A maior incompreensão, ou ironia da vida, é a incapacidade que a gente tem entender o porquê que em dado momento nossa vida estar tranquila, seguindo o fluxo e de repente, tudo vira um caos e nos encontramos completamente perdida. Começamos a sentir saudade de uma época que talvez nem fosse tão interessante viver naquela época. Mas é engraçado que a gente sempre tem a sensação de que éramos mais felizes. Hoje, olhando para trás, eu acho que eu era mais feliz, por exemplo, no colegial, onde eu quase não tinha amigos, usava óculos horrorosos e um aparelho que vivia cortando minha boca por dentro e deixando meus lábios ressecados, e mesmo sofrendo tanto bullying, eu tenho a sensação de que aquela época era melhor?
Olhando para o passado, eu consigo perceber que eu me vestia mal desde sempre. Será que meus me odiavam? Por que eles me deixaram usar uma blusa ciano com uma calça xadrez pink?
— Você cochilou! – Olho para o lado e Nigel sorrir. — O soro acabou, e o médico já deu alta.
Ele me ajuda e levantar, ajuda a me vestir, e me leva para sua casa, e mesmo que eu tenha dormido um pouco no hospital, a única coisa que ainda sinto, é sono. Nigel me guia até seu quarto, me ajuda a deitar, meu corpo dói, mas nada dói mais que minha alma. Eu sorrio para ele, sinto sua mão mexendo em meus cabelos, isso é tão bom... Sua mão é tão macia como a mão de uma mulher. Eu adoro esse leve cheiro de laranja, e a blended de tubesora misturado a flores brancas é tão única, Fracas de Robert Piguet realmente é marcante...
— Olá, a margarida resolveu acordar? – Por impulso levo as mãos para esfregar meus olhos e me arrependendo ao tocar no olho esquerdo, recordo que está machucado.
— Nossa! Eu dormi demais.
Nigel me encara como se estivesse me analisando e isso me deixa desconfortável, sinto-me envergonhada pelo estado em que me encontro.
— Sabe quem veio te ver? – Tem um sorriso debochado em seus lábios.
— Quem? – Questiono surpresa.
— Miranda Priestly, vulgo nossa chefe. – Ele senta na poltrona marrom, apoiando as mãos no braço dela e me olha com uma sobrancelha arqueada.
— Miranda? – Questiono com as sobrancelhas arqueadas e sentindo minhas bochechas ganharem tom.
— Ela não estava no seu mais bom humor, segundo ela, eu deveria ter informado que você receberia alta logo e então ela não daria viagem perdida até o hospital.
Nigel com certeza está vendo meus olhos se moverem perdidos pelo quarto, eu realmente não sei como agir diante dessa informação.
— Sabe, em todos esses anos trabalhando com Miranda, nunca a vi visitando nenhum funcionário. Mas, ser imprevisível é uma das fortes características de Miranda, não é mesmo? – Eu me encolho na cama. — Parece que você caiu mesmo nas graças del dragon. – Ele sacode a mão no ar extremamente desmunhecada.
— Miranda me viu nesse estado deplorável. – Murmuro mais para mim, em lamento, porém, ele ouve. Claro que ele ouve, conheço algumas expressões de Nigel, e sei que ele está tentando pescar alguma coisa.
— Não só viu como sentou aí, acariciou seu rosto, você chegou a murmura que o perfume dela é gostoso.
— Eu disse? – Meu coração bate tão forte, que aposto que Nigel tenha ouvido. Ele parece bem concentrado em me estudar.
— Quando eu abri a porta para ela, eu fui capaz de sentir sua respiração queimando minha pele, de tão brava que ela estava, seu olhar mais parecia sair raio laser, sua mandíbula parecia querer trincar seu maxilar, e sabe o que é curioso, pequena Six? – Ele levanta, vira de costas e volta a ficar de frente para mim, com o cotovelo apoiado na mão do outro braço, e mordendo a unha do dedo polegar da mão apoiada.
— O quê? – Sinto que não devo fazer essa pergunta, mas o medo de algo a mais ficar para trás, me incomoda.
— Que aquela carranca de quem estava pronta para matar alguém apenas com um sopro, sumiu assim que ela bateu os olhos em você.
Encolho-me mais uma vez. A vontade de explanar para Nigel que eu e Miranda transamos veio em mente, à vontade de dizer a ele que tinha recém-descoberto que estou apaixonada por Miranda, está na ponta da minha língua, mas o receio de que estaria expondo Miranda, fala mais alto, então apenas me encolho ainda mais.
— Nossa! Nem sei o que pensar. – Falo incerta. Ele semicerra os olhos para mim.
— Seja o que for Six, tenha cuidado, Miranda magoa todos que ousam gostar dela.
— E o que você acha que é?
— Eu não sei, mas, você é a única assistente que ela já teve, e tem que sempre faz demais por Miranda. Não crie uma fantasia na sua mente, ela é inalcançável, mesmo que ela tenha um apreço por você, é só isso, o seu maravilhoso e perfeito trabalho.
Eu queria muito dizer para ele que a gente transou. Ok, que não teve um dialogo antes e pós a transa, que nem sequer sei explicar em que momento aquela situação começou a ficar com teor sexual, mas aconteceu, eu gostei, e as reações do corpo de Miranda mostraram que ela também gostou. Só que Nigel tem razão, Miranda é inalcançável, aconteceu uma vez pelo calor do momento, tesão exagerado, Stephen pode não estar comparecendo na cama, mas jamais passaria disso. Somos de mundos completamente diferentes, e Miranda, é Miranda, com certeza eu apenas sou mais uma na estatística de secretaria que foi para cama com a chefe.
Mas ela foi ao hospital, ela veio aqui atrás de mim, ela se importa um pouco. Eu ainda posso me considerar alguém hétero? Não? Hétero flex?
A Miranda pareceu tão experiente, será que ela já havia transado com outra mulher antes? Por que pensar nessa possibilidade está me causando mal estar? Eu não posso está sentindo ciúmes disso, não mesmo.
— Quer sair do mundo da lua, Six? – Nigel estala os dedos.
— Estou pensando como irei trabalhar amanhã com meu rosto desse jeito.
— Miranda disse que você não precisa ir essa semana.
— Não posso perder tantos dias de trabalho, Nigel, é muita diferença no meu salário.
— Miranda vai adorar ver você andando pelos corredores da Elias Clarck com um olho mais fechado que o outro, mesmo que você reboque seu rosto, ainda assim vai dar de perceber, Six.
— Emily trabalhou uma semana com o roxo no rosto e ainda está com perna engessada, não é?
Ele sorri para mim, cheio de carinho que não costuma ter na Runway. Mas, seus olhos são nítidos que ele tenta dizer que a decisão é minha.
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Louca para Amar
RomanceAndréa tenta abandonar Miranda em Paris, mas minutos depois se arrepende, ainda confusa do porquê do arrependimento, tenta voltar, tenta continuar sendo assistente de Miranda e em busca de descobrir o que a prende naquela mulher fria e sem coração.