Haviam muitas pessoas fantasiadas do lado de fora e, obviamente, muito mais do lado de dentro, aproveitando as luzes de boate e o som quase ensurdecedor para dançar, beber e se beijar. Algumas fantasias eram muito legais, como o cara que havia se fantasiado de Elliot e a sua namorada de E.T. Outras eram absurdamente preguiçosas, patéticas, eu diria, como o cara que só tinha um bico de pato preso num elástico ou a menina que tinha feito uma maquiagem tosca de zumbi.
— Queria ser essa fantasia, delícia – ouço a maliciosa e insuportável voz do Nicolas, assim que desço do carro. — Desse jeito você me deixa em maus lençóis, Zoé.
Ele aproxima de mim, fendendo a cigarro, e encosta no meu cabelo. Está vestido de Danny – o papel de John Travolta em Grease – numa perspectiva infinitamente pior.
— A sua namorada sabe que você está me cantando?
— Não. Mas e daí? – Ele sorri, me segurando pela cintura. — E daí, Zoé? Vai contar para ela?
— Me solta, seu nojento! – O empurro para longe. — O que deu em você?
— Vamos fazer isso só hoje, princesa – ele ri, tentando tocar em mim outra vez. — Ninguém precisa ficar sabendo. Estamos fantasiados, ninguém vai nos reconhecer. Pode ser tudo... sigiloso.
— Deixa de ser idiota, garoto! – Afasto-me dele e vou ao encontro dos meus amigos, que haviam ido estacionar o carro.
Desço a rua e caminho em direção ao pátio onde costumam estacionar os veículos. A festa mal começou e já tem muita gente bêbada. Muita mesmo. Há pelo menos meia dúzia de caras caídos vergonhosamente pelo gramado. Provavelmente, muitos nem sabem mais o próprio nome ou como chegaram até ali.
A poucos metros do lugar onde Nanda e Diego estacionavam, avisto duas pessoas em cima de uma moto parada no estacionamento. O cara está segurando o capacete na mão e, mesmo estando escuro, consigo reconhecer a sua fantasia de He-Man, e a garota que está com ele está vestida de She-Ra, mas não consigo identificá-los. Aproximo-me mais um pouco, cerrando os olhos, curiosa e confusa, e sinto a raiva explodir dentro de mim como uma bomba-relógio. Que ódio! Não posso acreditar que o Dante e a Brenda estão juntos!
— Pensei que estivesse esperando lá em cima – Nanda comenta, me surpreendendo, desconfiada. — O que faz aqui?
— Ah, bom – tento desviar o olhar dos dois, que agora estão abraçados, prontos para descerem da moto —, vim ver se estava tudo bem com vocês. Vamos subindo? Não quero me atrasar.
Tento usar os meus amigos e a minha capa como escudo para não deixar que nem a Brenda ou o Dante me vejam, até chegar novamente à casa de Artur. Estou me sentindo estupidamente derrotada, esse sentimento é horrível, e apenas pioraria se eu revelasse a minha fragilidade. Como ela teve a ousadia de jogar tão baixo?
— O Nicolas está tão bonito, não acha? – Pergunto para Nanda, sorrindo.
— Não, não acho – ela faz careta. — Ele é estranho e namora a Brenda. O que deu em você?
— Nada – balanço os ombros, sorrindo. — Ei, Nic!
— Zoé! – Diego tenta segurar o meu braço, mas não consegue.
Começo a caminhar em direção ao rapaz e o abraço.
— Mudou de ideia?
— Cale a boca – murmuro. Depois, me viro para os meus amigos. — Pessoal, podem ir entrando, vou ficar aqui um pouquinho, conversando. Daqui a pouco encontro vocês lá dentro.
— Tem certeza, Zoé?
— Claro, Diego.
Assim que o Dante e a Brenda apontam no início da rua, começo a forçar muitas risadas, fingindo que o Nicolas é uma pessoa muito agradável e engraçada – o que, obviamente, é uma completa mentira. Depois, começo a abraçá-lo e passar a mão no seu rosto, fazendo de tudo para que ele não visse a namorada se aproximando. De vez em quando, fazia cócegas nele para que risse, também – uma cena deplorável, mas, com certeza, uma ótima vingança.
— Nicolas, o que pensa que está fazendo? – Brenda pergunta, extremamente furiosa. — E você, garota, o que está fazendo com o meu namorado?
— Nada, só estamos nos divertindo – sorrio, soltando-me dele. — Acho que você não pode cobrar muito dele, não acha? Pelo que vi no estacionamento, você não está em posição de cobrar de ninguém.
— O quê? O que você viu no estacionamento?
— O suficiente para saber que você não vale nada, Brenda – desvio o olhar dela para Dante. — Nenhum dos dois vale, a propósito.
Saio de perto deles e vou em direção a casa, tentando manter o sorriso no rosto. Ela tenta ir atrás de mim, mas alguém a impede. Pronto! Não ganhei a aposta, mas acho que consegui me vingar.
— Zoé! – Artur se aproxima de mim gritando, vestido de cupido, assim que entro na mansão. — Você está muito linda, sabia? Minha super-heroína preferida. Quero dizer, não me leve a mal, mas, cá entre nós, você está mais para uma anti-heroína. Quer uma bebida?
— Ah, não. Não quero, obrigada.
— Não está saindo com nenhum dos seus primos ricos de novo, está?
Olho para a porta e, em meio à toda aquela gente, vejo Dante se aproximar. Ele está me observando, como se quisesse esfregar na minha cara o quanto é um imbecil.
— Não, não tenho ninguém – rio, balançando a cabeça, colocando os dois braços em volta do pescoço de Artur. — E também não estou afim de ninguém. Quero dizer, a menos que você queira.
Ele aproxima o rosto de mim e, imediatamente, fecho os meus olhos. Adiei tanto isso e sempre tentei evitar ficar com ele, mas agora não tenho mais escolhas. Preciso fazer com que o Dante me veja beijando seu primo, mesmo que, para isso, eu precise passar por essa humilhação antes. Acho que será uma ótima maneira de me vingar.
Aproximo os meus lábios até sentir o hálito de bebida, mas, ao invés de me beijar, ele apenas sussurra no meu ouvido:
— Desculpe, Zoé, mas não vai rolar. Não temos... química.
— O quê? – Abro os olhos, tentando entender se o que Artur diz é verdade ou apenas uma brincadeira. — O que está dizendo com isso? Passou a vida toda dando em cima de mim e agora acha que não temos "química"? Isso não faz sentido! Você sempre me quis. Foi alguém que pediu para você fazer isso? Quero dizer, para não fazer?
Ele balança a cabeça, sorrindo.
— Nunca reparou nada? Pensei que você... soubesse – ele desarma as sobrancelhas. — Por que acha que estou vestido de cupido? Não temos "química", entendeu?
Junto as sobrancelhas, me concentrando naquelas palavras, até entender o que ele queria dizer.
— Tá legal, isso foi chocante para mim – começo a rir. — Mas agora faz todo o sentido. Quero dizer, você... bem, faz todo o sentido. Sempre julguei você mal. Quer, sei lá... Conversar sobre isso?
— Com essa barulheira toda? Impossível! – Ele ri também. — A menos que fosse no quarto onde o meu pai toca bateria. É à prova de som porque a minha mãe detesta o barulho. Mas não quero perder a festa conversando sobre isso, então não vai rolar.
— Tudo bem, podemos conversar um outro dia – sugiro.
— Hum, acho que não vai rolar – ele ri outra vez. — Provavelmente, nunca vou me lembrar que tivemos essa conversa. Estou bêbado.
— Tudo bem, você é quem sabe.
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As Quatro Estações de Zoé
Teen Fiction*Livro vencedor do prêmio The Wattys 2021* Enquanto Zoé é uma adolescente irresponsável e autoconfiante, Maia é uma criança com baixa autoestima e carinhosa. Teresa, por outro lado, é uma mulher inteligente e organizada, e Despina é uma senhora rabu...