O garoto desgrenhado e pobre.

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Joey

Sob a luz fraca da lâmpada, papai me pegou pelos ombros e me fez sentar de frente para ele na mesa. Ele estava tão sério e assustador que me senti um preso sendo interrogado por um crime que não cometi, foi quase impossível sustentar seu olhar.

- Você ouviu alguma coisa quando estava andando?

- Sim, um chiado. Igualzinho quando a TV fica sem sinal. - murmurei, enquanto acarinhava Francine.

- Sabe que não pode ir mais fundo. - resmungou papai, se referindo as profundezas da floresta.

- E eu não fui, ainda estávamos perto do bosque de bétulas quando aquela coisa apareceu.

Na verdade, aquilo era mais um rapaz do que uma coisa, sua estrutura física era semelhante à minha. Porém, um pouquinho mais alta e robusta.

- Que coisa?

- Alguém, uma coisa que parecia um homem. Acho que ele estava usando roupas pretas, talvez para se camuflar no escuro. - contei. - Parecia um morcego do inferno.

Eu estava esperando ele rir um pouco com meu comentário, mas isso não aconteceu. Papai dava risada de qualquer coisa que eu falasse quando era criança, dizia que eu era engraçado.

Ao invés disso, ele franziu a testa.

- Como assim um rapaz? Como ele era? Você viu o rosto dele?

- Não... estava muito escuro.

Continuei contando cada detalhe do que aconteceu na noite passada, de cada lugar que passei e cada coisa que vi pela mata. Me pareceu uma eternidade até que ele estivesse satisfeito com meu "testemunho".

Papai pegou seu casaco e as chaves de casa. Eu achei que ele iria investigar agora, ou talvez só sair para tomar um ar fresco. O que ele faz é sempre um mistério.

- Peça a sua mãe para que deixe o jantar na geladeira. - avisou. - Talvez eu volte tarde.

Então papai saiu.
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Jeff

Os altos pinheiros, cedros e carvalhos formavam a cobertura verde sobre a mata. Eu vasculhei cada canto que Joey disse ter pisado, cada centímetro da terra molhada pela chuva da tarde.

De súbito, os arbustos se mexeram e alguma coisa se escondeu entre a floresta, enquanto senti o rápido pulsar de um coração. Minha boca ficou seca e meus ouvidos aguçados. Isso é só o que um predador faz.

Tentei examinar a posição da presa, mas logo pude ouvir o som dos seus passos esmagando folhas secas no chão. Ele estava indo embora.

De jeito nenhum.

Eu o segui até as profundezas da floresta, passando pelas árvores de galhos entrelaçados que pareciam mãos cruzadas, com dedos que se cutucavam e se arranhavam. É aqui que ele mora.

Decidi acabar com a enrolação e pegá-lo pelo pescoço, prendendo-o contra uma das árvores.

- Vamos, merdinha, fala quem é você.

Ele não falava, não dava nem um pio, apesar de estar com os olhos vidrados em mim. É como se estivesse testando minha paciência.

- Você só pode tá de brincadeira comigo. - rosnei. - Anda! Fala alguma coisa, seu degenerado de merda!

Before and After (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora