cap. 45 | mio

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Mio

A rejeição me acompanha desde que eu nasci. Começou com meus pais, quando eu tinha apenas dois meses de vida. Por algum motivo desconhecido, resolveram deixar seu bebê asiático em um orfanato. Evoluiu na minha infância. Eu sempre fui uma criança introvertida. Estranha. Não conseguia manter amigos, e por outro lado, também não fazia questão. Na adolescência criei alguns vínculos. Jovens como eu, em suma desprezados. Tracei uma história com mais baixos do que altos na academia ALFA. Kennedy Blanca veio junto comigo, porque assim como eu, também era um ímã invertido. Porém, isso não mudava o fato de que ele também me rejeitava. Rejeitava a ideia de nós dois juntos, frente ao aterrorizante/broxante mundo e seus seres humanos patéticos.

Acordo sozinho na manhã seguinte. Ken não voltou para o quarto, ontem à noite. Eu não era do tipo "grudento", e nunca seria. Se ele precisava de um tempo para pensar sobre nossa discussão, por mim tudo bem. Eu também preferia raciocinar sozinho. Só o vejo novamente lá pelas dez, quando ele entra no meu quarto, ainda emburrado.

– Preciso pegar umas roupas. – Ele fala, sem olhar na minha cara. Depois disso, vai até sua mala aberta, e começa a remexê-la.

– Onde você dormiu? – Pergunto.

– No quarto de hóspedes. – Ele responde. – Sua mãe arrumou pra mim.

– Qual delas?

– Flora.

Aquela traidorazinha!

– Você sabe que sou eu quem devia estar com raiva, não é? – Reviro os olhos.

Ken ainda não me olha. Apenas dá de ombros. Naquele momento, percebo porque raramente cultivava relacionamentos... as pessoas são complicadas! Resolvo fazer um esforço, e me levanto da cama, indo parar exatamente na sua frente.

– Você tá mesmo com raiva de mim? – Cruzo os braços.

– Talvez. – Ele responde.

"Atleta padrãozinho" nunca fez tanto sentido.

– Você quer que eu faça carinho no seu cabelo? – Sorrio.

– Quero. – Ele responde, com as bochechas coradas.

Eu sei que tudo aquilo não fazia sentido, mas alguma coisa entre nós já fez? Me sento na cama, com as costas apoiadas na parede. Ken se senta na minha frente, colando suas costas contra meu peito. Começo a fazer um cafuné em seus fios dourados.

– Você gosta disso? – Pergunto.

– Uhum. – Ele sussurra.

Ken já era um adulto, mas sua alma era infantil. Eu já havia percebido aquilo há muito tempo. Confesso que muitas vezes era irritante. No entanto, talvez isso realmente fizesse parte de um relacionamento entre pessoas diferentes. O ato de ceder, vez ou outra.

– Me desculpa por ontem. – Ele finalmente fala.

Tenho vontade de dar um puxão no cabelo dele.

– Tudo bem. Não posso te obrigar a dar um passo maior do que a perna. É um direito seu não estar pronto para isso. – Comento. – Mas eu também não posso passar por cima dos meus princípios para agradar outra pessoa. Seria ridículo.

– O que isso significa? – Ken pergunta.

– Que talvez não estejamos prontos para ficarmos juntos. – Respondo.

Ken resolve se virar, ficando cara a cara comigo. Ele tem um bico enorme.

– Por que você sempre tem que ser tão sensato?

Perfeitos [✓]Onde histórias criam vida. Descubra agora