Capítulo V

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Após termos conversado e esclarecido sobre a nova relação, seguimos para a festa, enquanto eu fingia que estava tudo bem, mesmo que fosse tudo muito constrangedor. Não conseguia processar o fato de que os meus melhores amigos estivessem namorando. Eu os conhecia há tanto tempo e nunca havia imaginado que ficariam juntos algum dia. Já tinha imaginado Diego e eu juntos, mas jamais Diego e Nanda. Era bizarro! Além disso, eles haviam mentido para mim e eu me sentia traída, pois confiava tanto neles, que, além da Dona Regina e do Padre Constantino, eram as únicas pessoas que sabiam da minha peculiaridade.

Mentira, eles não sabem, mas tenho intenção de contá-los algum dia.

Próximo à casa de Artur, vejo algumas pessoas conversando do lado de fora, enquanto bebem cervejas e flertam umas com as outras. Como moramos em uma cidade pequena, sei que todos os jovens estão lá, já que todo evento, por menor que seja, se torna épico. A casa dele é uma das maiores e mais bonitas de Hauste, com seu design retangular projetado por um arquiteto de verdade, e tem uma área exclusiva para festas – as quais ocorrem sempre quando os seus pais estão viajando. A mãe é dermatologista e o pai é cardiologista, e viajam a cada três meses para o exterior, principalmente para congressos e eventos médicos. O Artur deve conhecer pelo menos cinco países diferentes.  

Seria uma boa me casar com ele.

O som estrondoso da festa propaga-se pelo ar, ensurdecendo-nos com o pop rock. Subimos a escadaria sobre o gramado – que já se encontra repleto de copos descartáveis e vômitos – até chegarmos à área de lazer externa.

— Ora, vejam só! – A voz de Artur sobressai ao som alto. — O casal mais amado que Hauste já viu. Sabiam que todo mundo torcia para vocês ficarem juntos?

Uma roda de amigos começa a ovacioná-los, derramando cerveja para todos os lados, enquanto dezenas de mãos os conduzem para o centro. Eles gostam do Diego e suportam a Nanda, mas ninguém parece ter percebido a minha presença. Sabia que precisava de uma cor chamativa para o cabelo. Talvez, para a próxima festa, eu venha com um chifre brilhante de unicórnio e uma calda de sereia fluorescente.

O lugar está cheio. Há um DJ tocando ao fundo e algumas caixas de som espalhadas pelas laterais. Há muitas luzes de boate girando sobre nós, afixadas no tenor do telhado.

— Zoé! – Artur sai do meio do pessoal e me abraça, empolgado e um tanto desorientado, me levando para perto das plantas. Está bêbado. Sinto cheiro de menta e álcool no seu hálito quente. Odeio menta. Nunca provei álcool.

— Artur! – Finjo retribuir a empolgação, sorrindo.

Ele é um rapaz bonito, mas igualmente chato. Não perde uma oportunidade de exibir seus bíceps artificiais ou de ser inconveniente. Mas, mesmo com essas qualidades "admiráveis", já havia beijado, no mínimo, umas dez garotas naquela noite.

— Hoje não vou dar em cima de você. Prometo! – Ele apoia o pequeno nariz na minha bochecha, sorrindo. — Cansei. Você é muito difícil, sabia?

— Sou seletiva, é diferente – falo, afastando a sua testa com o indicador.

— Agora que seus melhores amigos estão namorando, quem sabe você não dá uma chance para algum desses meros mortais que aqui estão – ele gira o dedo pelo lugar, apontando para os vários rostos esquisitos que se movimentam ao som da música, e volta a encostar o seu nariz na minha bochecha.

— Ok, me apresente um – digo, sem hesitar.

— Sério? – Ele afasta o rosto, surpreso. — Não está mais saindo com aquele seu primo sósia do Will Smith?

— Ah, não, não estou. Ele recebeu uma outra proposta e resolveu se arriscar. Como é biólogo, formado em Yale, se mudou para as Ilhas Marianas para estudar uma espécie rara de tartarugas mamíferas que sofrem de hiperatividade e dislipidemia – digo e roubo o refrigerante que está na mão de um garoto ruivo, um pouco desconfortável, começando a sentir um calor abrasador subir pelo meu pescoço.

As Quatro Estações de ZoéOnde histórias criam vida. Descubra agora