CAPÍTULO 17

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DANIELLE

Estava colocando as malas no carro, quando Guilherme chegou. Eu e o Henrique precisávamos ir para Brasília participar de uma audiência e ficaríamos por lá cerca de uma semana ou mais. Tinha dado a idéia de levar a Amanda, pois nessa semana ela tentou suicídio. Assim, duas enfermeiras iriam para ajudar.

O dia estava muito quente e eu tinha apenas meia hora até o Paulo me levar no aeroporto.

- Bom dia, filho.

Eu o cumprimentei e tive apenas um aceno de cabeça de volta. Ele não gostava de cumprimentos.

- Não preciso de babá.

Ele parecia muito chateado. Coloquei a minha bolsa no carro e o levei até a varanda, onde tinha sombra. Sentamos em um sofá de exterior.

- Eu sei que não precisa. O Paulo estará aqui em casa se você precisar. Se você entrar em crise...

Ele me interrompeu: - Não vou ter crise, não vou ter. Eu sou adulto.

Estava orgulhosa do meu filho. Quando o neurologista o diagnosticou com autismo, pouco se sabia sobre o assunto, mas também foi um alívio ter alguma luz sobre todos os problemas que ele teve durante toda a infância, parecia que ele nunca teria uma vida normal, mas agora, com 24 anos, ele mora sozinho e trabalha.

Na casa do lado, ouvimos o barulho de furadeira. Me preparei para apertar os seus ouvidos, pois o barulho o incomodava muito. Mas ele foi mais rápido e colocou um protetor de ouvidos. Pouco tempo o barulho passou, eu o olhava com muita admiração.

- Se precisar, eu procuro o Paulo. Gosto dele, gosto dele sim. Mas não vou precisar.

Concordei com ele. Apertei os ombros dele em uma vã tentativa de abraço, mas ele não gostava de muito contato físico.

- Bom dia, queridos - Henrique disse dando um aperto de mão com o filho e beijando a minha testa.

_ Bom dia, Henrique, já estou pronta. Cadê a Amanda?

Ele fez um gesto em direção ao seu carro, vi duas enfermeiras entrando no banco de trás. Em pouco tempo, Henrique se despediu do filho e entramos nos carros. Paulo deixou Guilherme na portaria do prédio que ele mora. Ficava a duas quadras do nosso condomínio, mas Guilherme não dirigia. Pegava uber ou ia a pé nos lugares que precisava.

Chegamos na hora certa no aeroporto. Dei um beijo calmo em Paulo, o amava muito.

- Eu te amo, Dani.

Sorri e o beijei mais um pouco. Estávamos acostumados com viagens, ele era médico da marinha e sempre viajava. Mas agora ficaria duas semanas em casa e viajaria por uma semana. Eu sempre sentia muitas saudades, ele é o meu verdadeiro amor.

- Eu amo você meu amor, cuida bem do meu menino azul.

Ele concordou e me abraçou forte, o seu perfume amadeirado grudou na minha roupa.

- Vamos?

Henrique que estava ao nosso lado, assentiu. Amanda estava de óculos escuros, olhando para o vazio com as duas enfermeiras ao seu lado.

Chegamos no aeroporto de Brasília na hora do almoço.

Almoçamos no hotel e subimos para o quarto. Alugamos três quartos no mesmo andar, sendo que um seria para as enfermeiras dividirem.

Duas da tarde começamos a trabalhar, nos encontramos com os nossos clientes.

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Terminando a semana, eu estava jantando sozinha, pois Henrique saiu para beber com o cliente, ganhamos a causa. Como eu estava com dor de cabeça, decidi voltar para o hotel. Conversei muito com o Paulo, dizendo que no dia seguinte eu já estaria de volta, teríamos uma semana para aproveitar antes da sua viagem. Ele garantiu que Guilherme estava muito bem e trabalhando nos quadros para a exposição daqui a
alguns dias.

Estava perdida em pensamentos quando ela sentou na minha frente. Ela estava muito magra, com os olhos castanhos apertados de tanta olheira, seu cabelo estava sem vida. Eu ficava tão triste em vê-la assim, Amanda era a pessoa mais feliz que conheci na vida.

- Vamos jantar, Amanda?

Ela concordou com um aceno. Fiquei animada e chamei o garçom. Ela pediu meia porção de macarrão ao sugo e bebeu um suco de uva.

Todo o jantar ela permaneceu calada, só concordava com um aceno e logo se concentrava no seu prato. Ela comeu pouco, mas ainda era uma esperança. Procurei conversar sobre coisas do dia a dia e do trabalho.

No fim do jantar ela falou, e o que ela disse, me chocou:

- Acho que foi uma punição de Deus por eu ter acabado com o seu casamento.

Eu bebi uma taça de vinho mais rápido do que podia, foi muito difícil me concentrar e responder. Mas ela foi mais rápida e continuou...

- Eu sabia que ele era casado, e mesmo assim deixei me apaixonar. Eu juro que não tivemos nenhuma relação até sair o divórcio. Mas eu errei, e a minha bebêzinha pagou pelo meu erro.

Os olhos dela estavam secos, parecia não haver mais lágrimas para serem derramadas, ainda assim a sua voz era triste e cortava o meu coração. Eu segurei as mãos dela firmemente e ela me olhou surpresa.

- Eu e Henrique sempre fomos mais amigos do que marido e mulher. Quando ele disse que havia se apaixonado, eu entendi que estava na hora de sermos felizes. Eu já amava o Paulo, e aquilo me sufocava. Concordamos com o divórcio. Deus é testemunha do quanto eu amei ele ter te conhecido. Sempre quis a felicidade de vocês, e o que aconteceu com a Luna, foi a pior coisa da minha vida também.

Eu segurei o choro, mas vacilei, pois algumas lágrimas escorreram pela minha face.

- Amanda, viva. Por favor. Volte a vida. Nós te amamos muito.

Eu já não podia mais segurar, chorei compulsivamente e vários clientes do hotel me olharam.

- Eu viverei quando achar o corpo da minha filha.

Ela estava abalada e teve que ser levada para o quarto. Ali eu tive certeza, ajudaria Henrique e o detetive com aquela mentira. Ela precisava viver novamente, e só faria isso com a filha nos braços.

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