Capítulo 12: Anúbis

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Elena acordou decepcionada. Apesar de ter dormido com a estátua em mãos e com o pensamento em Leonard, não sonhou com ele. Talvez não era essa a condição para a estátua permitir que ele a visse do outro lado. Então como?

Ela levantou e tomou banho. Foi para a cozinha; sua mãe e irmã não estavam. A mãe estava trabalhando e a irmã na escola. Ela viu um pedaço de papel na geladeira com os dizeres na caligrafia muito bem desenhada da mãe: "fique bem". Tentou forçar um sorriso, mas não conseguiu. Fazia menos de dois dias que ele se fora e a ficha não tinha caído. Ainda esperava um dos "bom dia" diários dele ou aquelas frases bonitas que mandava de vez em quando. Ela sentiu os olhos encherem de lágrimas, mas não chorou, queria ser forte; ele não gostaria que ela ficasse chorando.

Tirou a estátua de Anúbis do bolso. Por que ela ganhou aquilo? Com qual propósito? Fitou a estátua por alguns minutos, distraída. Sentiu um estranho calafrio que arrepiou lhe a espinha. Deixou a estátua sobre a mesa para tomar café da manhã.

Após a refeição, ela sentou no sofá ainda olhando a estátua. Parecia ser feita de madeira e ter milênios de idade. Fechou os olhos e pensou em Leonard, quando reabriu os olhos estava em uma praça em volta de um lago. Ele estava sentado conversando com a fada.

Com sua visão periférica ela viu um vulto a alguns metros de distância. Virou-se para olhar. Próximo ao lago havia um chacal com pelo acinzentado. Ele olhava diretamente para os olhos dela, como se estivesse lendo sua alma. Ela sentiu medo. Então um vento muito quente soprou do Norte. Elena estranhou, pois era a primeira vez que sentia o vento enquanto observava Leonard. Naquele estado era como se todas as coisas atravessassem-na, se bem que nunca tentara tocar em algo durante suas observações..

No pequeno momento de distração o chacal havia desaparecido. Decidida a encontrá-lo ela deu um passo e sentiu um empurrão pelas costas. Estava de volta a realidade.

Surpresa e sem entender ficou olhando a estátua. Os olhos da estátua eram os mesmos olhos do chacal do outro lado. O estranho medo voltou.

Anúbis, a voz da Morte soou em sua mente como se ele estivesse ali naquele momento, o deus egípcio da morte.

Levantou e foi até o computador no quarto. Abriu o navegador e pesquisou sobre o deus. Após algumas horas de pesquisa e informações chegou a conclusão que o chacal do outro lado era Anúbis em sua forma animal.

Elena fechou os olhos e pensou em Leonard, quando reabriu ainda estava em seu quarto. Ficou confusa. Por que a estátua não funcionou? Tentou mais algumas vezes sem sucesso.

Pesquisou, então, sobre a estátua, mas nada encontrou. Nenhum historiador ou livro, nem ao menos uma citação qualquer. Entrou em diversos sites de universidades pelo mundo, até que finalmente encontrou algo: um professor de uma universidade renomada do Egito, chamado Benedict Collor, escreveu uma tese sobre mitologia egípcia, na qual fala sobre uma lenda do vilarejo onde nasceu; tal lenda falava sobre uma forma de viajar para o mundo dos mortos sem morrer e voltar quando desejasse. Aquilo era praticamente o que ela fazia. Precisava saber mais sobre isso, sobre a estátua. Precisava falar com aquele professor o quanto antes.

Assim que sua mãe chegou para almoçar, Elena falou sobre sua vontade de estudar fora, dizendo que precisava depois do que acontecera.

– Egito!? – Sua mãe quase gritou. – Por que você quer ir pro Egito!?

– Hmm... Gosto de areia?

– Elena!

– Eu não sei! Lá parece legal e eu sempre quis ver as pirâmides.

A mãe ficou calada por alguns segundos; pensativa. Ela sabia que Elena estava escondendo algo, mas não conseguiria fazê-la dizer. Ela ficou com pena da garota depois de tudo que ela passara nos últimos dias. Se a viagem a deixasse feliz, a mulher estava satisfeita com isso.

– Tudo bem. Quando eu chegar a noite resolvemos os detalhes.

– Eu dei uma olhada nas passagens, hospedagem e a faculdade que quero estudar... – Elena começou a descarregar uma série de informações sobre sua mãe que apenas ouvia e confirmava com a cabeça.

– Vamos fazer assim: você escolhe tudo do jeito que quiser e eu só pago, ok? – A mãe esperava não se arrepender dessa decisão.

Elena sorriu, como se já esperasse essa resposta, abraçou e beijou sua mãe. Queria chegar ao fundo daquele mistério em volta da estátua.

Sua mãe chegou por volta das dezoito horas. Elena mostrou-lhe os detalhes. Compraram uma passagem para a noite seguinte. A mãe estranhou a viagem repentina e quase desistiu, mas ao ver sua filha tão feliz, seguindo em frente depois de tanta dor, ela não conseguiu negar e cumpriu o que disse horas atrás. Por sorte o falecido pai das meninas, um ex-político e empresário de sucesso, podia viajar para qualquer lugar do mundo, e essa autorização estendia-se a família. E mesmo após a morte dele, elas detinham tal privilégio.

– Elena... – Ela deu uma pausa para que a filha olhasse para ela. – Tem certeza que é isso que você quer?

– Mãe, sei que vai ser difícil, mas eu preciso disso. Aqui, tudo me lembra dele... – Só de pensar nele seus olhos marejaram.

A mãe deu um suspiro e saiu do quarto. Elena deitou em sua cama e enfiou a cabeça no travesseiro. Prometera não chorar, mas naquele momento as lágrimas foram mais fortes que ela. Chorou até adormecer.


Na noite seguinte, Elena abraçou sua mãe e irmãzinha, despedindo-se. Ela cruzou o portão de embarque, a estátua de Anúbis em seu bolso.

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