05. Página em Branco

579 46 2
                                    


Jane sentiu uma fisgada súbita no estômago, como se um pequeno punhal a atravessasse. Por um instante, lutou contra a dura realidade que a assolava. Determinada a distrair-se, dirigiu-se à penteadeira com passos largos e puxou a cadeira. Com devoção, começou a escovar seus longos cabelos louros, os olhos verdes fixos no espelho oval, buscando respostas para suas angústias.

Uma brisa gélida passou sorrateiramente pelo seu pescoço, acariciando-o com a delicadeza de um amante secreto. A sensação inesperada fez Jane despertar de seu transe. Ergueu-se da cadeira, caminhou decidida até a janela e fechou-a com firmeza, deixando o ar frio invadir o quarto e trazer alívio temporário ao seu coração atribulado.

De volta à penteadeira, Jane afundou-se na cadeira, seu olhar capturado pelo bilhete dobrado. Delicadamente, desdobrou o papel amarelado e mergulhou nas palavras ali inscritas, imersa em um silêncio solene que ecoava pelo aposento.

Após ler as palavras pela décima vez, Jane fechou os olhos e não conteve as lágrimas. Com fúria, destruiu o bilhete em pedaços e os jogou na gaveta da penteadeira, fechando-a com força. Encarando seu reflexo no espelho, enxugou as lágrimas com as costas da mão.

Caminhando sem pressa em direção ao guarda-roupa, Jane franziu a testa ao ver um vestido pendurado para fora. Sua mãe já havia escolhido sua roupa, temendo que sua escolha estragasse o jantar. Suspirando, pegou o vestido creme com rendas, um presente de seu tio Albrecht no seu décimo sétimo aniversário. Vestiu-o e penteou seus cabelos loiros em uma trança.

Ao se dirigir à porta, Jane sentiu como se estivesse esquecendo algo. Respirou fundo, girou nos calcanhares para evitar atrasos, sabendo que sua mãe a repreenderia. Com mãos trêmulas e apreensão dominando-a, aproximou-se da escadaria e viu o hall vazio. Desceu os degraus rapidamente, atravessou o salão principal e foi recebida por Zélie, que abriu a porta da biblioteca.

Seu coração batia descompassadamente ao ver os dois tios paternos, Albrecht e Anton, ao lado da lareira monumental, acompanhados pelo pai e Hans, este último ao seu lado direito. As esposas dos tios estavam no divã elegante, conversando com sua mãe, enquanto Engler brincava com Stephan, filho mais novo de Anton, num canto aconchegante da sala. Todos os olhares se voltaram para Jane ao entrar, interrompendo as conversas e despertando a curiosidade.

— Olhem quem chegou — anunciou Anton, com um largo sorriso. O sangue gelou nas veias de Jane enquanto forçava um sorriso nervoso, sentindo as pernas rígidas. Anton foi o primeiro a cumprimentá-la, colocando o copo na mesinha antes de abrir os braços.

— Fico feliz em vê-lo, meu querido tio — disse Jane, retribuindo o abraço apertado. Ao se afastar, ele mostrou um sorriso largo e virou-se para Hans, que permanecia imóvel como uma estátua, seus olhos azul-turquesa fixos nela.

— Meu caro amigo! Você é um homem de sorte por desposar minha linda sobrinha! Deveria agradecer ao Führer pessoalmente por isso — disse Anton, sua voz carregada de sarcasmo, antes de Albrecht cumprimentar Jane. Ele a encarou nos olhos enquanto acariciava seu rosto; era evidente que a menina estava assustada com a reviravolta que sua vida tinha dado.

— Chega, Anton — sussurrou Albrecht, fitando intensamente o irmão. Fritz, percebendo o olhar entre os dois, prontamente se aproximou e pousou a mão no ombro de Anton, fazendo um gesto com a cabeça.

— Acho que já está na hora de irmos jantar. O que vocês acham? — perguntou Fritz às mulheres, levantando-se e seguindo na frente junto com elas. Antes de entrarem na sala de jantar, porém, ele se virou e encarou os dois irmãos, indicando para que Albrecht e Hans os acompanhassem.

— Acho que não preciso dizer nada sobre suas ações, certo? — indagou Fritz, segurando o ombro do irmão. Anton ergueu a sobrancelha.

— Não me trate como um garoto, Fritz — resmungou, apertando os dentes.

Pássaros no InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora