Dedicado: anaclaudiadatas
"Um passo a mais e tudo ficará bem."
"Um passo a mais e ficarás livre de todos os rumores que te cercam."
"Um passo a mais e serás liberta de toda a dor que está a consumir-te por dentro."
"Um passo a mais e nunca mais sentirás olhares de repúdio."
"Um passo a mais e ninguém sentirá tua falta."
"Um passo a mais e encontrás a paz."
O vento primaveril espalhou no ar as pétalas roxas das glicínia que cresciam no lado oposto da velha escadaria.
Inalei a frangrância pensando que esta seria a última vez que estaria naquele parapeito.
Dei mais um passo desejando ser um pouco mais corajosa. Um dor inigualável se vertia em meu íntimo, destroçando quem eu realmente era. Era sufocante, sentia que o ar a minha volta era demasiado insuficiente para meus pulmões. Tudo que eu mais queria era acabar com aquele agonia que tinha se alojado em minha alma.
"Um passo a mais."
— É um lindo dia. — Prendi as mãos envolta do ferro que cobria uma extensão do parapeito. — A primavera tens seus encantos.
Não olhei para trás.
— Pensei que você não viria hoje.
Meu coração sucumbiu no peito.
— Esta visão nos faz acreditar que apesar das noites escuras, sempre vale acreditar no amanhecer.
Não queria escutar frases de efeitos naquele momento.
— De qual púlpito vem este sermão? — Cuspi-lhe as palavras com raiva.
— Perdão?
— É muito fácil oferecer conselhos quando os dias maus não calham à ti. — Por um segundo, desconfiei quem era aquele homem de voz mansa. — De certeza, estás a pensar em que meu ato acarretará na compra deste prédio. Soube que o lugar está a ser averiguado para uma possível venda. — Talvez nesse momento, o empresário estivesse a olhar para seus oxford bem polido ou a reajustar a gravata que o vento estivera a levar enquanto tentava persuadir-me a descer da sua cobertura.
"Um passo a mais."
— Acredito que os fardos que carregamos na vida são nos dado com o intuíto de tornar-nos mais fortes. — Continuou a falar, inalterável pelo meu conhecimento sobre o prédio que em breve desabrigaria boa parte dos sem tetos que moravam na parte baixa da construção esquecida.
"Um passo a mais, Ilídia. Só um."
Um mão esculpida com calos e grumos altos se fechou ao redor do meu braço. Uma camada de sujidade cobria suas unhas, sua pele estava num amarelo doentio.
Estas mãos não pertenciam a um empresário renomado.
— Se faz favor, deixei-me morrer aqui. — Era um apelo desesperado. Ao mesmo tempo que queria ser livre daquele martírio, queria que aquele homem continuasse a segurar meu braço.
— Se caíres, vou contigo. — Ele continuava a sustentar meu peso, ele não desistiria. — Não sei o que te aconteceu, miúda. Mas, há uma vida inteira a tua espera. Dores e decepções farão sempre parte das nossas vidas. Não precisas desistir agora. — Medo foi expurgado da minha alma em formas de lágrimas. — O inverno leva todas as cores e esperanças, mas a primavera sempre chega.
— Por favor...
— Vou continuar a segurar-te mesmo que não consiga sentir mais meus dedos. Eu não vou soltar você.
Seus dedos estavam a ficar de todo branco.
— Já vi o pior desta vida, contudo continuo a acreditar que ainda há muita coisa boa para ser vivída. — Apercebi-me que ele estava a usar um gorro felpudo com rasgões, suas roupas estavam velhas. O odor que emanava dele sugeria que este homem não tinha um lar para onde voltar. Não tinha nada. — Ter subido a cobertura hoje não foi um ato aleatório, havia um propósito. Não irei embora até que estejas a salva.
— Por quê? — Perguntei em meio as lágrimas.
— Alguém um dia já fez o mesmo por mim.
⏳
Quanto comecei a escrever Sob Juramento, não tinha a noção que esta história levaria-me a caminhos que nunca pensei cruzar. Escrever sobre HIV, suícidio e violência doméstica talvez seja algo pesado para um livro só. Contudo, fui adiante.
Queria passar para meus leitores que há vida após o HIV. Que podes sonhar, ter um emprego dos sonhos, ter amigos, um namorado, um crush, filhos, uma família. Que a soropositividade não tem o poder de limitar-te a ser o que quiseres.
A Ilídia é uma das minhas personagens femininas mais fortes que escrevi (Ou tentei). Mas mesmo sendo uma mulher FORTE, ela esteve diante da face da solidão e medo. Acho eu, que toda gente passa por este momento crucial na vida. E é importante que tenhamos pessoas que faça-nos sentir que ainda vale a pena continuar nesta caminhada.
Estava no processo de rascunhar o final do livro quando meu pai faleceu, em novembro de 2018. Perdi o norte. Fiquei dias sem abrir o Word, a tentar imaginar como seria daquele dia em diante a minha vida.
Desde então, meus dias ficaram escuros. Mas, como em 2013 (Período que comecei a escrever) a escrita ajudou-me imenso. Tenho tentado passar todos os sentimentos para as linhas que compõe esta história. Quero que meus personagens deixem algum tipo de lição ou até mesmo uma motivação para continuares a acreditar no amanhã.
Agradeço-vos por continuares a ler minha história até aqui.
Espero que Lili e CIA cativem os vossos corações.
Vemo-nos no sábado.
Um abraço.
Mel sampaio
🌻
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Sob Juramento [PT-PT] Disponível Até 24/05 SEM REVISÃO
ChickLitA taxista Ilídia Marques tinha tudo planeado na sua vida. Estava prestes a se casar com o homem que acreditava ser o amor da sua vida, contudo ela não estava a espera que o destino mudasse o seu caminho justo no dia do seu casamento. No altar, I...