CAPÍTULO 58

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A NOTA

OBS: Capítulo forte, CUIDADO.

A resposta para o que você procura está cada vez mais perto.

Em outubro de 1993, já no auge da minha missão, tive um sonho revelador: cuidar de uma Canção. Senti que como uma flor precisava ser regada para desabrochar, uma Canção precisava ser criada para se tornar a metade da minha sinfonia.

Como o ar puro da primavera, conheci Analísie enquanto pedia esmolas em um semáforo. Sua idade ela mal recordava, precisava ajudar a sustentar os irmãos e a mãe dependente química, mesmo sendo ainda tão nova.

Pensei bem se ela seria uma Canção, analisei seu comportamento, não poderia manchar a minha melodia com alguém que já havia conhecido os malefícios do mundo. Mas Analísie vivia a par da própria realidade, seu sorriso transmitia uma paz divina e a sua voz eram como lírios em um campo bem cuidado.

A levei até sua casa no dia que eu descobri que ela era a escolhida. Sua mãe aceitou que ela fosse criada por mim em troca de coisas mundanas e assim foi feito.

**

Os dias passaram tão rapidamente, que logo se transformaram em meses e em um piscar de olhos a minha Canção já estava formada.

Sentia-me um pai, maravilhado com a sua criação. Analísie acordava com a melodia escapando por suas cordas vocálicas e fluindo pelos cômodos da casa recém comprada. Sua leveza e suavidade em entoar notas firmes e afinadas, fazia o meu mundo ser completo.

Alguns curiosos viam o amor que nutríamos um pelo outro, como pai e filha. Um sentimento que nunca senti, que talvez nunca mais sentiria. Ela era a minha canção de número quarenta, a metade da minha sinfonia estava pronta para ser alcançada.

Analísie era natural em sua pureza, como um anjo pronto para fazer o mundo um lugar melhor. Suas pequenas mãos tocaram as minhas, quando juntos caminhamos até o local seguro. Ela amava correr pelo jardim daquela cabana, brincava descalça na terra molhada após respingos de chuva que ultrapassavam as árvores densas.

Naquele dia, ela se deitou no jardim das Canções. Em fase de alfabetização, começou a contar cada pequena cruz forjada por minhas mãos e perguntou o significado de haver 39 delas.

Eu respondi com orgulho e amor, que aqueles eram anjos que me proporcionaram minutos de suas melodias, e que agora podiam descansar do mal que o mundo as fez. Analísie brilhou os olhos escuros na minha direção e perguntou se a cruz que eu havia acabado de forjar, era para ela ser um anjo.

"Minha pura criança, minha doce Canção, apenas você e aquela que será a última Canção viveram no meu coração. Hoje você se tornará o mais incrível anjo que eu fiz"

Inesquecível foi o momento que Analísie repousou nos meus braços, já dormindo o sono eterno, após beber o leite com o remédio necessário.

A minha missão estava apenas na metade, mas depois desse dia, comecei a sentir falta da menina. Ela alegrava os meus dias e não a ter mais diariamente, começou a doer na minha alma.

Os conhecidos perguntaram o paradeiro da minha filha, respondi que foi morar com a mãe. Mesmo o mundo me proporcionando alguns prazeres, precisei anestesiar o meu corpo por um momento.

Envolto a um mundo de pecados, foi necessária uma quantidade maçante de bebida para o ato.

Fiz o bilhete característico do meu trabalho, para conforto das famílias que tinham perdido as suas Canções. Com muito zelo, guardei no bolso de um casaco surrado e peguei um táxi até a Delegacia mais perto.

Respirei fundo quando adentrei aquele local onde o mau era característico. Após dizer ao que vim, fui encaminhado até um Delegado de Polícia para contar o que eu sabia.

- Senhor, sente-se - Dizia o Delegado e apontava uma cadeira de aço.

Sentei-me confortável, embebeci a voz arrastada quando precisei relatar o que aconteceu. Com muita discrição, transmiti a mensagem que gravei sem arestas. Dizia que achei o bilhete na rua, e como vi alguns noticiários, sabia que era da Nota.

- Ele atuou novamente - Disse o Delegado um pouco pálido. - Sendo assim, já existem 40 vítimas da Nota.

O homem gélido dizia para si mesmo.

- Agradeço ao senhor...? - O delegado perguntava o meu nome. Muito embriagado, mas ainda ciente da minha missão, balbuciei algumas letras em vão.

- Eu sou o Delegado Figueiredo, se souber de algo mais é só me procurar.

Ele apertou a minha mão e logo sumiu dentro da delegacia. Saí cambaleando e tendo a absoluta certeza de que os pecadores nunca poderiam entender a magnitude da minha missão.

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GENTEEEE DO CÉÉEÉUUU

O que foi esse capítulo?

Eu sei que vocês gostam dos capítulos da Nota, mas alguém ai esperava que ele já conheceu o Figueiredo?

Os próximos capítulos logo sairão, enquanto isso votem, comentem, indiquem a Canção a algum amigo.

Muito obrigada pelo carinho.

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