6. Apartamento

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Terminei a conversa com Ally no telefone com ela dizendo que minha família iria surtar com o apartamento, dei risada sabendo que era verdade, mas mesmo assim pedi para que ela entrasse em contato com o proprietário, para deixar um contrato de um ano pronto. Assim que eu chegasse em Paris daria uma olhada no apartamento e se realmente fosse igual às fotos, fecharia negócio.

Desci com o notebook para encontrar meus avós, eles estavam sentados na varanda observando Sofia brincar.

  — Encontrei meu lugar. – Disse animada me sentando ao lado da minha avó. Os dois me olharam sem entender, mas logo focaram nas imagens no notebook. 

Meu avô arrumou os óculos e coçou a cabeça. — Parece do tempo em que eu era jovem. – Ele disse, fazendo minha vó concordar e rir com ele.

Fiz uma careta enquanto os dois riam, não me parecia tão antigo assim.

— Vovó, você me disse que eu precisava de um lar, com privacidade e aconchego. – Respondi dando de ombros.

— Mas você esqueceu a parte do conforto e espaço, minha neta. – Minha vó disse colocando a mão sobre a testa, de forma cômica. 
— Ele me parece confortável vovó, e sobre o espaço, eu não preciso de muito, é temporário.

— Quero ver ela falar que está confortável quando precisar usar aquele aquecedor antigo. – Meu avô disse.
— Ué? Aquecedor é só ligar na tomada, eu sei como funciona. – Respondi como se fosse óbvio, mas os dois começaram a rir novamente e fiquei sem entender nada.

— Vamos deixar Camila fazer suas escolhas, John. – Minha vó disse me encorajando.
— Claro, querida, vamos sim. – Meu avô respondeu enxugando uma lágrima por conta de seu riso, então continuou. — Aposto em duas semanas nesse tal apartamento, caso faça muito frio.
— Eu aposto em um mês! – Minha vó rebateu, estendendo a mão para fechar a aposta.

Os dois estavam mesmo se divertindo as minhas custas.

(...)

Depois das piadinhas infames no jantar, sobre meu apartamento pitoresco, cada um buscou algo para se entreter, mais tarde minha mãe e meus avós subiram para se deitar, prometi colocar Sofia para dormir. Já se passava das dez, e meu pai ainda não havia chegado, subi com Sofia para o quarto para lhe contar uma história. Toda alegre ela se ajeitou nas cobertas, esperando eu continuar a história que estávamos lendo essa semana.

Gostava de ler histórias para Sofi, em ver seus olhos buscando o final de cada frase, e o desenrolar de suas ideias. Principalmente com protagonistas de mulheres fortes, o livro dessa semana era a história de Mulan.

— Então o imperador da China disse. Já ouvi muito a seu respeito Fa Mulan. Roubou a armadura de seu pai, fugiu de casa. Fingiu ser um soldado. Enganou seu oficial comandante, desonrou nosso exército, destruiu meu palácio e...  – Os olhos de Sofia estavam atentos a cada palavra e suas mãozinhas seguravam a coberta com força. — Salvou a vida de todos.  

— Isso! Ela é demais Kaki!
— Sim, ela é, e você também.
— Será que vou poder lutar uma batalha, quando for mais velha? – Ela me perguntou com expectativa, me fazendo sorrir.
— Todos nós lutamos batalhas, diariamente, mesmo que pequenas. – Deixei um beijo em sua testa, e a cobri até o pescoço, deixando ela toda enroladinha. — Dorme bem, meu amor. Kaki ama você.
— Também te amo, Kaki.

Desliguei a luz do quarto, deixando apenas seu abajur de estrelas iluminando o cômodo, encostada na porta fiquei observando minha pequena irmã, embolada na coberta com seus ursos de pelúcia, eu definitivamente sentiria muita saudade dela.  

A casa estava silenciosa, desci até a biblioteca e me sentei na poltrona abrindo meu notebook, comecei ler o relatório que Ally havia me enviado, e baixar alguns documentos que solicitei sobre a filial. Escutei passos pesados e barulho de chaves sendo jogadas, quando meu pai apareceu na soleira da porta.

— Ainda acordada, filha? – Ele disse devagar.
— Ainda trabalhando, pai? – Devolvi a pergunta, arqueando uma sobrancelha. 

Ele caminhou até o sofá ao meu lado e sentou-se esparramado, sua gravata estava frouxa e as mangas de sua camisa dobradas até o cotovelo.
— Pois é, precisei ficar até mais tarde resolvendo uns problemas, sabe como são as coisas. – Seu hálito cheirava álcool e seus olhos estavam levemente avermelhados.
— Sei sim, estou trabalhando também,  Ally conseguiu alguns documentos que solicitei sobre a empresa de Paris.
— Mas já? Assim tão rápida.
— Não gosto de adiar as coisas. Já estão todos sabendo mesmo, melhor começar logo. – Ele assentiu levemente.

— Desculpe não ter vindo para o jantar.
— Aposto que pensou em evitar o vovô, até ele se acalmar.
— Você é tão esperta. – Ele riu abrindo um sorriso torto. — Por isso escolhi você. Vários nomes estavam na mesa, o mais cotado era o Walter Carter, mas eu decidi por você.  
— Mas pai, Walter é um dos melhores! Ele é o cara na consultoria empresarial.
— É, ele é bom, mas não é você. – Ele se levantou, e abaixou para deixar um beijo no topo da minha cabeça. — Boa noite filha.

— Pai. Antes de se deitar, por favor tome um belo banho, tem um perfume doce grudado em sua pele. – Disse a ele, que me olhou sem graça, engolindo devagar a saliva. E assim subiu as escadas com passos lentos, me deixando sozinha com meus pensamentos e trabalho. 

Libélula. A herdeira Rockefeller - CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora