Capítulo 10 ~ Significado do silêncio

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Sexta-feira. Nunca este dia da semana foi tão abençoado. Deixei tudo arrumado para sair. Fiz uma pequena mochila apenas com o essencial para levar a casa. Decidi encher a minha EASTPAK de algumas lembranças e doces para o pessoal de lá. Sabem o que é saudade? Bolas, estou cheia dela. A Cloe e o Bem são as coisas mais perfeitas que Deus me podia ter dado. Gostava de poder falar com eles todos os dias e enchê-los de beijinhos. Infelizmente nem tudo o que queremos é possível.

Agora estou a sair da casa da Leah. É relativamente perto da escola. Estivemos a fazer lá o trabalho de Sociologia para adiantar do fim de semana. Vocês sabem como é... o tempo é pouco por isso temos de aproveitar. Agora tenho de me despachar. Já são 21 e tenho 20 km para fazer em 2 horas. Agora a carta dava um jeito enorme, mas não, infelizmente ainda  não ando nem perto de a ter.

Caminhei pela avenida do costume com o telemóvel na mão. Hoje uns instrumentais de piano ficam mesmo muito bem. Tenho imenso sono. Mas pensar que vou dormir na minha cama já vale a pena. Quando cheguei ao ponto do costume lá vi um vulto sentado no banco de pedra de ontem a mirar a cidade. Às vezes penso em como será o seu rosto. Será que tem cabelo claro ou escuro, curto ou comprido, liso ou encaracolado? E os seus olhos, verdes, castanhos ou azuis?

“De volta?” perguntei e ele não disse uma palavra. Tirei a mala do ombro e pausei-a no chão sentando-me no banco. Ele continuou em silêncio. As suas mãos estavam nas suas pernas ligeiramente afastadas. A brisa passa por nós e posso sentir o seu perfume. Como eu amo aquele perfume. Faz-me lembrar algum modelo ou assim. Ficámos ali uns 30 minutos. Eu não sabia mais o que dizer e ele simplesmente não falava. O silêncio era, de certo, bastante desconfortável. A minha cabeça dizia: “corre daí antes que percas o autocarro” mas o meu coração gritava: “ele pode precisar de ajuda!”. Não sabia mais como reagir por isso segui os meus impulsos e pausei a minha mão em cima da sua. Ele meio que estremeceu e eu ia retirar a mão até que ele sussurra um.

“Deixa estar.”

Pausei a mão de modo que, o meu polegar fizesse festas nas costas da sua mão. Ele está abatido e não percebo porquê.

“Diz-me o que tens por favor.” Disse suavemente. Senti-o suspirar fundo.

“Sabes quando és alguém que as pessoas não veem?” ele diz muito rápido deixando-me confusa.

“Podes explicar?” pedi e ele arfou.

“É como se todos me vissem de uma maneira que eu não sou.” Ele desabafou.

“Como se tivesses a tal máscara?” a minha voz saiu com uma pitada de diversão. Ele meio que riu baixinho.

“Exato.”

“Então, porque não lhes mostras esse teu eu?”

“Porque provavelmente poderia perder muito com isso.”

“Tens medo de quê?” Contestei. “Devemos ter orgulho naquilo que somos. Tens medo de ser rejeitado?”

“Não é bem isso” suspirou “Pronto, talvez seja.”

“Não devias ter.” seguro a sua mão com as minhas duas mãos.

“Há muito em jogo.” Ele avisa.

“A vida é feita de riscos, porque não tentar?” perguntei e ele bufou.

“Talvez tenhas razão.” Ele sussurra.

“Bem, já estou atrasada.” Informei e levantei-me. Assim que me estava de pé senti a sua mão no meu braço que me puxou de novo para baixo.

“Eu levo-te.” Ele informa.

“Não te incomodes, ainda vou para longe.”

“Por isso mesmo.” Ele segura a minha mão. “Eu levo-te onde quiseres.”

“Que horas são?” questionei e ele arregaçou a manga para olhar o relógio.

“22 e 5” respondeu e eu levantei-me de impulso.

“Ó meu Deus.” Peguei nas coisas meio brutamente e ele ria-se.

“Tem calma Julianne.”

“Eu tenho apenas 55 minutos para ir a casa buscar a mochila e fazer uns 15 km para a estação de autocarros.” Retorqui meio agitada. Ele aproximou-se de mim pelas costas e abraçou-me por trás. Posso dizer que nunca me senti tão protegida desde que saí de casa.

“Não estejas nervosa. Não vais perder esse autocarro. Eu não vou deixar.”

“Ok.” Expiro profundamente e ele larga-me bem devagar. Assim que me viro ele já está ao é da mota e tira o capacete secundário para me passar. Pu-lo na minha cabeça e agarrei-me ao seu tronco assim que subi para cima da mota. “Gosto mesmo da tua mota.” Confessei.

“A sério?” ele diz enquanto arranca.

“Sim.”

“Então, porquê não dás uma volta para a semana?” perguntou.

“Porque não tenho carta e tenho medo.” Informei.

“Bem, eu tirei a de carro há um anito e continuo a amar a mota.” Pausa. “Isso do medo passa.”

“Humhum.” Simplesmente respondi.

“Conta-me! Como é a tua casa lá em Crewe? Já vi que gostas daquilo lá.”

“Podes gozar comigo à vontade mas eu amo a minha aldeia.”

“Vives numa aldeia?” pergunta admirado.

“Sim, não é muito retardada mas ainda não é considerado cidade.” Informei de novo orgulhosa.

“E a tua família?”

“Não achas que já sabes demasiado de mim?” ele gargalhou. “Agora segues essa rua.” Indiquei assim que chegamos ao local onde ele me deixou da outra vez.

“Moras sozinha?”

“Não.” Admito. “Vivo com a minha avó materna.”

“Deve ser muito fixe.”

“Sim, mas prefiro a minha casa.” Sussurro.

“É muito diferente desta cidade?”

“Sim, Holmes Chapel é encantador.” Admiti e ele sorriu. “E tu, és daqui?”

“Sim, sou.” Advertiu. “Sou daqui desde que me conheço por gente.”

The Girl behind the Mask ✗Onde histórias criam vida. Descubra agora