cap. 44 | ken

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Ken

Passo o natal prestando serviço comunitário, junto com Mio, Glamour e Vênus. Para ser mais exato, catando lixo. Eu sei que parece estranho, mas depois de um tempo, até nos acostumamos (menos Glamour, é claro). O natal é uma data para ser desfrutada em família, e de certa forma, nos quatro também éramos uma família. Eu era o pai. Mio era o outro pai (por que não?). Glamour e Vênus eram as duas filhas rabugentas. O que eu quero dizer, é que possuíamos um laço. Havíamos estudado juntos durante muito tempo. Nos víamos todos os dias. Até mesmo encobrimos um assassinato... enfim, recolher lixo juntos pelo centro da cidade não foi tão ruim. Mesmo no último dia, quando estávamos comemorando estar finalmente livres, e um carro passou encima de uma poça de lama, encharcando a nós quatro.

Estou em um avião, sentado ao lado de Mio. É trinta e um de dezembro. Já estava de tarde, mas como a viagem até Marins levava três horas, chegaríamos a tempo para a virada de ano.

– Será que elas vão gostar de mim? – Acabo perguntando.

– Acho que sim. – Mio dá de ombros. – Na verdade, elas gostam de qualquer um.

– Ei! – Lhe dou uma cotovelada.

Mio dá risada. Acabo fazendo o mesmo.

– Relaxa. – Ele fala. – Minhas mães são do tipo "zen" na maior parte do tempo. Elas se dão bem com todo mundo. Além do mais, devem estar animadas por eu estar levando uma pessoa comigo. – Mio se treme todo, como se sentisse um arrepio. – Então, por favor, desconsidere qualquer inconveniência que elas disserem sobre mim.

O avião começa a subir. Pouco tempo depois, estamos planando, rumo ao desconhecido. Tento não ficar nervoso durante a viagem, mas é impossível. Conhecer as mães de Mio era um lance meio doido. Sei lá, eu não conseguia explicar. Mexia com alguma coisa dentro de mim que me deixava desconfortável. Para falar a verdade, eu nem sabia como me apresentar. Tipo, Mio e eu éramos o que? Depois de tudo, ainda não havíamos tido essa conversa.

O tempo passa depressa. Quando desembarcamos, o sol ainda está se pondo. Pegamos um Uber, para que as mães de Mio não se incomodem em nos buscar, e partimos para o condomínio. Não consigo tirar os olhos do vidro quando finalmente chegamos. É muito louco saber que aquela casa, poucos metros à frente, foi onde Mio morou durante praticamente toda sua vida. Ela é muito diferente da minha, porque parece bem mais natural. As paredes imitam um amadeirado, assim como as portas, janelas e teto. É tudo tão arborizado a sua volta, que parece um monumento perdido, no meio de uma floresta.

– Sapatas, chegamos. – Mio fala, assim que entramos pela porta.

Duas mulheres aparecem. Uma delas tem o cabelo louro nos ombros, pele clara e olhos azuis. Me lembra um pouco a minha mãe. A outra tem a pele negra, é alta, e tem um sorriso simpático. Elas abraçam Mio com muito entusiasmo. Ele até precisa cessar os carinhos, alguns minutos depois.

– Esse é o Ken. – Mio me apresenta.

Diferente de mim, elas não parecem nervosas. Tanto Liz (a loira), quanto Flora (a morena), me recebem com um abraço carinhoso. Eu não estava acostumado com aquilo na minha família, então fico sem jeito.

– Nossa, você é muito bonito. – Liz me elogia.

– Verdade. – Flora concorda, com um sorriso esperto. – Agora sabemos o que despertou a sexualidade do nosso bebê.

Fico sem graça, mas sorrio mesmo assim.

– Não tinha nada mais constrangedor para falar não? – Mio se irrita.

Elas dão risada, sem se importar.

– Com certeza vocês estão cansados. Por que não sobem e tomam um banho? – Flora sugere. – Estamos preparando um jantar delicioso. Afinal, é dia da virada!

Perfeitos [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora