Aquela caverna triste, fria e sombria é seu espelho.

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"Não é adorável, estar sozinha?

Coração feito de vidro, minha mente de pedra

Rasgue-me em pedaços, pele e osso

Olá, bem-vinda ao lar."

Lovely by Billie Eilish feat Khalid

Natasha

Quando ele voltou para casa naquela noite, meus nervos ficaram tensos assim que a porta se fechou, e, por um instante, apenas olhamos um para o outro.

Francine correu até mim, ofegante pela corrida na floresta, e me comovi com sua inocência canina. Ela achou tudo nada mais do que uma brincadeira. Antes que pudesse fazer carinho nela, Jeff puxou o meu braço com força e silenciosamente me levou para fora da casa.

Meus olhos arderam e senti uma dor aguda no peito quando saí, as lágrimas se comprimindo no fundo da minha garganta. Fevereiro é, definitivamente, o pior mês. Ele tateou a parede até achar um compartimento e revelar um espaço pequeno, onde imaginei que suas tralhas e ferramentas ficassem guardadas. Mas estava vazia.

Logo, entendi o que ele queria fazer. Ele me arrastou para o cubículo e não lutei, só atrasaria o inevitável.

- Vou deixar você aqui para apodrecer. Talvez volte em dois ou três meses para ver o que resta.

A indiferença deixou meu corpo frio como gelo, procurei não demonstrar emoções em meu rosto. Morrendo em um buraco como um animal selvagem. Quanto tempo levaria?

Nada. Aquilo não era nada.

Temia pelo meu bebê sozinho na casa. Nos dias que passei presa ali, minha cabeça só me permitia pensar em Joey. Pensava, em desespero, se estava comendo, se Jeff estava judiando dele para mexer comigo e se sentia minha falta. Mesmo eu não comendo, o leite insistia em vazar dos meus seios quando pensava nele. Estava morrendo de medo de Jeff machucá-lo por minhas ações, descontar nele suas frustrações mais do que já estava me punindo por tentar fugir. Eu tinha mais medo do fato de não estar lá para protegê-lo do que de morrer.

Será que Jasper pressentia o que aconteceria? Será que lutou contra a morte ou a aceitou? Será que importa, quando se morre, se você tinha consciência de estar morrendo?

Eu queria que minha mente estivesse em ordem e não que meus pensamentos finais fossem perguntas que não seriam respondidas. De que adiantaria? Não queria pensar na repetição de horrores que vivi nas mãos dele. Eu queria me sentir viva e aproveitar a vida. Pensei na voz de Jasper e seus lábios pressionados contra os meus. Tentei pensar em coisas que ainda me faziam vibrar. Eu queria desfrutar do meu corpo enquanto ainda tinha um.

Era a mesma sensação de realização que sentia quando Jeff dormia no exato momento que se deitava comigo, e eu podia ficar sozinha por uma noite toda. Nessas noites, minhas pernas, seios, coxas e tudo ao redor, sob e entre elas, era só meu.

Fiquei tonta com o pensamento de que minha pele era minha e não dele. Para sempre minha. Talvez ele invejasse que eu ainda era nova e minha pele e corpo podiam ser salvos. Eu tinha a esperança. Eu não tinha nenhuma marca de arranhão na pele até conhecê-lo, não chorava até conhecê-lo, e nunca odiei ninguém até conhecer Jeff.

Muitas pessoas imaginariam que perderia a fé em uma situação dessas. Mesmo assim, rezei para Deus me ajudar e nunca tive dificuldade em compreender que não era Deus que estava me matando dia após dia, não foi Deus quem me bateu e fez coisas terríveis.

Before and After (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora