cap. 49 | mio

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Mio

Eu já esperei tempo demais em toda minha vida. Finalmente é hora de bater asas e alçar voo. Mas não um voo comum. Um voo original. Diferente de todos os outros que já existiram. Eu vou planar por entre furações e tempestades. Driblar todos os raios. Gritar toda vez que cair um trovão. Eu vou deixar a luz brilhar em mim, junto com toda a dor e as rajadas de vento, carregadas com os entulhos da estrada. Eu quero ver a hora em que serei derrubado, e se terei força o suficiente para mostrar as penas outra vez. Voar de novo, e de novo. Olhar os outros pássaros me observando. Tão seguros, mas tão previsíveis. Eu vou mandar um beijo para todos e nunca mais voltar.

Há exatamente vinte e quatro horas, Ken e eu terminamos o que nunca começou. Eu não sabia exatamente o que pensar sobre aquilo. Foram praticamente dois anos em uma "relação" estranha. Eu estava me sentindo anestesiado. Não sofri, ou vivi aquele complexo de liberdade pós namoro. Apenas o desejei felicidades, fui embora de sua casa e voltei para o apartamento de Vênus. Será que eu, Mio Campari, era mesmo seco como um deserto?

– Vou voltar para minha cidade. – Falo.

Estou deitado ao lado de Vênus, em sua cama. Ambos olhamos para o teto.

– Você pode ficar aqui se quiser. – Ela comenta. – Glamour e eu só vamos para Nova Iorque no começo de fevereiro.

Observo as estrelas, constelações e planetas que Vênus colou no teto de seu quarto. Era como um universo paralelo, implorando para ser desvendado.

– Eu preciso seguir com a minha vida. – Dou de ombros.

Engraçado. Eu nuca tive medo do futuro, mas depois de tudo que havia acontecido, meu peito palpitava com a decisão. Talvez eu houvesse me esquecido como era seguir sozinho.

– Então você finalmente sabe o que fazer? – Ela parece curiosa.

Suspiro.

– Sabe, ontem o Ken me disse uma coisa intrigante... ele falou que nosso "relacionamento" o destruiu aos poucos. – Penso naquilo, pela milésima vez. – Eu não havia percebido, mas aconteceu o mesmo comigo. Eu passei tanto tempo pensando nos outros que acabei me esquecendo de mim mesmo.

Vênus vira o rosto em minha direção. Parece deprimida.

– Eu li em uma pesquisa que a maioria das pessoas não terminam com quem de fato amam.

Acho que eu também já havia lido sobre aquilo. Fazia todo sentido.

– Enfim... – Entrego. – Eu decidi viajar pelo mundo.

– É sério? – Vênus arqueia as sobrancelhas.

– É sim. Eu tenho pensado sobre isso, já faz algum tempo. Vou pegar algum dinheiro da poupança, arrumar minhas coisas e finalizar o planejamento. Vai ser tudo de forma independente, como um mochileiro. Eu preciso me encontrar. Saber de fato quem eu sou. Por isso escolhi o Taiwan como primeira locação.

Vênus parece mais animada do que eu.

– Isso parece tão emocionante! – Ela sorri. – Sinto muito não poder ir com você.

Viro o meu rosto para encará-la também. Minha melhor amiga.

– Não importa, eu vou sempre te levar junto comigo.

Marco meu voo para o dia seguinte. Não havia mais motivos para perder tempo. Vênus e eu passamos aquela noite acordados. Revivemos nossas memórias mais marcantes. Fazemos juras de amizade eterna. Quando finalmente vamos dormir, já é de manhã. Só acordamos na hora do almoço. O botox humano, vulgo mãe de Vênus, é quem nos leva até o aeroporto.

Perfeitos [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora