Capítulo 24

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— Não acho que me devas nenhum tipo de satisfação pelo ocorrido mais cedo. — Torci os punhos da coberta em lã ao proferir as palavras que de certa forma se contradiziam com aquilo que estava a sentir no momento. Tão certo como a lua que agora reinava no céu majestosamente iria embora pela manhã, tinha a convicção que aquilo que tivemos não havia passado de sexo casual. Entretanto, a agulha com um fio chamado decepção costurava os fragmentos do meu coração desesperançado. Havia desnudado a minha alma para Romero. Contando-lhe segredos que jamais tencionei confessar a alguém.

— O pai da Melina é ex-namorado da Miranda. Um homem que não merecia ser agraciado em ser pai. — Romero começou a falar olhando para a escuridão que cercava-nos. — Odiava a mãe e menosprezava a filha. Tentando prejudicar a carreira de advogada da Miranda, ele acabou por usar a Melina como um alvo. Santos era um homem vil que faria qualquer coisa para sabotar o futuro da sua ex-companheira, isso incluia retirar a guarda total da menor. Ele não queria ser pai. — A veia em seu pescoço estava a saltar de forma frénetica enquanto ele cerrava o maxilar. — Não amava a Melina como ela deveria ser amada. Queria apenas ferir Miranda afastando-a da sua filha. — Romero fez uma pausa que perdurou alguns minutos. — Devido a insígnia que carregava em seu peito por ser um dos melhores tenentes do batalhão quarenta e sete do corpo de bombeiro de Ponteareas, Santos conseguiu o direito da guarda exclusiva. Ele era o héroi no batalhão e o vilão em casa. A menina não tinha a mãe, muito menos o pai por perto. Foi largada nas mãos de cuidadoras por horas, dias seguidos.

Por vezes a crueldade humana assustava-me. Como alguém poderia fazer mal ao seu próprio sangue?

— Melina tinha seis anos quando conheci-lhe. Era uma criança amável e inteligente. A doçura em sua voz conquistou-me. Ela merecia bem mais amor que lhe era oferecido. Desde o princípio quis proteger aquela garota do homem que supostamente deveria fazê-lo. Jurei que não permitiria que nada de mal acontecesse com ela, que seria seu protetor enquanto respirasse. E foi o que fiz, Ilídia. — Tomando fôlego, continuou. — Reuni provas, testemunhos privados. Mesmo com as alegações contra Santos, a guarda ainda era totalmente sua. Um ano passou e Melina ainda continuava a viver no inferno. Já estava a perder as esperanças quando uma das cuidadoras resolveu procurar-me, seu relato levou o juíz do caso reabrir o processo de responsabilidade parental. Melina voltou para casa, todavia não era mais uma criança feliz. Começamos a trilhar um caminho árduo para lembrar o quanto ela era querida e como estávamos felizes por tê-la em nossas vidas.

— És o verdadeiro pai da Melina. — Ditei ao encontrar amor em seus olhos. — Tenho a certeza que ela tem orgulho de tudo que fizestes.

— Ela é a melhor parte da minha vida. Quando a perdi uma segunda vez, pensei que seria meu fim.

Queria perguntar o motivo da Miranda ter ido embora levando consigo uma parte do Romero, entretanto não cabia a mim questioná-lo.

— Você ainda a ama. — A confirmação correu para fora dos meus lábios como numa melodia dolorosa de se ouvir. — Além de conversar com Miranda, precisas ir ter com o Renato. Sei que não suportas a ideia de estar no mesmo lugar que ele, contudo tens de o ouvir. Entre vós há um abismo de desentendimento, ódio, culpa e remorso que seria capaz de aniquiliar toda uma vida. — Senti novamente aquele pontada sobre o coração. — Tenho a certeza que ainda há tempo para restaurar aquilo que ficou para trás.

A trama das suas vidas foram tecidas em uma só.

— Ilídia, — Sua mão envolveu meu pulso. — disseste que a amo, estás enganada. Um dia ela já foi todo o meu mundo, hoje não. — As palavras suscitaram um brilho triste em seu olhar. — Nunca cogitei magoar-te. Não tencionava fazê-lo. Miranda é apenas alguém do meu passado, mas Melina é uma parte minha.

— Não podes voltar a perdê-la outra vez. — Disse me afastando de volta para casa.

— Nem a ti. — Pensei ter ouvido entre as lufadas da bruma que cercava-me.

Meu coração estava em meio aos destroços das revelações que esta noite trouxera.

Romero HÁ 9 ANOS

Padre! — Melina saltou para meus braços. Respingos de cores vivas cobriam boa parte do seu rosto e de seus fios de cabelos num intenso ocre ouro. Seus dedos deixaram vestígios de uma tinta azul no tecido escuro do Black-tie que vestia. — Perdão. Não queria sujar-te, papá.

Seus enormes olhos castanhos toldaram em lágrimas rasas.

— Não te preocupes com isto, Lina. Está tudo bem. — O traje exigido para o jantar de gala da conversão de advogados ganhara um pormenor que faria a Miranda reclamar durante toda a noite. — Assim lembrarei de ti quando estiveres longe. Deixastes tua marca neste Lagerfeld sem graça.

— Sou uma artista?

— És a melhor, Lina. — Beije-lhe o cima da cabeça enquanto sentia seus braços em torno do meu pescoço.

— Eu amo-te tanto, Padre.

Sorri ao ser envolvido por mais um abraço.

— O que aconteceu aqui? — Miranda estava a olhar para o pigmento azulado que agora realçava o Black-tie. — Cassiano não podes te encontrares com o Alvarez neste estado. Não esperamos um ano e dois meses por este jantar para te apresentares assim.

— Ele é um juíz, Miranda. Não um estilista ditador de moda.

Melina sorriu ao passo que uma carranca nascia no rosto da bela mulher ao meu lado.

— Depois não digas que não avisei-te, Romero. — Seu braço passou em torno da minha cintura, Melina pousou a mão no rosto da mãe que sorria.

— Eu amo-vos. — Sorri satisfeito em tê-las em minha vida.

Melina dedilhou a conta em madeira perolada.

Aquela que a representava.

⏳🔁

Bom final de semana, queridas leitoras.

Alguém gostaria de ler mais um!? 👀😘

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