XX

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Beijá-lo era sempre como sair dos trilhos. Nunca existiu um momento na vida da mocinha em que ela pudesse agir por impulso; sempre necessitou ser coerente, pensar bastante, esquadrinhar as melhores saídas e aprender a lidar com todos.

Moldava-se a cada pessoa e, desta forma, tornava-se amada.

No fundo, ela percebeu, tornara-se aquilo que mais temia: Um equilibrista inexperiente. Precisava segurar cada face que criou como se fossem pratos de porcelana; se um prato caísse, tudo o mais se tornaria ruína.

O problema para ela era que Ruggero existia. E existindo, ele se tornava sua benção e sua maldição.

─ Largue-me... ─ Ela murmurou entre os beijos, sem convicção alguma.

E a falta de ênfase na voz dela só despertou mais certeza no príncipe de que ela queria o mesmo que ele, talvez até mais, principalmente pela forma como o apertava, enfiando os dedos nos cabelos dele, desmanchando o penteado certinho que o baile pedia.

Entre sussurros desejosos eles foram se desencostando da porta, esbarrando nos moveis do quarto e derrubando alguns livros do príncipe; algo que ele não se importou.

Com as bocas coladas e as mãos perdidas nas curvas do corpo dela, Ruggero teve a perfeita sensação de morte, para logo em seguida sentir-se vivo, pulsante.
Tudo nele parecia exatamente feito para ela.

Miss Karol tinha um longínquo pensamento de que deveria parar, frear aquela situação antes que se tornasse mais perigosa, entretanto, quando o príncipe a ergueu do chão e a colocou sentada em cima de sua escrivaninha, deixando cair um amontoado de folhas de um vaso de vidro que se estilhaçou no chão, a moça percebeu que estar ali era exatamente o que queria; era o que tanto ansiava.

Ela não saberia explicar como as mãos dele estavam em tantos lugares ao mesmo tempo, tampouco como poderia estar ficando líquida, quase como se fosse evaporar a qualquer momento. Era estranho. Nunca tinha se sentido assim antes.

Morrendo. Renascendo. Morrendo de novo. Renascendo mais uma vez. Era isso.

Era isso que estava acontecendo com os dois.

Ruggero sentia-se igual.

Queria senti-la de todas as formas que podia; os dedos dele afundavam na pele dela, bem como as unhas dela iam deixando trilhas de sutis arranhões pela nuca dele.
Seus toques deixavam cicatrizes.

Profundas cicatrizes.

O príncipe arfou contra a boca da mulher e seu corpo todo estremeceu.

Miss Karol, tomada pela ardência visceral que cobria toda sua pele, buscava nele o apaziguamento de seus próprios sentimentos.

Mas não ia encontrar.

Eles não tinham a resposta de nada.

Os dois só tinham desejo.

Com um esforço colossal, ele conseguiu se concentrar nos cordões do espartilho da moça que ficavam na parte da frente do vestido e, sem nenhuma calma ou gentileza, começou a desfazer o nó, soltando-o do tronco dela.

Karol afundou os dedos nos cabelos dele e o puxou para o mais perto que podia.

O beijo, assim como os toques, iam desobedecendo as regras; iam ficando mais intensos.

Intensos ao ponto de não ter volta; caso continuassem.

No fundo de sua mente excitada, Ruggero começou a racionalizar a situação...

As mãos hábeis dela, os lábios carnudos, o cheiro daquela pele quente, o arfar dos pulmões em brasas, os gemidos roucos que preenchiam o cômodo e eram abafados pelo som da orquestra no salão de baile...

A Face do AnjoOnde histórias criam vida. Descubra agora