Capítulo Um

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Cinco anos depois, as coisas não haviam mudado tanto.

Pelo menos em questões de importância para Érico. Valência havia se inovado para a luz elétrica graças aos seus cientistas e aos cientistas de Mifram, em Áurea. E haviam sido inventados os balões de ar quente no Reino de Santina, em Sinka.

— São muito lindos — Ari havia comentado quando um balão de ar quente foi enviado como presente para o Reino de Hend.

— São. Mas não tenho coragem de entrar em um deles.

Eles haviam visto o rei andar naquele balão com um condutor que parecia saber o que estava fazendo. Ao descer, todos aplaudiram aquele espetáculo e depois, Arniel quis voar também. Érico correu para o quarto e encontrou Ari a sua espera, e os dois ficaram olhando tudo da janela.

Fora mais algumas invenções bonitas e criativas, tudo continuava igual: Érico ainda era proibido de sair do castelo, ainda estudava tendo como professor um homem feio e barrigudo que tinha um bigode igualmente feio, em uma sala na ala leste, e ainda encontrava Ari todas as noites. Estava indo fazer isso agora mesmo, aliás.

Seus passos eram silenciosos e seus sentidos atentos, ele havia passado anos se esgueirando por estes corredores extensos para saber se algo estava diferente, se até o cheiro de alguém permanecia por aqui, ou marca de passos no carpete. Na biblioteca, ele podia relaxar, ninguém ia lá à noite a não ser ele.

— Ari — sussurrou como sempre — estou aqui.

Ari surgiu atravessando uma das prateleiras. Érico sabia que nunca ia deixar de achar aquilo espetacular, não importa quantos anos se passem.

Ela estava segurando um livro. Ela mal havia começado um ontem à noite e já havia começado outro!

— O que está lendo dessa vez?

— Veja você mesmo — ela lançou o livro na sua direção. Não com agressividade. Ela conseguia fazer com que o livro flutuasse na sua direção com gentileza, como se alguém estivesse levando-o para si. Ele ainda não havia se esquecido de quando ela derrubou todos os livros das prateleiras apenas para assustá-lo quando ele tinha apenas doze anos.

O livro era Cinderela.

Ele o colocou na mesa.

— Chato. A Cinderela é a pior princesa das histórias já escritas. Ela teve uma fada e desejou um vestido? Não. Eu pediria outra coisa.

— O que você pediria, príncipe Érico?

Ele pediria para poder ser invisível, assim como ela era.

Ele pediria para poder voar, como ela conseguia, sem utilizar balão algum.

Com certeza ele pediria para conseguir ir, nem que pelo menos uma vez, lá fora.

A Cinderela foi mesmo burra.

— Você já não tinha lido este livro?

— Estou relendo para saber se perdi alguma coisa. E você, o que está lendo?

Érico pensou rápido e disse:

— Um sobre besouros que comem larvas.

Assim que sua boca fechou. Um livro voou em sua direção e ele teve que desviar para que o livro, de novecentas páginas, não acertasse sua cabeça. Ao acertar a parede oposta, o livro fez um estrondo.

— Ari! — Érico chiou.

— Você não está lendo absolutamente nada, príncipe. Não consegue mentir tão bem.

— Já disse que não gosto quando você me espiona. — Mesmo que estejam se vendo há alguns dezessete anos, Ari contou que ainda conseguia fazer com que ficasse invisível. Não era um dom ver fantasmas, se eles quisessem que você os visse ou deixasse de ver. Isso aconteceria em um segundo.

Coroa, Flechas e Correntes (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora