Jake sorriu e eu sabia que ele estava satisfeito com o que estava fazendo. Ele só não sabia que eu já sabia de toda a história.

- Ah! Sim. Ele já deve estar sentindo as consequências de ter mexido comigo.

- Jake, você não pensou que, se por acaso, alguém descobrir, você pode se encrencar feio?

O semblante de Jake mudou de satisfeito para tenso.

- Ramon, não começa...

- Eu estou falando sério, Jake. Isso pode acabar mal.

- Eu sei o que eu estou fazendo, Ramon. Não preciso que você faça papel de consciência para mim.

- Eu não quero ser sua consciência, brother. Eu sou seu amigo e me preocupo...

- Então já pode parar. Ninguém vai descobrir o que eu...

- Já descobriu, Jake - eu disse, interrompendo a frase dele.

Jake ficou olhando para mim, um tanto surpreso.

- Já descobriu e você vai se ferrar se continuar com isso. Eu já sei o que você está fazendo.

Ele ficou extremamente incomodado e aturdido com o que eu havia falado.

- O que você sabe? - disse ele se inclinando em minha direção.

- Sei tudo.

- E quem te contou?

Eu tomei um pouco de vinho que havia pedido para mim e respirei fundo.

- Jake, eu não iria falar com você se você não estivesse correndo risco. A Anne me procurou e me pediu ajuda.

- O que? Aquela filha da mãe...

- Jake, - eu interrompi novamente - se você não parar ela vai te entregar para a polícia.

Jake estacou e ficou me encarando.

- Ela não tem provas.

- Ah, se tem - eu menti, tentando amedrontá-lo.

- Então pra que ela quer sua ajuda?

Eu respirei fundo e tentei parecer o mais normal possível.

- Jake ela não quer te denunciar. Ela pediu pra eu tentar te convencer.

- Pois não conseguiu.

Jake se levantou sacudindo a mesa e saiu correndo por entre as pessoas no bar. Eu levantei e o segui.

- Jake, espera!

Ele não me ouviu ou, se ouviu, se fez de surdo e continuou saindo.

- Coloca na minha conta! - eu gritei para o dono do bar.

Jake atravessou a rua correndo e entrou no Land Rover. Antes que eu conseguisse chegar perto ele ligou o carro e saiu cantando pneus. Eu fiquei quase no meio da rua vendo-o se afastar.

- Droga! - gritei.

Agora eu não sabia mais o que fazer. Jake poderia estar indo para qualquer lugar, inclusive, poderia tentar encontrar Anne.

***

Olá queridos e queridas!
Mais um capítulo para fechar a semana!

Aproveitem e não se esqueçam dos comentários e votos.

Abraços!!! 😸

Um inverno entre nós (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora