Capítulo XLI

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— Você ficou louca, Zoé? O que foi que acabou de fazer? – Ela pergunta assim que chegamos à cafeteria, após ter passado todo o tempo de caminhada em silêncio.

— Eu cansei de ficar mentindo, Pão de Forma. Só isso.

— Justo agora? Você tem noção do quanto isso vai te custar? O seu futuro está arruinado! As suas chances de se formar no Ensino Médio, de se formar na faculdade, de construir uma carreira...

Seguro a sua mão e a encaro, sorrindo.

— Isso sempre esteve arruinado – comento. — Se eu for para a faculdade, vai acabar acontecendo a mesma coisa. Se eu começar a trabalhar, também. Eu não tenho controle nenhum sobre as outras três. Nem elas possuem. Essa é a realidade. Não dá para fingir que tudo isso um dia vai normalizar. Talvez esse seja o normal.

Ela balança a cabeça, agora sorrindo, e me encara também.

— Hoje, sem sombra de dúvidas, foi o dia mais insano de toda a minha vida, Zoé – ela alisa o meu rosto, com lágrimas nos olhos. — Quando te encontrei, tão pequena e frágil, enrolada dentro de um caixote de feira que havia sido deixado na minha porta, eu soube que a minha vida nunca mais seria a mesma. Quando vi aqueles cabelos tão finos e dourados, eu soube que nunca faltaria luz na minha vida. Quando descobri aqueles olhinhos verdes e curiosos, eu soube que sempre haveria uma razão para ter esperança. Quando senti aquelas mãozinhas tão pequenas e ágeis segurando o meu dedo, soube que nunca me faltaria força. Mas quando encontrei o seu sorriso, Zoé, tão lindo e verdadeiro, eu tive a certeza de que sempre haveria alegria em minha vida. E foi sempre assim. A sua criação não foi fácil. Pelo contrário, foi a coisa mais difícil pela qual eu poderia passar. Eu nunca tive filhos, você sabe. Ao menos não biológicos. Eu nem sabia como trocar uma fralda ou fazer uma mamadeira, e eu pensei muito em te deixar em outra porta, com alguém mais capacitado e experiente. Mas, todas as vezes em que eu olhava para você, era como se você me dissesse exatamente o que fazer. E eu já te amava. Quando tudo começou a ficar esquisito, as suas drásticas mudanças de personalidades, o seu corpo crescendo e encolhendo em questão de segundos, os seus pensamentos desordenados e revolucionários e tudo mais que veio com isso, eu juro que pensei ter ficado louca. Mas, quando vocês foram se estabilizando e fui conhecendo cada uma de vocês, eu simplesmente as amei. Amei cada uma de vocês, com todas as qualidades e defeitos, de forma incondicional. Você não é uma pessoa comum. E eu agradeço muito por isso. Algumas pessoas têm a sorte de conhecer apenas uma fase da vida das pessoas que amam, e eu conheci todas as suas. E me orgulho muito por você ser exatamente o que é.

Em um impulso melancólico, a abraço fortemente, enquanto choro emocionada. A Dona Regina é a pessoa que eu mais amo em toda a minha vida, inclusive mais do que a mim mesma. E eu não seria nada, absolutamente nada, sem ela.

— A senhora mudou a minha vida quando me encontrou – digo.

— Não, Zoé. A verdade é que eu me encontrei quando você entrou na minha vida – ela me dá um beijo na testa. — Feliz aniversário!

****

Enquanto comemorava o meu aniversário de dezoito anos ao lado de outras cinco pessoas naquele final de tarde, não conseguia pensar em nada que pudesse me entristecer. Pelo contrário, estava me sentindo tão feliz ao lado das pessoas que havia aprendido a amar, que não conseguia me importar com todas as coisas ruins que haviam acontecido.

— Faça um pedido! – Nanda diz, aproximando-se da pequena mesa com o bolo. — Esse é o sétimo aniversário seu que eu participo. Me lembro de ter entregado o seu presente duas vezes para a Despina, quatro para a Teresa e um para a Maia. Mas nunca desconfiei de nada.

As Quatro Estações de ZoéOnde histórias criam vida. Descubra agora