Capítulo - 26

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Quando vi a chamada perdida na tela do celular, não acreditei de primeira. De tudo o que pudesse acontecer, isso era o que eu achava menos provável. Lorenzo havia me ligado na noite passada, e isso era tão inesperado que não entrava na minha cabeça.

Quem sabe ele discou o número errado, ou talvez tivesse sido Martina quem ligara pelo celular do neto. Mas, e se algo tivesse acontecido? Tanto com ela quanto com ele? E se tivessem me ligado para avisar algo grave?

— Essa animação é contagiante — meu pai disse enquanto tomávamos café da manhã. Eu tinha prometido que iria passar o dia com ele, isso incluía pescar. Agora estávamos à mesa, comendo antes de enfrentar um dia longo.

Tentei desfazer minha expressão pensativa e preocupada.

— Só estou pensando em algumas coisas. — Balancei a cabeça, indicando que estava tudo bem e que ele perguntar algo não era uma boa ideia.

— Podemos ir outro dia, você deve estar cansada...

— E perder a chance de pescar um peixe maior que o seu? Nem sonhando — respondi aliviando a conversa.

Meu pai deu um sorriso que fez seus olhos ficarem fechadinhos. Guardei a imagem dele sorrindo na minha mente e coração, bem como eu havia feito com minha mãe.

Quando entramos no carro deixei toda a minha preocupação e teorias para trás, era momento de não pensar em nada e eu precisava disso.

Meu pai dirigiu até o local onde alugaríamos um barquinho para pescar no lago grande. Escolhemos um barco amarelo e o empurramos rumo à água.

Confesso que eu não gostava muito de pescar, era entediante e demorado, mas eu amava a companhia silenciosa do meu pai. E isso fazia o esforço valer a pena. Tempo depois, quando já acomodados, chegamos ao meio do lago, onde, segundo ele, os peixes ficavam em maior quantidade.

Apoiei o queixo na mão enquanto segurava a vara de pescar com a outra. O dia estava quente e abafado o suficiente para causar exaustão e dor de cabeça.

— Você sente saudades de lá, não é?

Fui pega desprevenida. Entretanto, eu sabia do que ele estava falando.

— Sinto, mas o meu lugar é aqui — respondi sorrindo.

Meu pai balançou a cabeça enquanto encarava a água, depois seus olhos pequenininhos focaram no meu rosto.

— Minha filha preciosa, o seu lugar é onde o seu coração está. — Apesar de tranquilo, ele falava sério. — Seu lugar é onde você sente que é o seu lugar.

A sabedoria que sua voz transmitiu através daquelas palavras fez-me arrepiar.

— Vocês precisam de mim aqui...

— Precisamos de você bem — corrigiu.

— Ela não entenderia. — Balancei a cabeça, ele sabia que eu me referia a minha mãe.

— Ela nunca vai entender, afinal você é o bebê dela. — Meu pai sorriu. — Mas, alguém que nasceu com asas não pode viver com elas amarradas, você não concorda?

Meus olhos marejaram. Assenti sorrindo.

— Eu concordo sim, pai.

Aquilo significava que, por ele, tudo bem se eu quisesse ir onde eu tivesse que ir.

— Amo você pai, e amarei até depois da minha existência. — Alcancei sua mão.

Meu pai pegou minha mão estendida e beijou o dorso da mesma, para mostrar que também me amava tanto assim. Após isso, não tocou mais no assunto e não exigiu mais nenhuma resposta do mesmo. A conversa que fluiu durante a nossa pesca foi leve e acolhedora, ele me contava coisas de sua infância que me faziam rir tanto que eu me dobrava para frente em busca de fôlego.

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