𝖆𝖓𝖓𝖊 𝟓𝟏

53 6 0
                                    

Pedi a ela que ficasse à vontade e eu fui tomar um banho. Eu não conseguia parar de chorar, mas já não era mais um choro de soluçar. Ele tinha deixado meu pescoço marcado, pra variar. Coloquei um vestido e fui na cozinha pegar uma garrafinha de água. Procurei pela Alice e ela estava na sacada, encostada no guarda corpo encarando a paisagem. Parei ao lado dela que virou seu rosto pra me encarar. Ela analisou meu corpo e indicou a sala pra irmos nos sentar no sofá. Passei a mão no rosto, bebi um pouco da água e abaixei a cabeça, tentando evitar seu olhar de pena e decepção.

Alice: O que houve? - Eu ponderei um pouco sobre a situação que contaria, não sei se ela está de fato confortável pra ouvir sobre mim e o pai como casal. Encarei ela fungando e entortei os lábios -

Anne: Eu tentei terminar com ele e ele não reagiu bem. - Me limitei a dizer. Ela engoliu seco, desviou o olhar - Eu não quero falar da minha situação com ele pra não te deixar desconfortável, Alice. Eu quero implorar pelas suas desculpas. - Ela me encarou - Eu sei que eu errei feio, eu jamais menti pra você sobre qualquer coisa.

Alice: Mentiu. - Ela foi curta e grossa. Me encarou com olhar acusador. Eu assenti -

Anne: Ele não me permitia contar. - Ela estalou os lábios. Eu peguei suas mãos, mas ela afastou - Eu juro, ele não deixava eu contar. Eu sempre quis contar, mas chegou um momento que já tinha passado muito tempo e eu me acostumei a ser um segredo. - Falei baixo e levantei e abaixei os ombros - Eu sinto tanto a sua falta, Alice. - Tentei pegar em suas mãos novamente, mas dessa vez ela levantou do sofá e passou a mão no rosto -

Alice: Toda vez que você aparecia com um hematoma era ele quem fazia? - Eu sustentei o olhar dela por alguns segundos, mas abaixei a cabeça, não queria responder. Não queria foder ainda mais o relacionamento deles. Ela estalou os lábios - Vai defender ele?

Anne: O que ele fez ou deixou de fazer comigo não tem nada a ver com você, Alice. - Encarei ela e neguei com a cabeça - Não quero que você use qualquer que seja a situação que eu passei com ele pra interferir no relacionamento de vocês.

Alice: Você é inacreditável.

Anne: Eu já causei tanto tumulto, não quero causar mais um.

Alice: Já tá feito, Anne. - Ela abriu os braços - Eu não conheço o meu próprio pai. - Ela colocou as mãos no peito, negando com a cabeça - Eu te forcei a tantas situações com ele e sabe se lá como você estava. - Ela apontou pro nada - Meu Deus, como eu não enxerguei? - Eu levantei e toquei seus braços -

Anne: Você não tem culpa de nada, não entra nessa. Eu só preciso que você entenda que eu não podia contar nada e só quero o seu perdão. - Supliquei - Você é muito importante pra mim, Alice.

Nos abraçamos e voltamos a sentar no sofá. Ela disse me desculpar, eu agradeci. Ela me consolou, me pediu desculpas pelo pai e por toda a situação que provavelmente acha ter me feito estar no mesmo ambiente com ele quando eu não queria. Conversamos mais um pouco e ela disse que precisaria ir embora. Nos despedimos com eu pedindo desculpas mais uma vez e então ela se foi. Fui pro meu quarto e me encolhi na cama com toda a minha mágoa pelo Lorenzo, mas com o coração mais aliviado por enfim ter encontrado com a Alice mesmo que não sendo num bom momento.

•••

A semana que se seguiu eu não tive nenhum tipo de contato com o Lorenzo, melhor assim. Mas infelizmente tive momentos de deslizes e acabei me mutilando algumas vezes. Conversava com Otto e Murilo diariamente e Alice falava uma coisa ou outra. Minha vó tinha pedido pra almoçar comigo e eu convidei ela para o meu apartamento. Encomendei no restaurante favorito dela o prato favorito dela e comprei um colar de presente pra ela e um relógio pra vivi. Assim que ela chegou, meu coração faltou sair pela boca. Vivi estava com ela. Nos abraçamos apertado e eu fui apresentar o apê pra elas que elogiaram cada cômodo. Sentamos pra comer e contei por alto tudo que aconteceu sobre a vinda do meu avô e mãe. O clima não ficou pesado em momento nenhum e eu agradeci mentalmente por isso.

Eu ainda estava bem triste com a situação mais recente. Entreguei o presente delas que agradeceram e fomos tomar champanhe na sacada enquanto conversávamos coisas que vínhamos passando depois de toda a tempestade. Óbvio que contei só as partes que não espantariam elas. Quando o finzinho de tarde foi se aproximando, elas se despediram e foram embora. Organizei a pequena bagunça, tomei um banho e fui fumar um baseado enquanto assistia a um filme de comédia, eu precisava rir. Acordei de um cochilo com o meu celular tocando, só atendi sem checar quem era e me surpreendi quando ouvi a voz rouca do Lorenzo. Arregalei os olhos, tirei o celular do ouvido pra checar o nome e era ele realmente.

Lorenzo: Como você tá?

Anne: O que você quer?

Lorenzo: Posso subir?

Anne: Como assim? - Sentei na cama -

Lorenzo: Por favor? - Eu levantei da cama e fui até a sacada tentando ver se de fato ele estava na portaria, mas era inútil - Anne... - Eu coloquei a mão no rosto, fechando os olhos apertado e com o coração acelerado -

Anne: Pode... - Disse baixo e meio interrogativo -

Lorenzo: Tá...

Ele desligou, fiquei com o celular ainda na orelha com a visão desfocada. Que merda. Eu não deveria ter deixado. O que ele quer agora? Meu interfone tocou me tirando do transe, corri pra liberar a subida dele e fui no banheiro escovar os dentes, passar um perfume e fiz um coque no cabelo. Dessa vez ele tocou a campainha e eu fui abrir. Ele segurava um único ramo de tulipa rosa claro, bem melancólico. Me ofereceu e eu peguei dando um cheiro. Abri um pouco mais a porta encostando na mesma para que ele entrasse e assim ele fez. Fechei os olhos e suspirei. Fechei a porta e passei por ele, indo para a sacada. Sentei numa poltrona com as pernas pra cima para não ter que compartilhar o mesmo lugar e ele sentou no chaise a minha frente. Ficamos um tempo só nos encarando e analisando. Larguei a flor que ainda dava uns cheiros na mesinha e voltei a mesma posição.

Anne: O que voc... - Ele me interrompeu -

Lorenzo: Me perdoa. - Eu mordia as peles da boca e balançava as pernas. Sustentei seu olhar de cachorro abandonado. Eu passei as mãos no rosto, respirei fundo e levantei indo até ele. Sentei em seu colo com uma perna de cada lado e coloquei as mãos em cada lado do seu rosto. Ele me deu um abraço encostando sua cabeça no meu peito e alisou minhas costas - Eu amo o seu cheiro. - Ele disse baixo e ficou me cheirando e beijando. Eu fechei os olhos sentindo seu carinho - Eu amo tudo em você. - Eu o encarei e sorri de lado sem mostrar os dentes alisando seu rosto - Eu não sei o que acontece comigo quando se trata de você. - Ele dizia sincero. Eu abaixei a cabeça - É clichê eu sei, mas quanto mais eu tento te tirar da minha cabeça, mas você se faz presente. - Ele ergueu meu rosto e me roubou um selinho - Não põe um ponto final na gente, Anne. - Eu levantei e ele segurou meu pulso me fazendo soltar um gemido. Ele virou pra ele e notou os cortes recentes. Nos encaramos e eu dei as costas, entrando em casa. Fui pra cozinha e ele veio atrás - Desculpa por isso. - Peguei a garrafa de champanhe de mais cedo e virei um goladão no gargalo mesmo - Ei! - Ele tirou a garrafa da minha mão. Eu abaixei a cabeça no balcão e ele alisou minhas costas, mas levantei afastando ele que se assustou -

Anne: Vai embora. - Me afastei dele - Já se desculpou, vai embora, por favor. - Ele tentou se aproximar e eu estendi a mão afim que ele parasse - Por favor? Vai embora. Só vai embora. - Eu pedia baixo e já chorando. Eu coloquei as mãos no rosto - Por que a gente vive assim, meu Deus? Por que tudo tem que virar um drama? - Encarei ele - Você é feliz assim?

Lorenzo: Eu sou feliz com você. - Meu choro se intensificou e ele veio me abraçar. Ele me alisava. Levantou meu rosto e passou os dedos pra secar as lágrimas que rolavam. Depositou alguns beijos pelo meu rosto e finalizou me dando um selinho demorado. Me pegou no colo e me levou pro quarto onde me deitou ficando por cima de mim sem depositar seu peso - Eu acho que a gente se atrai pelo nosso drama. - Ele disse rindo e eu acabei rindo também, neguei com a cabeça e coloquei um braço tampando o rosto. Ele tirou e me deu seguidos selinhos - posso dormir com você hoje?

𝕸𝖊 𝖆𝖉𝖔𝖗𝖆Onde histórias criam vida. Descubra agora