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Ele me faz perder o primeiro dia de aula e aceito adiar nosso fim em vinte e quatro horas, ciente da possibilidade de ser ele um ponto e vírgula; finais abruptos desde muito cedo foram compostos em minha história e, sem me defender, não queria transformar a nossa noite em fim da linha.
O sol atravessa o quarto e o despertador do celular, esquecido no espaço secreto, não foi capaz de extrair força do meu corpo adormecido, contorcido pelo receio de acordar refeito em uma matéria diferente que ainda parece habitá-lo - Jimin ainda está em mim, seu braço me rodeia e sinto nele um abrigo morno, confortável e seguro. Uma ilusão bonita de uma manhã serena.
Eu não mudei, sou a mesma de ontem e antes de ontem, mas as percepções foram todas reestruturadas e algumas das luzes dos cantos escuros do meu mundo acenderam-se com o vislumbre do local cheio de armas e lágrimas. Eletricidade que cega, como os primeiros raios solares esquentando meus pés e transformando a penumbra do cômodo em um aclarado, aos poucos devolvendo as formas dos móveis e do corpo que habita o outro lado da cama. Ele é lindo. Resplandecente pela luminosidade dissolvida, Jimin continua a ser a fonte primordial do que o amor significa e do recém descoberto desejo. As coisas não mudaram no que diz respeito ao coração, mas o mundo é outro enquanto nós somos imutáveis.
Minha cabeça é invadida pela iluminação de ideias já existentes, mas só agora parecem claras, ou tão claras quanto às informações fornecidas nas distorções que o caracterizam, permanentemente dividido e me permito aceitar os sentimentos como destinados às suas duas partes.
Park Jimin.
Jimin Park.
O vejo ainda apagado e ele também é o mesmo de ontem - o que eu já esperava encontrar e que nos últimos meses busquei incansavelmente alcançar, ajustando meus passos aos seus.
O homem ao meu lado, não o garoto de Nápoles, se fez adulto longe da minha presença. Era ele o alvo certo dos pensamentos errados, das palavras escritas em tom carregado pela insegurança de dizê-las em voz alta e foi ele quem encontrei, por quem quase implorei e aceito as consequências dessa paixão desenfreada - e oblíqua.
Sempre imaginei que uma desordem tomaria conta do mundo quando o momento chegasse, o encontro definitivo dos nossos corpos e o rompimento de nossas últimas barreiras, mas ele tão rápido chegou e tão rápido está sendo soterrado pelas coisas que descobri escondidas naquele apartamento.
Não sinto ódio ao compartilhar, já acordada, do seu calor - na verdade me aconchego necessitada de carinho. Não seria ódio. Estou vazia deste sentimento, sentido antes em tantos formatos e dosagens que a parte responsável por produzi-lo está irremediavelmente modificada.
Pensei que odiaria meu pai no lugar de odiar Jimin e eu tentei, ao confrontá-lo nos primeiros dias, mas no máximo o que obtive foram alguns traços de mágoa, depois dela um vazio, o frio do desconhecido, porque percebo, nunca soube de verdade que tipo de pessoa ele era.
Não há arrependimento. Eu quis que me amasse, nem que fosse um amor todo preso nas palavras medidas e ensaiadas de alguém vivendo essa vida que foge a minha compreensão. No lugar da culpa sou tomada pelo rubor de memórias lúcidas, vívidas, me recordo de cada parte do seu corpo descoberto, ao despir-se em minhas mãos, trilhado em meus dedos e o tingi da forma que queria, contemplada no benefício de seguir meu próprio caminho.
Foi paciente, mesmo quando a espera o fez agoniado, me distraiu com suas frases meticulosamente posicionadas.
Não poderia ter imaginado uma primeira vez mais bonita e guardaria com carinho aquela memória.
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Mi Frantumi
Romance"Enquanto as mãos dele permaneciam sujas do mesmo dinheiro que me enriquecia, eu só rogava aos céus para que continuassem a me tomar como propriedade e me estilhaçar em ínfimas partículas de amor e dor. Eu o amei e não me arrependo." [...] Garoto en...