Houve um dia no meio de todo aquele amontoado de papéis que Joaquim revia que sua mente viajou longe, indo parar em uma realidade onde ele estava com seu bebê e sua mãe e vivia feliz entre as fraldas e as papinhas, soltou um longo suspiro e voltou a olhar todos os exames feitos para a realização da FIV e quando jogou o último envelope em cima do monte se perguntou o que deveria experimentar antes de finalmente ter o seu filho e sua responsabilidade, isso era estranho, teve que admitir, como se ele fosse gerar aquele bebê, e se sentia exatamente igual a como uma mulher devia se sentir ao descobrir-se grávida, com muito medo do que viria pela frente.
- Rafael, eu preciso de ajuda. - Joaquim em muito assuntos ligava para o amigo na expectativa de que pudesse ser ajudado, porém dessa vez não era bem assim.
- Sobre?
- Filhos...
- Hã, cara, eu não os tenho.
- Mas não pode me ajudar?
- Lamento, nunca troquei uma fralda.
- Ok. – ele desligou ficando preocupado. Quem o ajudaria agora?
Joaquim pensou em Jane, mas alguma coisa o impediu de prosseguir. Era início do crepúsculo, ele poderia ver sua mãe. Ninguém melhor do que aquela que trocou a sua fralda. Pegando o ônibus que tinha costume parou em frente da casa da sua infância, onde, muito provavelmente seu filho correria livre, ou filha, como gostava de imaginar, Joaquim queria que fosse uma menina... Antonella? Violeta? Amélia? Tantos nomes para escolher...
- Mãe, preciso falar sobre meu filho, ou melhor, o meu desejo de ter um filho, agora.
Tereza foi pega de surpresa e seus olhos focaram em um ponto atrás do filho quando abriu a porta.
- Entre. – ela deu espaço para que ele passasse e se cumprimentaram com um beijo na testa.
Refugiaram-se na varanda tomando um pouco de chá enquanto o assunto maternidade ia tomando forma, ao longo de meses intermináveis de barriga enorme e entranhas contraídas.
- Eu não sei como vai ser, é estranho, eu decidi e de repente terei um bebê. E me sinto tão por fora... como se eu não tivesse participação ativa.
- É assim que os homens veem?
- Eu acho. – ele deu de ombros. – Nunca tive contato com um para saber.
- No seu caso você não vai ter contato físico com a mãe, é uma coisa mais pensada, e mesmo assim te digo que será surpreendente. Filhos são surpresas, mesmo no planejamento, a coisa toda é sempre estranha.
- Você se arrependeu?
- Não, mas maternidade não é uma coisa "nata", ela é uma escolha, o que nos vem de fábrica é a capacidade de reproduzir. E isso é bem diferente. Assim é a paternidade, exercida mais como uma capacidade de reproduzir. Ouvi uma vez que a paternidade só existe porque a maternidade veio primeiro. Não sei se concordo.
- Papai reproduziu, não é?
- Seu pai. - Tereza suspirou. - Era escravo de muita coisa, inclusive a ideia de mulher ser igual a uma máquina de criar vida e cuidar delas. Não foi ruim para você, mas para mim... Ele sempre quis muitos filhos e eu não pude dar a ele a opção.
Tereza segurou a mão do filho em sinal de permissão, o que ela iria dizer poderia magoá-lo. Joaquim sorriu a mãe e apertou sua mão de volta.
- Bem... Eu percebi que Joaquim era um cara que não seria um bom marido quando resolvi morar com ele. Tinha pouco mais de um mês quando descobri a gravidez... Recebia um cheque para providenciar tudo ao meu filho, mas nunca uma flor, um elogio, um beijo de afeto do meu marido. Casamos por causa das famílias, e quando você nasceu eu tive uma sobrecarga tão grande que em três meses após seu nascimento eu tomava meia dúzia de remédios para dormir. Sua avó, paterna e minha mãe se revezaram para manter você vivo e bem, eu já não conseguia te amamentar sem cair no choro e sentir medo. Eu não queria ter assumido aquele compromisso sozinha, eu queria que seu pai fosse presente comigo como era com você, eu precisava de afeto também.
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AMÉLIA (A garota e a flor)
RomanceAmélia é uma jovem comum que compartilha com sua mãe e avó um destino um pouco infeliz a cerca da presença paterna em sua vida, porém, numa noite que nada prometia; um olhar juntamente com um sorriso hipnótico, uma confusão e uma ida a delegacia pod...