Capítulo Vinte e Sete

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 Não havia acontecido nada. Érico, Joaquim e Lipe haviam ficado deitados na espaçosa cama do quarto. Lipe se sentia mais especial por saber que estava no meio deles dois; isso o deixaria aquecido e não só metaforicamente. À direita, Joaquim tinha uma mão na sua cintura, cheirava a sabonete pelo banho recente e o toque dele era forte mesmo que delicado. Érico a sua esquerda estava com o pé sobre o seu, analisando seu tamanho com tamanha concentração, mas, vez ou outra, olhava para ele e sorria — sorria do jeito que só ele sabia, lentamente e com os olhos fechados, como se quisesse que ele aproveitasse cada minuto do seu sorriso.

Ele se sentia completo no meio dos dois, compartilhando o mesmo ar que eles tão de perto, sentindo os pés deles deslizarem pelo seu de vez em quando, ouvir suas respirações que às vezes ficam lentas e calmas — o que queria dizer que estavam prestes a dormir — e depois, como se lembram-se de repente, a respiração ficava mais acelerada — porque eles negavam o sono, para não perderem este momento.

Lipe se perguntou por que não havia experimentado falar seus sentimentos antes — e logo que procurou a reposta, a achou: Não compartilhara seus sentimentos porque tinha medo de acabar morto.

Não era um eufemismo.

Não poderia ser.

Amar era tão perigoso, parecia-se com um mapa, há áreas em que você dever ir, porque é mais seguro, mas existe sempre aquele desejo ávido por aventura e calor, este era o outro caminho, aquele em que você seguia sabendo que cada palpitada do seu coração era um segundo a mais vivo e um segundo a menos, consequentemente. Quando acompanhou o desjejum de Érico pela primeira vez, soube que havia algo nele que o afetava, e isso poderia não ter sido nada demais se o seu presente fosse outro.

O seu presente consiste em sentir os dedos do príncipe na sua bochecha, deslizando e voltando, lento, carinhoso. E sentindo que o calor no seu tronco descia para abaixo, deixando suas pernas formigando de desejo. E em seu presente, ele se deu conta, havia mais uma pessoa. Joaquim lhe dissera aquelas palavras com tanta pressa e tanta sinceridade que ele achou surpreendente que não tenha se engasgando com a pressa de expulsá-las logo.

Lipe se aconchegou mais para perto deles com cuidado. Já tinha acertado sua cabeça no nariz de Joaquim uma vez e, apesar de ter pedido desculpa, ainda se sentia culpado.

— No que tanto pensa? — Érico questionou, a voz sussurrante, o queixo tão perto do seu ombro que seus pelos faziam cócegas.

Lipe bocejou.

— Em nada.

— Não acho que seja verdade. Você acha? — Dessa vez ele questionou para Joaquim. Que concordou com ele.

— Estou pensando que... Temos que nos preparar para o acampamento como Messina disse. Lembram-se?

— Não podemos esquecer — Joaquim retrucou —, Messina parece-se com um sino, sempre lembrando disso ou aquilo.

— Cíntia é melhor? — Lipe perguntou.

Saindo do quarto, eles discutiam sobre seus treinadores. Érico comentou o quanto Benício era calmo e às vezes isso o assustava. Antes que pudesse acompanhar os amigos, Lipe parou. Virou-se e olhou a extensão do corredor. Seus ouvidos aprumados como os de um cachorro.

— Tudo bem? — Érico havia voltado para buscá-lo.

— Tudo. Pensei ter escutado algo, mas acho que não. Vamos.

Lipe havia pegado uma adaga e a colocou na bainha em sua perna. Não o machucava, o que o surpreendeu. A verdade é que nem um deles havia de levar uma arma tão pesada quando iriam apenas acampar. Messina pegou uma adaga e a escondeu na cintura, Cíntia estava com uma vara curta feita de madeira de carvalho que disparava dardos. Mas não era tudo, ela também estava com alguma lâmina escondida, Lipe tinha certeza. Benício estava com o arco de bronze e aljava de couro.

Coroa, Flechas e Correntes (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora