36. Sopro de Esperança

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Três dias depois, os primeiros raios de sol começaram a dissipar o orvalho da manhã que despertava em silêncio. Os pneus deixavam rastros no solo molhado, como se quisessem marcar cada passo com determinação. Jane, com o olhar perdido na rua deserta, passara a noite em claro, assombrada por pesadelos angustiantes.

Adeline já havia preparado o café da manhã, mas Jane sentia uma indisposição inexplicável que a impedia de descer. Encostou a cabeça na madeira da janela e fechou os olhos, desejando, por um instante, que a guerra simplesmente não existisse.

Perdida em devaneios e memórias, Jane rememorou os churrascos de domingo após o culto, as risadas compartilhadas e até as brigas com seu irmão Engler. Viva, mas fragmentada, lembranças de uma velha música que seu pai costumava cantar quando estava nervoso ou ansioso ressurgiram em sua mente.

Sem perceber, Jane começou a cantarolar, tentando afastar as lágrimas que teimavam em arrastá-la para um abismo de desespero. Colocou a mão sobre a barriga e suspirou profundamente, buscando forças para seguir em frente.

Hans, parado próximo à cama, interveio com palavras de conforto. Jane fechou os olhos e, por um segundo, rezou para que Deus lhe poupasse a vida enquanto estivesse em batalha.

— Como não me entristecer sabendo que está indo para o matadouro? — resmungou Jane, ainda observando a rua. — Essa guerra já me deixou uma imensa ferida, e agora ter que vê-lo partir é como se tudo que amo me fosse tomado, não é justo.

Hans aproximou-se dela com delicadeza. Envolveu-a em um abraço acolhedor, deixando seu queixo repousar suavemente no topo de sua cabeça, como se estivesse buscando um refúgio.

— A vida é assim. Durante todos esses anos de guerra, vi tantas crueldades que nem sequer saberia lhe descrever. Mas tudo tem seu propósito, seja para o bem ou para o mal. Antes de sua chegada, nem sequer conseguia repousar, pois a todo instante me deparava com o campo de batalha, não tinha paz, mas só com sua chegada pude ter um pouco de paz — sussurrou.

Quando fixou seus olhos em Hans Furtzmann, ela testemunhou algo inesperado. Seus olhos azuis, geralmente frios e distantes, agora irradiavam tristeza. Era uma cena singular, onde o soldado robusto e reservado se permitia mostrar vulnerabilidade. Por trás daquela máscara imponente, revelava-se um homem de bom coração, cuja generosidade transbordava.

— E pensar que vivemos tão pouco. Se não fosse essa maldita guerra, teríamos a vida toda juntos.

Hans segurou o queixo dela e o ergueu um pouco.

— Não diga isso, regressarei e iremos passar todos os dias de nossas vidas juntos — disse, encarando-a nos olhos. — Já lhe disse que se não fosse essa guerra jamais teríamos nos conhecido.

Jane não conseguiu conter-se e baixou a face para esconder a avalanche de emoções que a invadia. Ela se afastou delicadamente do jovem e acariciou seu rosto suave, no qual se refletia uma expressão de dor e solidão.

Hans sorriu para ela e recebeu um sorriso de volta, sentindo-se novamente envolvido como se nunca mais fosse soltar. Não demorou muito para que os lábios de Hans encontrassem os dela, num beijo suave; ela correspondeu com ardor. A respiração quente de Hans se misturava ao perfume envolvente de sua deliciosa loção corporal, alimentando um sentimento tão intenso que parecia quase uma dor dentro de Jane.

Ao se afastar, ela, ainda com os olhos fechados, sussurrou:

— Eu te amo, Hans — murmurou a jovem presa nos braços dele.

— Te amo, minha pequena.

Hans soltou Jane para poder admirá-la, e ali estava sua única esperança: uma jovem de apenas vinte anos, com um sorriso perfeito nos lábios e um olhar sincero. Ele a encarou por alguns segundos e, de repente, Jane atirou os braços em volta do pescoço dele e o beijou com uma paixão fervorosa, que imediatamente provocou nele uma onda feroz de posse.

Pássaros no InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora