Ladybird vai de encontro à mão de Peeta, ou melhor, de Alex para lambê-la e receber carinho. Diante de minha falta de palavras para responder ao prefeito, ele intervém:
- Ela salvou nossas vidas. Salvou a todos nós. Se não fosse por ela, não estaríamos aqui hoje.
Fico impressionada em como ele consegue encontrar respostas convincentes sem responder. Mas eu não deveria me surpreender, pois em se tratando de Peeta, não se poderia esperar menos que isso.
- Salvou como? E de que?
- Não podemos entrar em detalhes. Ordens do embaixador. - improviso dessa vez, pegando o gancho da ideia.
- Entendo... - diz o senhor, quando interrompido por uma voz feminina do lado de fora.
- Vou interpretar como um sim. As pessoas da vila estão cochichando como nunca vi antes. Posso entrar? - diz uma mulher alta e magra, de pele muito pálida, e um rosto estranho... meio comprido.
Assentimos, nos saudando.
- Ah! Jovens, quero que conheçam Akahtra, nossa Alta Sacerdotiza.
Ao invés de responder nosso gesto de nos levantarmos num aperto de mãos, educadamente ela junta suas mãos ao púbis, curvando-se lentamente em uma elegante saudação, fechando seus olhos antes mesmo de movermos nossas mãos para o popular cumprimento, fingindo antecipar-se ao nosso gesto. Dessa forma, não nos sentimos constrangidos pela falta de reciprocidade do cumprimento típico. Suas feições expressam algo como onisciência, felicidade contida e respeito. Posso dizer com segurança que jamais vi alguém semelhante no jeito e nas formas.
- Quer chá? - indago ainda de pé, sem ousar convidá-la para sentar. Deixarei que ela mesma decida, uma vez que ela já demonstrou ser imprevisível logo no primeiro contato. No segundo, na verdade, pois sua presença, entrada e fala também foram imprevisíveis.
- Na verdade, Angela, eu gostaria muito de lhe falar a sós... podemos?
- Claro.
O prefeito logo convida Peeta a acompanhá-lo à igreja. Ele se agasalha e ambos saem na companhia de Ladybird.
Akahtra fecha lentamente a porta e se senta, e eu acompanho seu movimento.
- Sabe alguma coisa sobre nossa fé?
- Não.
- Somos adoradores da Chama da Terra, a Chama que dá vida aos vivos, e que sai dos mortos, cujas almas perdidas e frias vagueiam nas grandes florestas escuras. E dentre estas almas há uma em especial que prometeu nos ajudar e disse que jamais nos abandonará. Sabe de que alma fria estou falando?
- Sim. - se tornou óbvio, pressuponho, sem citar nomes, como Peeta faria.
- Você acredita nessas coisas, Angela?
- Eu não sei. Eu não entendo muito de religião.
- Mas você acredita em Deus, não?
- Acho que sim.
- Você não é a Noiva Andina. - comenta ela, num ligeiro sorriso de sapiência.
- Hoje em dia, eu nem sei mais quem sou.
Não sei exatamente porque eu disse isso, mas foi espontâneo e sincero. Eu não estava preocupada em fingir nem mentir... acho que eu só estava desabafando. Minha resposta foi sincera. Eu era filha única. Depois eu era a filha mais velha. Eu tinha um pai maravilhoso. Depois não tinha mais. Eu tinha uma mãe presente, depois ausente. Tinha um lar que já não existe mais. Uma irmã que se foi. Era uma pessoa comum, e virei uma assassina. Era Katniss... agora sou Angela. De tordo, virei fantasma. Tinha um país, e agora estou longe, morando de favor na casa de alguém desconhecido que assim como a antiga capital de Panem, está claramente querendo me usar em seus jogos. Saio de um jogo para entrar em outro. Não sei quem eu sou. E agora essa mulher, seja quem for, me causou essa inesperada reflexão.
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Jogos Vorazes - O Fim da Esperança (Trilogia 1/3)
FanficKatniss é temida por países que querem evitar uma onda de revolução global inspirada pelo Tordo de Panem.