Capítulo 28

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— Lúcia: Que invasão é essa na minha casa? — Perguntou da sala, enquanto tirava os sapatos
— PH: Que isso, tia! Dá nem boa noite! — Disse da cozinha, de boca cheia
— Canela Seca: E já chega esculachando nóis?!? — Disse também de boca cheia
— Lúcia: Esculacho vai ser quando eu meter a mão na boca de vocês, pra vocês num falar de boca cheia! — Disse bolada, indo pro quarto
— Fusca: Dois otário! — Disse rindo
— Roberta: Quem quiser que mexa com minha mãe, mas aguente a resposta!
Quando saímos lá de casa eram 20h30. O toque de recolher foi às 20hrs, mas para soldado não tem isso. Não tinha um morador na rua, embora alguns estivessem nas janelas de suas casas. A gente colou no topo da ladeira da 12, e no final da ladeira tem uma barricada de concreto impossibilitando a passagem de carros; só passava moto ou então à pé. O Tito e o TW estavam lá quando chegamos, mas até a hora do confronto, chegou mais uns 12 moleques que são fechados aqui. 22h30, nóis começou a ouvir os primeiros tiros vindos lá de baixo. Alguns moleques debruçaram-se no chão enquanto outros se ajoelharam atrás de um carro que foi empurrado para perto do topo da ladeira. Eu tava no time dos que estavam ajoelhados no chão.
— Roberta: Caralho, viado! Que parada neurótica! Tô cansadona! — Disse quando os tiros deram uma trégua
— Canela Seca: Isso aqui num é novela, não, fia!
— Roberta: Eu disse que era novela?!? É bem diferente tu ficar dentro de casa jogada no chão só escutando os tiros do que tu estar no meio dos tiros!
— Fusca: Vai peidar* já no primeiro round? — Perguntou debochando
— Roberta: Índiazinha peidando confronto?!? Tu não me conhece mermo!
Essa foi a única conversa paralela que eu tive durante todo o confronto, porque até a faixa das 1h da manhã — hora que a gente teve certeza que os adelaides peidaram —, não só eu, mas todos os moleques só abríamos a boca para gritar para os alemão botar a cara, porque eles ficavam se escondendo entre as vielas, atrás dos carros, atrás das barricadas...! A gente também ria muito quando se ligava que algum deles se fudeu. O Geré avisou por radinho que era pra geral que é fechado na 10, na 11, na 12, na 13, na 14 e na 15 irem rondar pelo morro atrás de mais adelaide, e eu sou da 12, então eu também fui. 2h30, os moleques me deixaram em casa.
— Lúcia: ONDE QUE VOCÊ TAVA, FILHA D'UM ARROMBADO?!? — Gritou quando me viu entrar me casa, após levantar do sofá

A cara dela tava vermelha; creio que de tanto chorar. Existe "filha d'uma puta", né? Minha mãe, quando vai me xingar, me chama de "filha d'um arrombado". Ela já me xingou disso na frente do meu pai, e ele, desde então, passou a me chamar de "filha duma vagabunda".
— Roberta: Tava no confronto, mãe.
— Lúcia: NO CONFRONTO, ROBERTA?!? TEM NECESSIDADE?!?
— Roberta: Ih, mãe, a senhora tá ligada que eu sempre curti essas ideia aí de meter bala nos alemão! Vai ficar grilada agora?!?
O único momento que eu chamo minha mãe de "senhora" é quando a gente tá discutindo. Pra aliviar os tapas, sabe? Ela ficou olhando pra mim por uns 2min, calada.
— Lúcia: Pra que tu tá com esse fúzil, essa mochila e esse radinho? — Perguntou após suspirar fundo e passar a mão no cabelo
— Roberta: Agora eu soldado.
— Lúcia: Soldado tu vai ser quando eu enfiar esse fúzil na tua cara! Tu tá de onda com a minha cara, só pode! Tu saiu de casa com aqueles moleques, não avisou pra onde ia, e ainda chega em casa falando uma parada dessa?! Quer que sua mãe morra antes da hora?!?
— Roberta: Se a senhora morreu, é porque tava na hora.
— Lúcia: Você não vai ser soldado, não! Eu não quero receber a notícia que você tá estirada no chão! Já não basta viver com a ideia que qualquer hora tu pode morrer porque pisou na bola com alguém, ou morreu de bala perdida, ou de qualquer caralho a quatro! — Disse enquanto segurava nos meus cabelos com uma mão e dava tapas na minha cabeça com a mão livre — Quando tu acordar, tu vai devolver essas coisas! Tu quer que eu perca tua guarda?!? Rala pro teu quarto!
Não falei nada e obedeci. Ela é minha mãe; eu vou falar e fazer o quê?
— Lúcia: Já não basta viver metida no crime, quer ser do crime — Escutei ela falar enquanto eu ia pro quarto
Tomei banho, me troquei e deitei na cama. Eu tinha colocado o 762, a mochila e o radinho no chão, e fiquei olhando-os. Caralho, nada pior que ficar entre a razão e o coração. Desde pequena, eu quero ser soldado do morro e eu não quero sair logo agora, mesmo sabendo que isso aí é mó ideia errada, mas se meu pai souber que eu entrei pra boca, ou se ele só souber que eu tava no meio desse confronto, ele pode pedir minha guarda absoluta na justiça. Eu não tava com um pingo de sono, então eu fiquei no celular. Também não tava com nenhum pouco de paciência, mas tava morrendo de curiosidade pra ler as mensagens, então desliguei o wifi e os dados móveis e fui ler e responder as mensagens. Antes de ir dormir, às 4h30, liguei o wifi e as mensagens foram enviadas.

✧✧✧✧✧ NO OUTRO DIA ✧✧✧✧✧
Acordei às 12h45 com meu celular tocando. Era minha mãe. Tinham outras 4 chamadas perdidas dela.
XXX Início de ligação XXX
— Roberta: A... — Ela me interrompeu; não pude nem falar o "alô" completo
— Lúcia: Tu já resolveu teu problema?
— Roberta: Eu acabei de acordar, mãe.
— Lúcia: Eu vou ligar daqui a duas horas.
XXX Fim de ligação XXX
Ela desligou na minha cara. Pior forma de acordar. Levantei da cama, escovei os dentes e fui almoçar; só depois que tomei banho. Me troquei, penteei o cabelo, prendi-o em um coque e saí de casa só com o radinho; no 762 e na mochila nem toquei. Fui pra central e encontrei o Geré e o FB na entrada da viela do meu destino. Como sempre, ele tava rodeado dos seus seguranças, inclusive o Neguinho, o TT e o Marinho. Ainda morro de nojo da cara dele, mas cumprimentei-o assim como cumprimentei todos os outros seguranças.
— Geré: Que cara é essa, Índiazinha?
Eu tava com a cara feia por causa do Marinho, mas eu não falo pra ninguém das minhas fodas com nenhum moleque. Só pra Lays, HAHAHA!
— Roberta: Vai dar mó caô se eu continuar com essas parada.
— Geré: Como assim?
— Roberta: Se meu pai souber, ele pode pedir minha guarda absoluta e eu não vou mais colar aqui no morro.
— Geré: E como é que ele vai saber?
— Roberta: Pela minha mãe. Minha mãe conta tudo pra ele pra jogar a culpa nele, aí ele joga a culpa dela de volta e eles ficam assim — Disse após suspirar fundo
— FB: Que situação, ein.
— Roberta: Pois é — Disse sentando no colo do Geré
— Neguinho: E tu vai fazer o quê? — Perguntou me olhando feio pra caralho
Ele tava me olhando feio por eu estar sentada no colo do Geré? Só rindo mesmo!

— Roberta: Não sei — Respondi dando de ombros, rindo — Eu sempre quis ser soldado, mas eu não quero ser obrigada a ir morar com meu pai definitivamente.
— Marinho: Faz oque teu coração mandar, pô.
— Roberta: Fazer oque o coração manda não dá certo — Disse olhando-o com cara de "não vai dar certo se eu explanar você"
Moleque é tão lento que nem se ligou. 14h30, meu celular tocou e era a Lays mandando eu colar no campinho urgente e o FB tava indo pra sua boca que passa pelo campinho, então ele me deu uma carona. Cheguei lá no campinho e sentei na arquibancada. A Lays tava descendo a escadaria do outro lado ainda. Mó lerda.
— Lays: Tu não vai acreditar! — Disse enquanto subia até a mim — O Cobra quer me botar de fiel!
— Roberta: Quê?!? Conta tudo! — Disse de queixo caído, literalmente
— Lays: Sério, amiga! Sábado, depois do baile, a gente foi pro Jacarezinho, né — Interrompi ela
— Roberta: É. Me deu um balão.
— Lays: Cala boca, deixa eu contar — Disse rindo — Chegando lá, a gente foi pra casa dele, aí a gente fudeu pra caralho, mas não foi aquela foda de fuder, tá ligada? Ele foi todo carinhoso comigo, eu fiquei até assustada no começo porque ele nunca foi daquele jeito comigo. Ele ficava passando a mão no meu cabelo, beijando meu rosto, beijando meu pescoço... Ai, amiga, eu não sei oque eu faço dessa minha vida, me ajuda!
— Roberta: Nem eu sei oque eu tô fazendo da minha e tu vem me pedir ajuda?!? Quer me fuder, me beija, Lays! — A gente riu — Minha mãe tá boladona comigo com a fita de eu ser soldado.
— Lays: Tô ligada — Disse me olhando com cara de "sei"
— Roberta: É serio! Mas ela tá assim só por causa do meu pai, tenho certeza. Ele pode pedir a guarda absoluta se ele souber.
— Lays: Eu faço questão de contar — Disse seca
— Roberta: Não se antes eu arrancar sua língua.
Nisso, meu celular tocou. Era minha mãe.

Índiazinha do Alemão - Pré História ✧ Donde viven las historias. Descúbrelo ahora