Capítulo XXVI

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Antes de entrar na sala, passei no banheiro e lavei o rosto para apagar as evidências de que eu havia chorado. Depois de enxugá-lo, passei uma maquiagem leve que me fez parecer menos abatida. Mas, por mais que o rosto não aparentasse a tristeza que sentia, não consegui falar nada durante toda a aula, nem mesmo fazer qualquer piada ou me importar com os comentários maldosos da Diretora Olga. Eu estava devastada. 

— O que deu em você? – Diego cochichou, me cutucando. — Está estranha.

— Não é nada. Estou bem.

— Shhhh! – A Diretora Olga chia.

— Eu te conheço, Zoé. Você não está nada bem – ele insiste. — Vai à festa do Artur hoje à noite?

— Não sei. Acho que não.

— Está brincando? Vai ser legal! Épica! A Nanda e eu vamos nos vestir de Popeye e Olívia Palito – ele parou um pouco e segurou uma risada. — Talvez ela seja o Popeye.

— Legal.

— Qual foi, Zoé? Não vai fazer nenhuma piada sobre isso? Pensei que fosse rir da minha brincadeira ou fazer algum comentário... no seu estilo. Você está mesmo muito esquisita!

— Shhhhh! – A Diretora Olga chia outra vez, colocando o indicador sobre a boca e juntando as suas sobrancelhas, pedindo silêncio. — Que insuportável! Estava demorando! Já não bastasse ficar dias sem vir a aula, ainda faz questão de me atrapalhar quando vem, não é mesmo? Você é uma mesquinha insuportável!

— Ela não fez nada, professora – Diego me defende, assumindo a culpa. — Era eu quem estava falando, não ela.

— Não tente defendê-la! Eu sei muito bem o que vi e ouvi – ela vira o rosto para mim, extremamente zangada. — Você é uma pessoa sem futuro, Zoé! Um caso perdido! E você sabe disso. Sabe que está fadada a se casar com algum velho rico e tolo que um dia te sustentará, ou trabalhará para sempre naquela porcaria de cafeteria. Me admira que ainda não tenha aparecido grávida.

Levanto-me, furiosa e ofendida, e pego a minha bolsa.

— O que pensa que está fazendo? – Ela me segue, enquanto caminho em direção à porta. — Volte já aqui! Eu sou a diretora dessa escola, está me entendendo? Se atravessar essa porta, faço um documento e estará expulsa do colégio!

— É mesmo? – Pergunto de forma sarcástica. — Quer que eu pegue caneta e papel para você?

Antes de ouvir qualquer resposta, saio andando em direção à porta de saída e vou embora, deixando todo mundo completamente pasmado.

****

Aquilo nunca havia me acontecido antes. Por muito tempo, dei inúmeros motivos para a diretora Olga me tratar de forma diferente, afinal, eu nunca fui uma pessoa convencional. Mas ela também sempre fez questão de me tratar de forma inferior, como se sentisse prazer em me humilhar. Mas dessa vez ela havia passado dos limites. Havia me insultado da pior maneira possível! Havia insultado a minha inteligência, a minha capacidade e o meu talento. Havia me reduzido a nada!

Quando cheguei em casa, larguei a minha bolsa no chão e corri para a cozinha, onde a Dona Regina estava.

— Zoé? Por que chegou tão cedo? O que foi que aconteceu?

Mas não respondi nada, simplesmente porque não conseguia. Apenas a abracei e comecei a chorar, soluçando, sentindo o peito comprimindo o meu coração e não deixando qualquer oportunidade para que ela fizesse qualquer outra pergunta. Eu me sentia extremamente triste, desapontada e – algo que nunca imaginei que sentiria – uma fracassada.

— Oh, querida, quer me contar o que aconteceu?

— Fui expulsa do colégio – confessei, soluçando. — Me desculpe. Me desculpe por ser assim. Me desculpe!

Ela alisou o meu cabelo.

— Como foi que isso aconteceu, Zoé?

— A Diretora Olga disse que eu não tenho futuro, que sou incorrigível. Ela acha que eu não tenho capacidade para construir um futuro e que, mais cedo ou mais tarde, vou acabar me casando com algum velho ou trabalhando para sempre no café – olho para ela e a abraço ainda mais forte. — Para ser sincera, talvez ela esteja certa. Não tem como eu construir um futuro sendo do jeito que sou.

— Não diga bobagens, Zoé! – Ela me afasta do seu corpo e me encara. — Eu sei que você tem algumas limitações, alguns obstáculos, mas todo mundo tem. Você tem futuro! Você pode ter um futuro incrível, Zoé! Quando você era criança, eu tinha muito medo de que não aguentasse as mudanças, que não conseguisse viver do jeito que era, mas você conseguiu! E cada uma das suas versões é maravilhosa. A Maia, com o seu jeitinho meigo e alegre. A Teresa, com a sua inteligência e organização. A Despina, com as suas fantásticas receitas, habilidade para cantar e fazer tricô. E você, Zoé, a menina mais criativa, linda e que tem uma das coisas mais importantes que uma pessoa pode ter: o amor próprio! Sabemos que às vezes é exagerado, claro, mas você é incrível! Não deixe, jamais, que nenhum comentário maldoso te abale. 

Estendo um sorriso em meio às lágrimas.

— Obrigada, Pão de Forma! Eu te amo!

— Também amo você, menina – ela diz, levantando-se. — Bem, venha ver a fantasia que fiz para você.

— Sério? – Seco as lágrimas com as mãos. — Não brinca!

— Na verdade, ela já estava pronta, só fiz algumas alterações – ela ri. — E não se preocupe com a escola. Hoje mesmo vou conversar com a Olga e convencê-la a não te expulsar.

— A senhora é a melhor!

****

Mesmo não ganhando a aposta, sendo desapontada pelo Dante e humilhada pela diretora Olga, decidi que não abaixaria a cabeça e não deixaria de ser feliz. Nada, absolutamente nada, poderia estragar o que havia de mais importante em mim. Então, naquela noite, vesti a fantasia que a Dona Regina havia feito para mim e, sem sombra de dúvidas, eu estava completamente linda! Irresistível! Se eu pudesse, me pediria em casamento ali mesmo.

— Que bom que mudou de ideia, Zoé – ouvi a voz da Nanda. — A Dona Regina me ligou avisando. Viemos te buscar.

Assim que a encontro no corredor, estendo um sorriso. Ela está vestida de Olívia Palito.

— Você está linda, Nanda!

— Como é?

— Você está linda. De verdade, está muito bonita.

— O que deu em você? – Ela abaixa o rosto, envergonhada. — Não vai implicar com as minhas tranças? Cadê os comentários maldosos?

— Não tenho nenhum. Você está linda, Nanda. Você é linda! E eu amo você por ser assim, do jeito que é.

— Bem, obrigada! – Ela sorri. — E você também está maravilhosa! Do que está vestida?

— Batgirl – me viro, mostrando a capa. — A Dona Regina adaptou para mim. Era uma fantasia masculina, mas ficou perfeita, não acha?

— Foi o que imaginei – ela sorriu. — Ela tem muita habilidade com essas coisas. Você está incrível!

Despeço-me da Dona Regina e vou para o carro do Diego. Ele está vestido de Popeye e está muito bonito, com um sorriso que mal cabe em seu rosto. Como sempre, ele me faz inúmeros elogios e, desta vez, retribuo todos.

Estou começando a me animar para a festa, mesmo que quase nada tenha sido como o esperado. Na verdade, alguma coisa me diz que isso vai ser memorável.

E eu realmente espero que seja. 

As Quatro Estações de ZoéOnde histórias criam vida. Descubra agora