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Três de agosto. Primeiro dia de aula. Estou aqui a um mês e dois dias. Está tudo na mesma, Lauren continua um amor de pessoa, talvez ela seja sempre assim, talvez o mundo pra ela seja sempre brilhante e colorido, ou talvez ela só tenha esperança de que possa passar a ser. Rob e eu continuamos a comer escondidos de madrugada, mas sem nos falar muito durante o dia, a essa altura já entendi que nosso relacionamento vai ser baseado em lanches na madrugada e ignorar um ao outro durante o dia, exceto quando Lauren pergunta "quem comeu o bolo que estava na geladeira" ou "por que só tem metade dos rolinhos que eu fiz na noite passada?", só nesses casos olhamos um para o outro com olhares cúmplices e culpamos Aidan se ele não estiver por perto. Aidan... dês de quatro de julho ele tem se mantido ainda mais em seu quarto, só sai para as refeições ou quando seus pais o obrigam a sair comigo, se isso acontece ele pega o carro dos senhor e senhora Gallagher e dirige comigo até um restaurante ou lanchonete ou para a praia, e de vez em quando ele me dá seu casaco ou apoia a mão no meu ombro, mas nenhum outro tipo de contato se não esse.

Bem, mas não importa, porque agora estou prestes a passar pelo pesadelo adolescente possível: o primeiro dia de aula.

A escola é como nos filmes, enorme, corredores cheios de armários, quadra gigantesca a ponto de todos os alunos poderem ir pra lá e dançarem livremente como no final do primeiro filme de High School Musical, vestuários com chuveiros, piscina para aulas com esportes aquáticos, salas com mesas com dois lugares e um microscópio para cada dupla, computadores que funcionam, uma biblioteca enorme, uma área do lado de fora da escola que os alunos vão para pegar sol durante o intervalo e o pior pesadelo de qualquer ser humano com no mínimo um neurônio funcionando: a cafeteira. Composta por várias mesinhas redondas com cadeiras em volta que num pacto mudo deterninam seus grupos sociais, o inferno na escola mais conhecida como cantina ou cafeteria. E isso é terrível. Todos sabem que quem ficam aqui são os veteranos, então eu sou obrigada a ficar também? Em que mesa eu sento? E se eu me sentar em uma mesa e ficar sozinha? É permitido trocar de mesa depois? Espero até que todos tenham se sentado e fico como a última em pé ou me sento primeiro e corro o risco de me sentar sozinha?

Ensino médio é difícil demais.

Tem cartazes e panfletos pra todo lado. "Ajude o seu colega, previna o suicídio", tradução: "Não se suicide para não colocarem a culpa na escola". "Diga não ao bullying", tradução: "Não vamos fazer nada contra isso, no ensino médio é cada um por si". "Orgulho LGBTQ+", tradução: "vamos usar pronomes com quais você não se identifica e não estamos nem aí."

Aidan que me trouxe, já que estudamos na mesma escola, assim que ele me ajudou a descer da moto e tiramos nossos capacetes os olhares se dirigiram até mim, detectei ciúmes, inveja, surpresa, mais ciúmes, raiva, admiração e choque. E mais ciúmes.

Será possível que essas meninas sejam tão patricinhas e infantis, igual aos filmes?

Resolvo não pensar muito nisso pra não pegar ódio das meninas desconhecidas. Eu não queria chamar atenção, mas chegar com O Aidan Gallagher em pessoa não ajudou em nada.

Me despeço com um aceno de cabeça e vou em busca da secretaria, precisava olhar meus horários. Acho a sala grande com um balcão na frente e uma porta de cada lado atrás do tal balcão, nas portas estão escritos "sala do diretor" e "senhorita Spring", suponha que seja a conselheira pedagógica da escola. Me sento em uma das cadeiras e espero que uma mulher de uns 45 anos termine de atender um garoto... espera aí... antes que eu terminasse meu raciocínio o garoto se vira e eu o reconheço de cara: ele é o garoto que me avisou que as pessoas já estavam embarcando no meu avião.

Maravilha.

-Iaí menina do aeroporto.

-Iaí menino que interrompeu minha música.

-Não estaria aqui se não fosse por mim.- ele da risada. Até que é bonitinho, mas estou fugindo de brasileiros.

Dou um sorriso amigável como resposta e ele segue seu caminho, liberando passagem para falar com a secretária.

Quebra de tempo

Minha primeira aula é de matemática. Ótimo jeito de começar o ano letivo. Vou direto para a sala e me sento no meio, encostada na parede. Nem muito "garota isolada do fundo" nem muito "nerd queridinha do professor", perfeito.

De pouco a pouco a sala foi enchendo e eu fingia organizar coisas importantíssimas na minha mochila enquanto os alunos se reencontravam, abrassavam e contavam oque tinham feito nas férias. Eu me sentia patética, como se estivesse no sexto ano de novo.

Pouco antes do professor chegar o "garoto do aeroporto" que virou "o garoto da secretaria" que virou "o garoto que se sentou do meu lado", me cutucou.

-Está me seguindo garota do aeroporto?

-Você é quem está me seguindo, se sentou do meu lado por escolha própria.

-Bem... se quiser eu posso mudar de lugar.

-Não- Aumentei demais o tom de voz.- Quer dizer... Não, por favor, não conheço ninguém aqui...

-Somos dois. Quer dizer, por que conheceríamos alguém de Los Angeles?

-Isso é verdade... será que se dissérmos que somos brasileiros eles comecariam a falar espanhol com a gente?

-Quer testar no intervalo?

-Vamos.- Dei risada.- É melhor gravar tudo, é Los Angeles, não dá pra saber qual dos nossos ilustres colegas de classe vai ser o próximo Leonardo DiCaprio.

-Boa.

Ficamos rindo por alguns instantes até que o professor chega e pede silêncio, se apresenta e então percebe a mim e ao "garoto que se sentou do meu lado".

-Vejam só, carne fresca. Se levantes e se apresentem por favor.

QUE MERDA EM SEU MAL AMADO!

-Oi, meu nome é Julie Key, tenho 17 anos e sou intercambista brasileira.- Falo o mais rápido possível e volto a sentar em minha cadeira.

-Olá, meu nome é Marcos e como nossa colega aqui eu também sou intercambista. Brasileiro. Vou fazer 18 no mês que vêm.

Marcos... o garoto ganhou um nome. Parece ser um bom amigo.

-Bem, obrigada a Julie e ao Marcos. Alguém tem alguma pergunta pra eles?- O professor diz com voz de um ou dois cigarros fumados por dia durante uns 20 anos.

-Oi, Julie, pode me chamar de Kim, você está namorando Aidan Gallagher?- Disse uma garota pequena e ruiva que se senta na frente com um bando de outras garotas famintas por fofoca. São como uma alcatéia de lobos e a Kim foi escolhida para espionar e passar as informações para o restante da alcatéia, que se prepara para atacar com seus dentes e unhas afiados...

-Perguntas que não envolvam garotos, de preferência, senhorita Kim.

Até que esse professor não é tão ruim assim. Marcos me olha com cara de diva patricinha, imitando a Kim, e eu dei uma risada nasal na minha frustrada tentativa de abafá-la, o que fez com que todos os olhares se voltassem a mim e com que fosse a vez de Marcos ter que segurar a risada.

Esse vai ser o melhor ou o pior ano da minha existência, com certeza...

Aidan e euOnde histórias criam vida. Descubra agora