Capítulo Sessenta e Cinco

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A cor esvaiu do seu rosto de repente.

Em um momento estivera vendo uma chacina sendo feita por um monstro e depois a água mostrava o rosto do seu irmão, que era quase como o seu. Olho castanhos, pontilhados de uma cor jade perto das írises. Cabelo louro, queixo com uma covinha e um sorriso dilacerante. — Ao pensar nessa palavra em específico, Érico estremeceu.

Suspeitou que, se não estivesse deitado, acabaria caindo no chão.

A imagem tremeluziu e depois a água evaporou; já não restava mais nada para ver.

Ryda colocou a bacia de lado e olhou para Érico com condescendência, o que foi algo que o irritou profundamente. Não suportaria olhar para as pessoas do quarto e reparar que os olhares delas eram de pena, mesmo que misturado à descrença e raiva. Não suportaria. Aquele era seu irmão e...

— Era ele mesmo? — Não havia dúvidas que não era, e mesmo assim, a pergunta pulou da sua boca como uma desculpa para que as pessoas sentissem mais pena dele.

Érico estava querendo se torturar.

A mão de Joaquim ainda estava sobre a dele. Sentiu a pressão de seus dedos.

— Ele parecia possuído — Antônia comentou. O rosto dela ainda parecia abatido.

De fato.

— Bem, se ele estivesse possuído, seria outra história mas... Ele não está.

— Como pode ter tanta certeza?

— Porque seu irmão arruinou este reino, garoto. Ele e o rei Anton andavam se comunicando.

— Meu irmão... — sua garganta arranhou — Ele não poderia fazer tudo isso! Eu o conheço!

Em sua cabeça, era simples assim: Conhecia Arniel, conhecia-o porque era como vê-lo em um espelho, só que mais alto e mais sério. Arniel era inteligente, mas tinha dificuldade com números, às vezes se irritava facilmente com coisas fora do lugar ou sujeira. Mas era inofensivo. Sempre fora. Érico não conseguia se lembrar uma única vez que teve medo do irmão como tinha de seu pai.

Seu pai era o rei. Era ele o homem que lhe dava medo na maioria das noites. Arniel era...

— Achei que seu irmão estava morto — Joaquim virou-se para ele, aqueles olhos castanhos crescendo até parecerem que iam explodir. A voz dele estava tão chocada quanto.

Há poucos segundos, ele acreditava na mesma coisa. Isso quase o fez rir. Passara dias, depois de fugir, desejando que seus pais e Arniel estivessem bem, mesmo com a certeza de que eles estavam mortos. Agora, acabara de ver em uma bacia de ferro o rosto de seu irmão, que usava uma armadura brilhante com o brasão de uma árvore em chamas, um sorriso arrasador no rosto e os olhos admirando a desgraça que acontecia no salão de Sinka.

— Isso é impossível — contou aos outros, um sorriso descrente estava pintado em seu rosto, prestes a desmanchar. — Meu irmão nos salvou. Ele salvou você, Aurora. Diga a todos.

Os olhares se voltaram para Aurora, que encarava a janela, o rosto tenso.

— Ele me colocou em um quarto, é verdade.

— Ele a salvou. Ele nunca faria mal a alguém. Por que iria querer fazer isso? — A este ponto, seu sorriso já sumira, deixando sua cara em uma carranca rosada e com lágrimas. Era a raiva, a incerteza de suas convicções, que o estava fazendo chorar. Não era o olhar deles. Isso era o de menos.

— Não conhece seu irmão — Ryda disse.

— Claro que o conheço.

O feiticeiro arqueou uma sobrancelha, duvidando.

Coroa, Flechas e Correntes (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora