A rebeldia nasce e cresce na explosão da inquietação de não poder fazer tudo.

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Joey

Eu rapidamente trouxe uma tigela grande de sopa de ervilha com um pedaço de pão de centeio para a mesa. Com fome, papai não esperou um segundo, pegou cada pedaço de pão e mergulhou no caldo quente. Eu esperei silenciosamente por sua opinião.

- Ficou bom? Aprendi a receita em um dos livros de culinária da mamãe.

Ele sorriu.

- Você até que é bom nisso. - disse, e se pôs a comer com entusiasmo, exausto do dia de trabalho intenso.

Sentei e o observei comer em silêncio, preocupado com outro pensamento, enquanto minha mão acariciava a cabeça de Francine, que descansava preguiçosamente em meus joelhos.

- O que aconteceu?

Eu olhei para o papai, sem entender.

- Hã?

- Você parece estranho. Desembuche.

- Nada muito fora do comum então. - dei de ombros.

Francine, farejando o caldo quente, colocou as patas sobre a mesa para ver o que meu pai estava comendo.

- Ei, o que você quer? - ele disse, afastando o prato. - Vá comer sua ração.

Francine começou a uivar e implorar para que ele lhe desse um pouquinho.

- Não, saia daqui. - ele a afastou com a mão. - Cachorra esfomeada.

Revirei os olhos, afagando-a carinhosamente com a mão.

- Não faça assim com ela.

- Você não deu comida para ela, Joey?

- Eu dei, sempre dou ração de noite.

- Então por que essa danada quer comer minha sopa?

- Porque é uma esfomeada, ela come qualquer coisa que cheire bem.

- Cada uma. - papai reclamou, voltando a comer.

Eu peguei um dos petiscos em cima da mesa, escondidos entre as frutas, e joguei para que Francine pegasse.

- Toma, fedorenta.

Francine pulou para pegar, mastigando rapidamente. Papai continuava a comer.

- E sua amiga Deborah?

Ele olhou para mim.

- O que tem ela?

- Como está? Do que vive? O que come? Onde se reproduz? - perguntei, em tom irônico.

- Ela está bem.

- O filho dela, Joshua, virou meu amigo.

- O cadeirante?

Concordei com a cabeça.

- Ele disse que ela não gosta dele.

- Por que ele pensa isso?

Eu pisquei, uma sensação de incerteza aflorou em meu peito, pensando se deveria ou não contar.

- É que... bem, ele me disse que ela nunca foi muito maternal. Disse que ela o fazia ficar sem a cadeira de rodas e dormir no chão frio do banheiro, isso quando ela estava de mal humor.

Lembro-me de seus olhos contando, como a maré vazante de papai quando ele se lembrava de sua infância. Joshua me disse isso quando estávamos falando sobre nossas mães. Eu sabia que ele não tinha boas lembranças a seu respeito.

Parece que eu o traí por ter falado.

- Desculpe, não sei porque contei. Eu sinto muito. - eu disse, não para papai, mas como se fosse para Joshua.

Before and After (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora