Aprecie o gosto da morte

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Eu até poderia viver sem ela, mas não quero. Eu também sei ser fria, ignorante, chata, indiferente.
Mas não é assim que gosto de ser.
Sabe o que eu gosto mesmo? Eu gosto de ser dela, gosto de ser da gente.
Gosto do jeito de falar que me deixa toda desconcertada,
da forma que a ajeita o cabelo e ele fica sempre perfeito, gosto dos sorrisos tímidos e dos olhares desconfiados.
Eu quero ela, eu quero nós.
Para todo o sempre!

POV Caroline Biazin:

Uma manhã meio fria. Lá estava eu mais uma vez com meu jeans rasgado e meu moletom cinza desbotado, caminhando pelas ruas, sem rumo, sem destino, a procura de algo que eu mesma não sabia o que era. Olhava ao meu redor a procura de respostas, mas nada encontrava. Me sentei em um banco sujo em uma praça, olhei em minha volta, eu estava sozinha. Peguei meu celular, abri a galeria de fotos e olhei cada fotografia nossa...

- Volta logo para casa! - disse depositando um carinho a mais na foto que estava no celular....

Tudo isso podia até ser engraçado se não fosse tão metódico e ao mesmo tempo instigante, pois em minhas fotos eu sorria, fazia caras e bocas, estava por ela, eu estava ao redor de todo o sentimento que nos unia no milésimo do mundo. Eu tinha algo em meu olhar, Ele refletia o meu interior, meu interior que brilhava pela aproximação dela.

Olhei novamente ao meu redor e percebi que ainda estava sozinha, literalmente sozinha. Deixei as lágrimas que insistiam em cair escorrerem pelo meu rosto, mas sempre em alerta para que ninguém me visse chorar e viessem me perguntar - por que chora?. - está tudo bem?- Até porque eu não saberia responder essas perguntas, não com sinceridade. Ouvi um barulho e rapidamente sequei minhas lágrimas com meu moletom, olhei para frente e avistei do outro lado da praça uma mulher de idade e morena, que me lembrava muito Dayane, só que anos mais velha... ela vestia um vestido de cor amarela, um casaco preto combinando com seus sapatinhos pretos . Me recordando bem, Ela era a mesma mulher que distribui flores no parque todos os dias... Como quase poderia me esquecer dela?

Ela veio se aproximando de mim, confesso que fiquei receosa. — Posso me sentar ao seu lado? — ela perguntou sorrindo, respondi que sim. Então ela se sentou ao meu lado, tirou do seu cesto uma flor vermelha. Olhei para ela e me senti envergonhada por ter sentido medo dela, de uma simples mulher que apenas procurava um lugar tranquilo e pessoas tranquila para que ela pudesse distribuir flores. Fiquei por alguns longos minutos ali, olhando para ela. Era estranho, pois mesmo ela não falando comigo, nem ao menos me olhando, eu me sentia bem ali, ao lado daquela mulher. Pensei em sair dali e deixa-la pensar em paz, mas algo dentro de mim dizia que eu não precisava sair dali, que eu não estava a incomodando. Continuei ali, sentada, olhando para o céu, para as pessoas que esperavam o ônibus do outro lado da pista e ela ao meu lado observando também as vidas que se passavam por nós.

Eu Pensei por uns segundo que sei lá, talvez essa mulher ao meu lado poderia olhar para mim e dizer um oi, ou apenas olhar pra mim, não sei, mas notar a minha presença ali. Até que ela sorriu e me olhou. Levei um susto.
- Será que ela lê mentes? - coloquei minha mão na testa e abaixei minha cabeça envergonhada - Pare de pensar nisso! Ela pode estar lendo sua mente agora! — olhei para ela e retribui o sorriso dela com um sorriso sem graça. Ela deixou as flores que estava separando de lado em seu cesto para marcar aonde parou sua separação, olhou para mim e perguntou se estava tudo bem. Respondi que sim, fiquei olhando esperando a próxima pergunta, mas ela não me perguntou nada, apenas me olhava e sorria. Eu poderia ficar com medo, sair dali correndo, mas não. Era estranho porque eu não tive medo, eu não queria ir embora, apenas queria ficar ali com ela, mesmo que fosse em silêncio. Foi então que eu percebi que dentro de mim estava surgindo um sentimento diferente, cada minuto ali ao lado daquela mulher, ela fazia com que algo dentro de mim mudasse. Ela então se levantou, olhou para mim, ainda sorrindo, me deu tchau e saiu. Percebi que ele havia esquecido sobre o banco um papel, a gritei, mas ela não me ouvia, já estava longe. Peguei o papel, desdobrei, aquilo era uma espécie de carta.

Desdobrei e comecei a ler. A carta dizia

" A história dessa rosa é bem interessante, caso você queria saber... Se você realmente se interessar, leia as linhas abaixo minha querida. - Suspirei lendo o bilhete em minhas mãos. - Essa história é um pouco diferente, mas ainda sim é uma das mais interessantes... é sobre a vida e a morte:
Dizem que em uma madrugada, a Vida resolveu dar um passeio, ela foi até a praia, sentou-se na areia e ficou admirando as estrelas. E bem naquela noite a Morte também resolveu passear, e foi na mesma praia em que a Vida estava. A Morte chegou e logo foi brincar no mar, mas ao olhar para a praia viu a Vida admirando, parecia estar chorando, a Morte então saiu do mar e sentou-se ao lado da Vida, limpou as lágrimas dela e perguntou
"Por que choras?", a Vida apenas olhava para a areia, até que a Morte lhe abraçou e sussurrou em seu ouvido
"Pode confiar...", a Vida meio tímida falou baixinho:
- Tenho medo...
- Medo de que? - Perguntou a Morte.
- De você... A Morte ficou surpresa, e pediu que a Vida lhe dissesse o motivo, ela então completou
"Você é tão livre, mas leva a felicidade com você, deixa as pessoas tristes e sempre me faz chorar." Ao olhar para ela a Vida viu uma lágrima escorrer e ouviu a Morte falar
"eu invejo você, você vive na luz e no amor, você pode sorrir, pode amar, eu vivo na escuridão e você é a unica que pode me ver, o resto apenas me sente, sinto falta de amor, gostaria de conhecê-lo..." A Vida abraçou a Morte e pediu desculpas, disse ainda para se encontrarem toda a noite nesse mesmo lugar. A Morte com um sorriso no rosto concordou.  E então o dia amanheceu, e a magia se perdeu, mas voltará durante a noite. Pois a noite é daqueles que amam, é dos poetas e pensadores, é dos encontros da Vida e da Morte...

Obs: Cuide-se bem que quem você ama, pois as vezes a vida pode querer presentear a morte com essa pessoa! - terminei de ler e senti meu estômago se revirar no mesmo segundo... Eu so conseguia pensar no medo da perda de Dayane.. Só conseguia pensar no medo de perder a mãe do meu filho!

A chegada do OutonoOnde histórias criam vida. Descubra agora