LVI

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A agonia de ver Theodoro ali foi sufocante, muito mais até que as dores que serpenteavam como cobras venenosas pelo corpo do príncipe, que ainda permanecia amarrado e ferido, com cada parte de si latejando.

Mas seu ímpeto era repetir para que Theo fosse embora, porque se os caçadores voltassem, só Deus saberia o que poderiam fazer.
Sem dúvida não teriam uma boa reação.

Entretanto, indo contra as ordens do príncipe, o rapaz desceu do cavalo e alisou o focinho do bicho, afastando-se ligeiramente para entender o que acontecia com seu monarca, muito embora já pudesse deduzir graças à luz amarelada do lampião que lançava raios fracionados na direção do homem ferido e agonizante.

Com certo cuidado Theo se aproximou.

─ Não pode ficar aqui... ─ Ruggero alardeava, zonzo de dor. ─ Vá! Salve-se! Proteja a Karol e o meu filho. Vá, Theodoro!

─ Mas para onde eu iria? Você está ferido.

─ Posso me virar sozinho. Volte ao castelo. Volte imediatamente! A Face do Anjo está nos cercando. Salve-os! Salve-os!

─ A Face do Anjo?

─ Sim. Foi uma ordem dela. Ela está chegando, Theodoro... Vá. Salve a Karol. Tire-a do castelo. Vá! Ei, não... Não se aproxime. Volte, volte, Theodoro!

Mas o cortesão já estava perto o suficiente para que seu corpo submergisse das sombras, sendo ligeiramente contornado pela luz amarela do lampião. Com sutileza o rapaz se agachou, ficando de cócoras ao lado do príncipe.

─ Tirar a rainha do castelo?

─ Sim... ─ Grunhiu de dor e virou o rosto para cuspir um bocado de sangue que lhe subia pela garganta. ─ Ela... Ela corre risco. Tenho certeza. Por favor, vá.

─ Eles te amarraram com muita força, não foi? ─ Indagou com o olhar perdido, tocando o nó da corda que envolvia as pernas do príncipe. ─ Fizeram tudo direitinho. E eu pensando que eram bêbados incompetentes.

Aturdido, Ruggero piscou os olhos. Estava zonzo.

─ O que disse?

Theo apontou com o queixo para as cordas.

─ Os caçadores. Foi bem caro, mas foi um dinheiro bem gasto, admito.

─ Isso não é hora para brincadeiras. Vá para o castelo!

O cortesão se limitou a rir, deixando o príncipe ainda mais confuso, como se já fosse pouco a sensação persistente de desmaio.

─ Mas quem está brincando aqui, meu amigo? Meu fiel escudeiro! Que gratificante foi estar ao seu lado todos esses anos. Uma verdadeira diversão! ─ Ponderou um pouco com ares de inocência. ─ Mas tudo sempre tem um fim, não é verdade?

Ruggero estudou o olhar dele. Apesar da tímida sombra que cobria uma fração da face do jovem, o príncipe pôde ver um lampejo de alegria em seu olhar. Um lampejo que assombrou o âmago do monarca.

Nunca tinha visto tal coisa nos olhos de Theodoro antes.

Franziu o cenho aumentando a dor da cabeça.

─ Eu não entendo...

─ Ah, eu explico! Sempre precisei deixar as coisas bem destrinchadas para que você entendesse. Farei isso mais uma vez... ─ Com paciência o cortesão se sentou no chão e cruzou as pernas, como se a sua frente não houvesse um homem se contorcendo de dor. Theodoro puxou a arma presa à cintura e a pousou sobre o colo. ─ Por onde quer começar, Alteza?

Ruggero fitou a arma.

Um alarme soou dentro de sua cabeça, mas ele se negava a acreditar.

NÃO.

A Face do AnjoOnde histórias criam vida. Descubra agora