Capítulo - 17

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Olhamos juntos para a janela do segundo andar, atraídos pelo movimento da mesma se abrindo, e Lorenzo aparecendo. Ele nos encarou com sua expressão emburrada e logo tratou de sair da nossa vista.

Suspirei ao lado de Jean, que também notou o que acontecia ali.

— Acho que ele não gosta de mim — disse como se aquilo não importasse para ele. Seus cabelos pretos varreram seu ombro esquerdo quando ele virou o rosto para me observar.

Dei uma risada carregada de ceticismo.

— Ele não gosta de ninguém — corrigi cruzando os braços.

Jean mudou o apoio de um pé para o outro.

— Não foi o que eu vi lá dentro.

Minha confusão deve ter sido bem óbvia, já que ele se adiantou em explicar.

— Ele não tirava os olhos de você, e quando digo isso é porque eu reconheço aquele tipo de olhar — afirmou.

— Então que tipo de olhar era, Sr.Especialista? — caçoei.

Ao contrário do que eu imaginei, Jean não sorriu diante da brincadeira, tampouco respondeu com outra piada.

— Acho que não cabe a mim dizer. — Sua voz soou baixa. — Mas ele não gosta de nós dois juntos.

Quase engasguei com sua resposta.

— Então isso é problema dele — rebati um tanto irritada.

Um silêncio esquisito se pôs entre nós. Como se uma pedra enorme fosse posta em um rio impedindo seu fluxo.

Fiquei repassando suas palavras tentando ler as entrelinhas, mas fui interrompida por seu braço dando um empurrãozinho no meu. Quando ergui os olhos ele tinha aquele sorriso de lado e os olhos cor de ônix brilhando.

— Não gosto de te ver com raiva assim — brincou. — Apesar de achar que fica linda.

— Devia me ver gritando, eu fico um espetáculo — retruquei para disfarçar o rubor que me subiu ao rosto. Já ele, gargalhava tanto que se curvava para a frente. Acabei não resistindo e rindo também.

Estava anoitecendo quando Jean foi embora e eu voltei para a pensão. Martina recolhia os copos espalhados pela casa enquanto cantarolava uma melodia suave.

Não pensei duas vezes em começar a ajudá-la. Eu limpava em silêncio, apenas escutando as coisas que ela dizia vez ou outra. Quando terminamos nos sentamos no sofá para assistir um pouco.

Mas eu não consegui parar de pensar, não conseguia frear meus pensamentos.

Estava cansada, física e psicologicamente. Angustiada pelo fato de estar longe de casa, sentia saudades dos meus pais e ficava lembrando da ordem deles para que eu voltasse para o Brasil. Estava com medo do aneurisma que me assombrava dia e noite. Confusa por saber, ainda que por terceiros, os sentimentos de Jean por mim. Furiosa com Lorenzo por ele praticamente não querer viver. Triste comigo mesma por não estar sabendo lidar com metade das coisas.

Não sei em que momento minhas lágrimas começaram, apenas sabia que elas demorariam para cessar.

— Oh, mia cara*. O que se passa? — Martina estendeu os braços para mim, e mergulhei neles. Ela pôs uma almofada em seu colo e deitei a cabeça nela.

Enquanto meus sentimentos em forma de gotas de lágrimas fluíam, Martina acariciava meus cabelos murmurando uma canção de ninar. Senti naquele momento o abraço de um amor maternal vindo dela, e senti-me ligeiramente bem.




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