Capítulo 16

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ERIN

Algumas garrafas de bebidas alcoólicas estão espalhadas pelo chão, enquanto meu corpo entorpecido repousa sobre o gramado da casa. O céu está bonito hoje para ser notado e apreciado por qualquer tipo de expectador.

Na maioria das vezes, olhar para as estrelas trazem fundamentos que variam entre inspirar os apaixonados, extasiar os astrônomos e apontar direções que devem ser seguidas. O meu caso era o último e incontestável. Eu sempre buscava um rumo para seguir em frente, mesmo que o meu passado me empunhasse para trás.

Assoprei a fumaça expelida pelo pulmão, sentindo o meu diafragma se expandir aos poucos, desgastando ainda mais o interior de uma carcaça vazia.

O celular que está em minha calça começa a tocar e de imediato eu o saco para atender. Não reconheço o número que aparece no visor, mas há uma razão para um congelamento instantâneo: o código do telefone era estrangeiro, especificamente, da Holanda, Amsterdã. Atendi, apenas colocando o aparelho em meu ouvido.

— Tulipa?

Suspirei assim que a tensão abriu espaço para a pieguice. Aquela voz... era de um homem muito importante em minha vida. Meu herói e genitor.

— Pai...

— Essa é a minha filhota! — Ele diz, o tom melancólico em sua voz. — Eu não posso descrever o quanto sinto falta da sua voz, do seu sorriso, de você...

— Eu sei — respondo, contendo um soluço. — Eu sei — repito, para que ele entenda que a sua falta de definição também é a minha. — Estou muito feliz que tenha ligado — enxugo os rastros da lágrima que desceu ligeira em meu rosto.

— Não estou lhe atrapalhando?

— Claro que não, tenho todo o tempo do mundo para você.

— Como estão indo as coisas por aí? Você está bem?

— Estou sobrevivendo — dou um sorriso amarelo antes de recitar um ditado que é apenas nosso, acompanhado por ele: — Sobreviver é a nossa sina, mesmo que um punhal esteja profundamente cravado em nossos corações.

— Minha doce tulipa... — A forma carinhosa como ele sempre me chamava era única e especial. Minha mãe adorava flores, as suas preferidas eram tulipas. Ela tinha uma estufa em casa com várias espécies e cores e aquele lugar, segundo o meu pai, era o seu preferido no mundo. Após a sua morte e meu nascimento, ele passou a cuidar do espaço, tendo-o também como fonte de carinho e amor. Desde então, aos seus olhos, tornei-me sua tulipa.

Olho para o lado, observando a minha própria estufa ao longe, tenho certeza de que ele irá adorar conhecer o lugar que eu fiz em homenagem a ela.

— Você deveria voltar para o seu velho de coração fraco e nostálgico. Você sabe que irei lhe proteger de todos os males.

— Eu não... eu não posso. Na verdade, eu não consigo... Não dá.

— Escute, até os maiores demônios podem ser enfrentados.

— Dessa vez o maldito é mais forte do que eu — sorrio, enxugando mais algumas lágrimas insistentes. Volto a seriedade em questão de segundos. — A dor é um sentimento difícil de ser superado.

— Não seja tola, você é mais forte do que imagina.

Ah, pai, queria que estivesse aqui com todo o seu otimismo — digo em um fiapo de voz coberto de sinceridade. Se passaram longos meses desde a sua última ligação; era desesperador reconhecer que com os últimos anos de ausência eu não conseguia mais me lembrar do seu cheiro, da textura de sua pele. Sequer me lembro das sensações dos cafunés que eu tanto amava receber.

Benefício da Dúvida (+18)Onde histórias criam vida. Descubra agora