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Aquela noite de inverno se estendia como um bloco de gelo, sua frieza envolvendo cada canto e cada respiração, transformando o ar em uma bruma gélida que penetrava até os ossos. As horas pareciam se arrastar com relutância, como se o próprio tempo estivesse congelado, resistindo a avançar.
Jane despertou com disposição naquela manhã de sexta-feira. Seus olhos ainda inchados de tanto chorar, ela pegou o pequeno caderno e a caneta no criado-mudo, pronta para escrever uma carta a Artner. Apesar das lágrimas que borravam sua caligrafia, ela persistiu, escrevendo algumas palavras antes de ser dominada pelos soluços.
Determinada, foi até a janela e a abriu, deixando que o vento gelado a acalmasse. Inspirou profundamente e enxugou o rosto com a manga da blusa.
De volta à cama, Jane reconheceu a inevitabilidade da situação. Não podia permitir que sua família sofresse as consequências de desobedecer às ordens de seu pai. Aceitou em silêncio o casamento com um estranho para proteger sua família.
Suspirou desapontada ao fechar a janela e retornar à cama. Pegou a carta endereçada a Artner e releu o único parágrafo antes de amassar o papel e guardá-lo em uma gaveta. Deitou-se, buscando conforto sob o cobertor.
Jane sabia que o sono não viria facilmente após receber uma notícia tão avassaladora. Ela apoiou a cabeça no travesseiro, soltou um longo suspiro e apagou a luz do abajur. Não havia outra opção. Aos poucos, a exaustão a envolveu, e ela mergulhou em um sono profundo e revigorante.
Na manhã seguinte, Jane acordou determinada. Com cautela, dirigiu-se até a gaveta onde havia escondido a carta e a retirou com cuidado. Foi até a janela, abrindo-a delicadamente para evitar qualquer ruído que pudesse chamar a atenção. As janelas, robustas e feitas de madeira, aguardavam Jane enquanto ela se curvava sobre uma delas, verificando se sua audaciosa fuga seria possível.
Percebeu que poderia se apoiar nas barras de ferro que se erguiam a dois metros de altura, permitindo-lhe descer com segurança. No entanto, sabia que um passo em falso poderia transformar seu sonho em um pesadelo. Mas a coragem pulsava em seu peito, e ela decidiu arriscar.
Com determinação, Jane ergueu uma perna pela janela, seguida pela outra, pendurando-se no vão e agarrando firmemente a borda. Num movimento ágil, colocou o pé em uma das barras de ferro, sentindo-o escorregar ligeiramente e seu corpo bater violentamente contra a parede. Uma dor aguda a atravessou, mas ela conteve um gemido, sua determinação inabalável guiando-a adiante.
Prendeu a ponta do pé contra a grade de ferro, apertando com força, e segurou-se com firmeza na barra. Entretanto, seu coração quase saltou pela boca ao ouvir o som inconfundível de uma janela sendo aberta. O medo de ser pega por seu pai a invadiu como um relâmpago.
Jane segurou a respiração, tentando ser mais silenciosa do que uma brisa noturna, e se escondeu habilmente atrás das folhagens, esperando passar despercebida.
— Jane, por que está brincando de escalar sem mim? — resmungou Engler enquanto esfregava os olhos e se curvava sobre o peitoril da janela.
Jane segurou o rosto frágil do irmão, fazendo-o se inclinar ainda mais para fora da janela. Lembrou-se da brincadeira em que não podiam contar ao pai o que tinham visto, sob o risco de se transformarem em estátuas. Fitou Engler, seus olhos azuis se arregalaram de surpresa diante da revelação. Um sorriso radiante iluminou o rosto de Jane enquanto suavemente beijava a testa do irmão.
Com cautela, desceu ao chão, mantendo-se atenta ao olhar curioso de seu irmãozinho, que espiava pela janela. Ao tocar o solo, olhou novamente para Engler, fazendo gestos silenciosos para que ele guardasse segredo. O menino juntou os dedos indicadores e os beijou, prometendo manter o silêncio.
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Pássaros no Inverno
RomanceDurante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha nazista e o mundo são envoltos em uma tormenta de trevas, sofrimento e fúria. Em meio ao caos, a vida de Jane Anne Schoreder sofre uma reviravolta surpreendente e todos os seus sonhos desmoronam. Jamais p...