CAPÍTULO 48

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AMANDA

A delicadeza da primavera evidencia uma nova vida. Cuidando do jardim naquela manhã, fui contemplada com o nascer do sol e a magia de dar vida às minhas orquídeas. Mamãe me ensinou a cuidar das flores, como seres pequeninos que precisam de carinho. Durante quase vinte anos eu não consegui realizar essa terapia. Deixei que minhas flores morressem e que o mato preenchesse o que outrora foi um lindo jardim. Pois, assim como as flores estavam mortas, eu também estava.

Faz quase três meses que a minha filha retornou para os meus braços. Luna voltou em forma de uma linda mulher, que hoje atendia pelo nome de Raquel. Sua personalidade forte e impaciente, foi sendo deixada de lado e dando lugar a uma menina que precisava de todo o meu amor e carinho. Mesmo assim, ainda sinto que algo falta dentro de mim.

O sentimento de perder a Luna ainda não havia sido preenchido, mesmo com o seu retorno. Amava Raquel da mesma intensidade que amava Helena. E essa confusão do meu coração, deixava a minha mente em combustão.

Ajoelhada no jardim, colocava adubo nas orquídeas amarelas com pintinhas alaranjadas, pareciam ter sido feitas à mão. Em um turbilhão de pensamentos, lembrava com muito carinho do meu cotidiano atual.

De como a cada dia Raquel estava mais humilde e carinhosa. Dos momentos que passávamos juntas, dos gostos de comida iguais e das diferenças na dança. Toda manhã ela me acordava com um café da manhã no quarto. Sexta-feira de noite era o dia da família. Esperávamos o seu pai chegar do trabalho e fazíamos o jantar todos juntos. Depois era o momento dos jogos, tenho certeza que o Henrique sempre a deixava ganhar. Os dois não se estranhavam como antes e vivíamos em uma paz total.

Minha alegria iniciava nas manhãs de caminhada com a Danielle antes dela ir para o trabalho. O meu estúdio de danças sendo reformado e ficando exatamente como era antes. Das tardes que eu ia visitar a Natália e a ajudava com a lição de casa. Daquelas noites que eu a fazia dormir no meu colo. Dos amigos que eu fiz, Dona Maristela e o seu Antônio, sempre acolhedores e gentis e Bianca, a ex-noiva de Rodrigo, que passava por uma situação difícil, parecia ser uma boa pessoa e que amava o filho que logo viria a nascer.

E o meu coração foi preenchido principalmente pela Helena. Minha linda menininha que precisou virar mulher com tão pouca idade. A sua história me fascinava e me deixava ainda mais orgulhosa de tê-la como filha. Ela fazia parte dos nossos momentos de família na minha casa, e por mais que a Raquel tivesse ciúmes exagerado, até mesmo ela começou a aceitá-la na nossa casa.

Henrique estava nos seus melhores dias e a nossa relação tinha voltado a ser como era antes da nossa filha ser levada. Ele era carinhoso e gentil com a Helena e tinha um sentimento muito especial pela Natália. Sempre estava presenteando-a e mimando a pequena filha da Helena que tratávamos como nossa neta. Além do mais, seu filho Guilherme estava, pela primeira vez, em um relacionamento amoroso. Para minha felicidade, era a Karol, amiga de Helena. Uma garota incrível, que não via o autismo como um problema, ela via o Guilherme como o homem da sua vida. Isso deixou Danielle passeando nas nuvens.

Infelizmente, quando tudo parece perfeito, acabamos tropeçando na imperfeição!

Raquel correu pela porta de entrada e se ajoelhou ao meu lado no jardim.

- Mamãe, eu achei. Achei a casa perfeita!

Seus olhos escuros tinha um brilho especial e seu sorriso estava amplo. Ela parecia muito realizada e eu não queria decepcioná-la. Nos últimos dias, ela argumentou comigo e com o Henrique sobre mudarmos daquela casa. Suas justificativas giravam em torno de: "Eu voltei, então não precisamos ficar na casa que algo tão terrível aconteceu". "Tenho pesadelos com o meu antigo quarto". "Quero uma casa maior para trazer meus amigos da faculdade".

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