cap. 32 | ken

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Ken

Já ouviu a frase: "Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas". Pois é. Eu a odeio. Para mim, é uma das maiores mentiras já faladas. Percebi, que a maioria das pessoas que a repetem por aí, são do tipo "vampíricas" (vulgo eu). Aquelas que não tem devido amor próprio, e usam dessa desculpa, para que a outra parte se sinta eternamente responsável pelas merdas da vida dela. Soa mais ou menos assim: "Você disse que me amava... você me deu esperanças sobre nós... você me enganou esse tempo todo". Eu digo isso, porque sou uma dessas pessoas. Eu tentei culpar meus pais pelo que aconteceu comigo. Culpar Filipo. Culpar Lulu. Principalmente, culpar Mio. Mas a verdade, é que só você é responsável pelas suas escolhas. Você não tem o direito de colocar sua dependência emocional nas costas de outra pessoa. E se você quer mesmo se livrar desse sentimento vazio, reconstrua o seu interior. Em determinado momento, você vai perceber que sempre foi você. Nunca foram os outros.

Passo as férias em casa. A maioria do tempo, trancado no meu quarto. Meu corpo se recuperou depressa. Diferente do meu psicológico. Na maior parte dos dias, eu sentia vergonha. Mesmo sozinho. Mesmo isolado do mundo. Eu sabia que as pessoas estavam falando sobre o que eu havia feito. Eu estava com tanto medo de encarar aquela nova realidade. É até engraçado imaginar, que a pouco tempo, eu adorava quando explodia uma "bomba" na academia. Quando um aluno, ou aluna, pisava na bola e ia parar no limbo dos estudantes. Eu achava tão divertido... enfim, a hipocrisia.

– Oi. – Minha mãe entra no meu quarto. Tem um sorriso simpático. Ela se senta, bem ao meu lado, na cama. – E então, como você tá se sentindo hoje?

– Eu tô bem. – Respondo, com um meio sorriso.

– As aulas voltam na próxima segunda... – Ela reflete. – Eu queria que você soubesse, que seu pai e eu já ligamos para a academia. Devido a todas as circunstâncias, eles concordaram que você terminasse o último semestre em casa.

Eu conseguia ver, claro como água, o medo contra seus olhos. E eu não a julgava. Desde o "acidente", minha mãe se tornou minha base. Ela apenas não queria que eu sofresse mais.

– Mãe, eu preciso voltar.

Ela vai perdendo o sorriso, aos poucos.

– Filho, você passou por muita coisa. Não é vergonha tirar um tempo para você...

Eu já havia pensando naquilo. Dias e noites.

– Eu sei que não vai ser fácil. Sei que as pessoas vão estar comentando... mas a única coisa pior do que voltar, seria não voltar. – Sorrio. – Tá na hora de eu colher tudo o que eu plantei, mãe. Eu consigo.

Ficamos em silêncio, por longos segundos.

– A culpa é toda minha! – Ela desaba. Seus olhos se enchem de lágrimas.

Me aproximo de seu corpo. A abraço, com todo carinho do mundo.

– Não. Não é. – Acaricio seus cabelos louros.

– Eu sou sua mãe. Eu deveria ter percebido...

Sinto vontade de chorar também, mas seguro.

– Tudo o que você fez foi cuidar de mim. – A acalmo. – Por favor, não se culpe.

Ela se tranquiliza, com o passar dos minutos. Logo depois, é capaz de limpar suas lágrimas e me encarar novamente.

– Ken... – Ela comenta. – Me desculpe por não ter te apoiado quando você nos contou que era gay. – Respiro fundo. Era a primeira vez que conversávamos sobre aquilo. – Eu só... eu fiquei tão confusa!

– Tudo bem. Eu também fiquei. – Respondo. 

Ela me olha, cheia de ternura.

– Eu queria que você soubesse, que não importa sua orientação sexual. Na verdade, nunca importou. De agora em adiante, eu sempre vou ficar do seu lado.

Perfeitos [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora